Um novo trecho de conversa atribuída ao ex-juiz e atual ministro da Justiça Sergio Moro e ao procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Operação Lava-Jato no Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba (PR), veio à tona neste domingo (23). A suposta troca de mensagens sugere que Dallagnol teria agido para proteger Moro e evitar que possíveis tensões entre ele e o Supremo Tribunal Federal (STF) paralisassem as investigações.
A divulgação do material foi feita pelo jornal Folha de S.Paulo, em apuração realizada em parceria com o site The Intercept Brasil. Em sua conta no Twitter, Moro minimizou a repercussão do caso e, na manhã deste domingo, repetiu o que já tinha dito em audiência no Senado: em latim, declarou que "a montanha pariu um rato".
O diálogo reproduzido pela Folha indica que Moro teria ficado contrariado após o que considerou descuido da Polícia Federal no dia 22 de março de 2016, quando anexou documentos da Odebrecht (entre eles, a lista de suspeitos de receber propina) aos autos de um processo da Lava-Jato sem preservar sigilo. Isso teria permitido a publicação na imprensa do material, expondo políticos com direito a foro especial. Esses políticos só poderiam ser investigados com autorização do STF.
Conforme a reportagem da Folha, Moro teria escrito a Dallagnol para reclamar da polícia e avisar que acabara de impor sigilo aos papéis. "Tremenda bola nas costas da PF", teria dito o então juiz. "E vai parecer afronta", referindo-se à possível reação da Corte.
Na sequência, Moro teria avisado que precisaria enviar ao Supremo pelo menos um dos inquéritos em andamento em Curitiba, envolvendo o marqueteiro petista João Santana. Dallagnol teria afirmado que contatou a Procuradoria-Geral da República e sugerido que Moro enviasse um outro inquérito, com foco na Odebrecht.
Horas depois, segundo a reportagem da Folha, o procurador teria enviado nova mensagem a Moro para discutir a situação. Dallagnol teria dito que não houve má-fé da PF. Moro teria afirmado que "continua sendo lambança" e que "não pode cometer esse tipo de erro agora". Em resposta, Dallagnol teria prometido apoio incondicional: "Saiba não só que a imensa maioria da sociedade está com Vc, mas que nós faremos tudo o que for necessário para defender Vc de injustas acusações".
A conversa atribuída aos dois continuou. Moro teria ressaltado, então, que temia pressões para que sua atuação fosse avaliada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e que mandaria para o Supremo os três principais processos envolvendo a Odebrecht. Sobre o suposto temor, Dallagnol teria garantido que falaria com o representante do MPF no CNJ. Ele também teria sugerido que tentaria apressar uma das denúncias que a força-tarefa estava preparando. A medida permitiria que o caso fosse encaminhado ao STF já com acusados e crimes definidos na denúncia.
Em relação à atuação da PF, Dallagnol teria procurado o delegado Márcio Anselmo, que chefiava as investigações sobre a empresa, minutos depois de receber a suposta reclamação do juiz: "Moro está chateado", teria escrito o procurador, fazendo o seguinte apelo: "Por favor nos ajude a pensar o que podemos fazer em relação a isso".
No fim daquele dia, Anselmo teria dito que não via motivo para "todo esse alvoroço". Dallagnol teria retrucado, afirmando que o delegado cometera erro de avaliação: "O receio é que isso seja usado pelo STF contra a operação e contra o Moro. O momento é que ficou ruim", teria ponderado o procurador. "Vem porrada", concluiria Dallagnol.
Em 28 de março daquele ano, Moro mandou para o STF dois inquéritos e uma ação penal que estavam em andamento em Curitiba, incluindo os autos com a lista da Odebrecht, para que o ministro Teori Zavascki, então relator da Lava-Jato no STF, decidisse o que fazer com eles.
Em 22 de abril, Teori, que morreria em acidente aéreo em 2017, decidiu devolver os três processos a Curitiba, mantendo no STF somente as planilhas da Odebrecht que listavam os políticos, mantendo em sigilo.
Conforme a reportagem da Folha, Moro foi procurado para se manifestar sobre o conteúdo dos supostos diálogos. Ele voltou a criticar invasão de celulares. Já a equipe de procuradores da Lava-Jato, segundo a Folha, não se manifestou até a publicação do texto, neste domingo (23).