O Supremo Tribunal Federal (STF) deve homologar em fevereiro a colaboração premiada de 77 executivos da empreiteira Odebrecht. Políticos apreensivos já a apelidaram de "delação do fim do mundo", pelo potencial que terá de implodir pretensões eleitorais dos suspeitos.
Os acordos foram firmados com a força-tarefa de investigadores do Ministério Público Federal (MPF) na Operação Lava-Jato. Os documentos estão sob sigilo e foram guardados em uma sala-cofre. Zero Hora apurou que pelo menos 229 políticos que têm ou tiveram mandato foram delatados (veja abaixo).
Entre os citados, há nomes de atuais e ex-ocupantes de cargos que vão de deputado estadual a presidente da República. O listão inclui ainda secretários de ministérios e outros servidores sem foro privilegiado ou que nunca tiveram mandato eleitoral. Entre os ex-presidentes do Brasil que teriam recebido caixa 2 da Odebrecht em suas campanhas estão José Sarney (PMDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Dilma Rousseff (PT) e o atual presidente, Michel Temer (PMDB).
Entre os governadores e ex-governadores mencionados nas delações estão os paulistas José Serra e Geraldo Alckmin, além do mineiro Aécio Neves (os três do PSDB) e do fluminense Sérgio Cabral (PMDB). Todos são citados na delação do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Cláudio Melo Filho, já divulgada na íntegra pela imprensa.
Zero Hora não cita os nomes dos demais políticos mencionados na delação da empreiteira porque os documentos ainda não foram liberados e carecem de provas adicionais.
Chama a atenção que, entre os 229 identificados pela reportagem, o número de parlamentares estaduais não passa de 17. Isso ocorre porque a Lava-Jato prioriza obras da União, que envolvem, quase sempre, propina a políticos de expressão ou representação nacional. A força-tarefa do MPF cogita criar extensões com núcleos regionais de procuradores para investigar contratos firmados pela Odebrecht nos Estados – o que demandaria novos interrogatórios dos 77 colaboradores da empreiteira. A possível formação dessas "mini-Lava-Jato" só será decidida após o STF ratificar a delação dos executivos.
Recai sobre os ombros do ministro Teori Zavascki a tarefa de decidir pela homologação dos depoimentos. Só então os relatos terão validade jurídica. O ministro pode recusar os acordos, se entender que não seguem o determinado na lei. Ou pedir novos interrogatórios.
Teori já anunciou que ele, seus juízes auxiliares e os servidores do gabinete têm trabalhado durante o recesso do STF, que começou em 19 de dezembro e só termina na primeira semana de fevereiro. Para mergulhar na análise das delações, o ministro deu uma pausa na leitura de outros cem processos criminais que estão em suas mãos.
A Odebrecht é uma das maiores empresas do país e fazia doações sistemáticas a candidatos, de quase todos os partidos. Como os investigadores sabem que o político agiu fora da lei?
Tudo fica mais simples quando não houve declaração do dinheiro recebido. Basta checar nas doações eleitorais ou no Imposto de Renda. Mais complexo é o caso dos destinatários de contribuições legais – mas que as obtiveram em troca de ajuda à construtora.
– Em alguns casos, o político recebeu doações dentro da lei, mas a Odebrecht condicionou o envio do dinheiro à interferência desse parlamentar ou governante em algum benefício para a empreiteira. Por exemplo: créditos fiscais e ajuda para vencer licitação. Os delatores estão nos dizendo quais foram esses favores prestados em troca de financiamento – explica um dos investigadores.
A Lava-Jato não se limitou a questionar os negócios da Odebrecht no Brasil. São mencionados nas delações, também, mandatários de outros países, da América Latina e África. Entre os relacionados, estão dois presidentes da Venezuela, um do Peru e um de Angola, além de políticos de Equador, Argentina, Guatemala e República Dominicana.
Do RS, 10 são parlamentares e dois foram governadores
Dos 229 políticos delatados pela Odebrecht, pelo menos 12 têm base no RS, conforme fontes consultadas por ZH. O jornal não revela os nomes porque as apurações da LavaJato ainda carecem de provas adicionais e documentos. São dois ex-governadores e 10 parlamentares federais (um senador e nove deputados).
Os gaúchos mencionados na delação são ligados a PMDB, PT, PSDB, PTB, PSB e PP. A maior parte dos casos envolve caixa 2 (recebimento de recursos não declarados ou de forma dissimulada) para pagamento de dívidas de campanha. Em algumas situações, o dinheiro teria sido pago para que a Odebrecht tivesse facilidades em licitações nas quais concorria ou, até, para prorrogação de isenções fiscais.
Um dos casos que envolve políticos de mais de um partido é a ampliação do ramal do Trensurb, entre São Leopoldo e Novo Hamburgo. Outro é construção da represa de Taquarembó, em Dom Pedrito. Foram identificados indícios de pagamento de propina nesses empreendimentos em e-mails trocados por integrantes do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, departamento encarregado de distribuir vantagens indevidas.
Um terceiro é a construção da Terceira Perimetral, na Capital. E propinas também teriam sido pagas pela empreiteira em razão de obras nos molhes de Rio Grande e de dragagem do canal do porto daquele município.