Sem conseguir até agora apoio suficiente para aprovar a reforma da Previdência, o Palácio do Planalto decidiu abrir o cofre. A estratégia do governo foi feita sob medida para agradar a deputados e senadores de primeiro mandato com repasses individuais que podem ficar perto de R$ 5 milhões. O valor ainda não está fechado, mas a Casa Civil negocia a concessão de uma espécie de bônus para os novatos, já que eles só terão direito às emendas parlamentares a partir de 2020.
A ideia é que os calouros do Congresso possam destinar recursos a seus redutos eleitorais para a conclusão de obras já em curso e também para ações e serviços em saúde e educação. Dos 513 deputados, 243 estão no primeiro mandato. No Senado, 46 dos 81 são novos. Se a equipe econômica aprovar o valor próximo a R$ 5 milhões, o total liberado será de aproximadamente R$ 1,4 bilhão para deputados e senadores eleitos em primeiro mandato.
A cifra não inclui emendas impositivas (obrigatórias) para os parlamentares que foram reeleitos. Cada um deles receberá R$ 15,4 milhões, despesa já prevista no Orçamento. Ao longo do ano, serão R$ 9,2 bilhões para Câmara e Senado. Embora sejam obrigatórias, as emendas sempre funcionaram como moeda de troca em momentos de votações consideradas cruciais para o governo, como é o caso das mudanças na aposentadoria.
Informado por líderes de partidos, na terça-feira (26), de que a reforma da Previdência não passa no Congresso como está, o presidente Jair Bolsonaro já admite "cortar gorduras" e negociar alguns pontos, como baixar a idade mínima para aposentadoria das mulheres de 62 para 60 anos.
Apesar do discurso oficial contrário à barganha política, o Planalto também vai liberar cargos de segundo escalão, além das emendas e do crédito para parlamentares calouros. Trata-se de uma prática antiga, mas que vai na contramão da retórica de campanha. Ainda não se sabe, no entanto, se os repasses aos recém-eleitos ocorrerão por meio de crédito suplementar — modelo que necessita de aprovação do Congresso — ou se os valores serão remanejados dentro do próprio Orçamento.
—Não tem nada de diferente nisso. Se fosse toma lá, dá cá, os repasses seriam só para os deputados e senadores aliados, mas não é isso. Todos os novatos vão receber, independentemente de partidos, para colocar nas suas bases — disse o secretário especial da Casa Civil para a Câmara, Carlos Manato, complementando que trata-se de que "isso é justiça".
Diante das queixas de "descaso" do governo, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, assegurou a líderes partidários, na terça-feira, que a equipe econômica não vai passar a tesoura nas emendas parlamentares.
— Não haverá contingenciamento — disse ele.
Responsável pela articulação política do Planalto com o Congresso, o titular da Casa Civil também avisou que os políticos poderão fazer indicações para cargos em repartições federais nos Estados, desde que preenchidos "critérios técnicos", como determina a Controladoria-Geral da União (CGU). Advertiu, porém, que ministros terão poder de veto sobre as indicações.
Em busca de união
Bolsonaro não tem até agora uma base de sustentação consolidada no Congresso e só conta com a adesão formal de seu partido, o PSL. A legenda tem se mostrado dividida, mas a deputada novata Joice Hasselmann (SP), escolhida como líder do governo no Congresso, promete trabalhar pelo bom relacionamento.
— Se precisar, vou pedir votos até para o PT. Na pauta de costumes a gente briga, mas, na Previdência, precisamos ter união — ponderou Joice.
Para o deputado Daniel Freitas (PSL-SC), que também está no primeiro mandato, a estratégia do governo para beneficiar os calouros garante a isonomia entre os parlamentares.
— Ficamos felizes porque vamos poder contribuir com nossos Estados e municípios — argumentou.
Freitas nega o isolamento do PSL e diz ter convicção de que a reforma da Previdência será aprovada depois que forem feitos pequenos "ajustes" na proposta.
— São questões pontuais, que não devem ser ampliadas para o País não perder a possibilidade de caminhar a passos largos — observou o deputado.
Líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS) classificou como "uma vergonha" a liberação do crédito para os novatos.
— É fisiologismo e contraria tudo o que Bolsonaro disse na campanha — insistiu.
Ao ser lembrado de que a verba também deve beneficiar a oposição, Pimenta respondeu:
— Nunca tratamos e nem trataremos disso com ninguém.