A eclosão da primeira crise do governo Jair Bolsonaro expôs um presidente que age por impulso, submetido a pressões de três grupos distintos de interesse: os filhos, os militares e os políticos. Após dois dias de sangria pública do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, integrantes do governo tentam apaziguar os ânimos mantendo o auxiliar no cargo, mas não conseguiram evitar a imagem de que Bolsonaro está sujeito à influência de pessoas próximas.
Com quase 30 anos de carreira política, Bolsonaro passou por sete partidos, sem criar vínculos nem obedecer a cartilhas doutrinárias. Nesta trajetória de lobo solitário, poucas vezes se deixou levar pela opinião de assessores ou hierarquias partidárias.
Tudo mudou quando ele vestiu a faixa presidencial. Investido do mais alto cargo da nação, o capitão reformado tem agora dezenas de pessoas no entorno, cujo objetivo é ajudá-lo na tomada de decisões.
O que disseminou pânico em Brasília foi a obediência do presidente aos conselhos dos filhos, em detrimento de militares experientes e estrategistas tarimbados.
Governistas no Congresso ficaram assustados com a forma como Bolsonaro tratou um ministro que esteve ao seu lado na campanha. Nos corredores, havia temor de que o comportamento fosse usado contra aliados.
Desde o início da campanha eleitoral, militares convocados para trabalhar no plano de governo reclamavam da forma como Flávio, Carlos e Eduardo Bolsonaro induziam as decisões do pai. Vencida a eleição, eles indicaram ministros e integrantes do segundo escalão.
Como Flávio se elegeu senador e Eduardo, deputado, a preocupação dos generais foi manter longe da Esplanada o mais influente deles, Carlos, que é vereador no Rio. Ele chegou a ser cotado para assumir a Secretaria de Comunicação Social, mas Bolsonaro descartou a hipótese após repercussão negativa na opinião pública.
O filho do meio, porém, se mantém onipresente. Quando não participa de reuniões com ministros, deixa o primo Leonardo Jesus perambulando pelo Planalto. Sem cargo oficial, mas munido com um crachá que lhe permite passe livre no palácio, Leonardo atua como olheiro do primo.
União eventual para deter o poder da família
Embora considerada incômoda pelos generais e pelos dois ministros civis que despacham no Planalto, Bebianno e Onyx Lorenzoni (Casa Civil), a desenvoltura de Carlos ainda não havia causado maiores problemas. Foi o endosso público de Bolsonaro aos ataques do filho a Bebianno que provocou uma reação imediata e conjunta dos militares e políticos.
De acordo com um assessor parlamentar, foi a primeira vez que os dois grupos se uniram com um mesmo objetivo. Até agora, relata, os deputados estavam preocupados com os cargos do segundo escalão, coisa que os militares não queriam liberar.
Até então, os generais toleravam a interferência de Eduardo na política externa e os problemas de Flávio, suspeito de exigir dinheiro dos assessores. Ao provocar uma crise institucional com os ataques a um ministro de Estado, atraindo para o Planalto um escândalo que pertencia ao PSL, Carlos suscitou a ira dos militares. Em sucessivas conversas com Bolsonaro, eles convenceram o presidente a preservar Bebianno e praticamente exigiram que o vereador seja mantido distante das decisões de governo.
A desenvoltura de Carlos acabou provocando a criação de um ambiente ainda mais militarizado na volta do Bolsonaro, tudo para tentar frear seus filhos. Também havia temor de que Bebianno deixasse a Esplanada atirando.
Ele nunca foi bem quisto pelo conjunto dos ministros com origem na caserna, mas mostrou-se eficiente mesmo à frente de uma pasta esvaziada, conquistando a confiança e admiração de pelo menos um dos subalternos, o general Floriano Peixoto.
Na terça-feira (12), quando o escândalo das supostas candidaturas laranjas do PSL passou a respingar nele, almoçou no bandejão do Planalto sentado ao lado do general e à vista dos jornalistas, para mostrar que tem prestígio junto aos homens de farda.