O Congresso que tomou posse na sexta-feira (1º) reúne o menor número de parlamentares declaradamente governistas dos últimos 24 anos. Na Câmara, a base oficial de Jair Bolsonaro representa 22% das cadeiras, enquanto no Senado não passa de 8% - levando-se em conta as coligações oficiais e os apoios já anunciados.
Somados às características pluripartidárias do atual Legislativo, os índices revelam ao menos uma dificuldade matemática para o governo em temas essenciais para o seu sucesso, como a reforma da Previdência. Para aprová-la, Bolsonaro terá de ampliar esse patamar em duas vezes e mudar a estratégia propagada na eleição de não negociar com partidos.
Este alerta foi feito pelo deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) após sua reeleição para mais um mandato à frente da Câmara. Ele criticou a articulação política do governo e, referindo-se à reforma da Previdência, disse que "no curto prazo" não há votos suficientes para aprovar o projeto em plenário.
— A nova forma de Bolsonaro trabalhar pode não gerar 308 votos no curto prazo — disse ele.
Mexer na idade mínima exigida para a aposentadoria no país, entre outras alterações projetadas, exigirá do governo uma articulação política capaz de reunir os 308 votos na Câmara e outros 49 no Senado em duas votações cada. Hoje, levando em conta sua base oficial, Bolsonaro tem 112 e oito, respectivamente.
Para efeito de comparação, nas eleições gerais de 1990, o então presidente Fernando Collor de Mello, que vencera o pleito presidencial no ano anterior com uma coligação entre o PRN, PSC, PST e PTR, elegeu 50 deputados e 3 senadores. Além disso, o índice de apoio de Bolsonaro é quase a metade do registrado por Luiz Inácio Lula da Silva em seu primeiro mandato. Naquele ano, o petista iniciou sua gestão com 207 deputados e 31 senadores em sua base. O recorde positivo no período foi de Dilma Rousseff.
Sem coligações
A estratégia de campanha de Bolsonaro explica os números enxutos. Ele optou por um voo solo, sem coligações – a única foi fechada com o PRTB do vice-presidente, Hamilton Mourão. Depois disso, ainda manteve o discurso "antissistema" e montou seu ministério negociando diretamente com os indicados ou suas bancadas, e não com seus partidos. O resultado disso é que siglas com filiados no governo não se consideram base, caso do DEM e Novo. E, depois da vitória em segundo turno, apenas o PR se uniu ao bloco governista.
Esse cenário demanda, segundo analistas, uma mudança de estratégia entre o discurso eleitoral e a prática de governo.
— Um governo que sai de um patamar de apoio tão pequeno precisa, sim, se preocupar em negociar com os partidos, que têm interesse no Executivo — diz o cientista político e pesquisador da Uninove Humberto Dantas.
— Mas isso não tem sido feito até agora e o histórico que temos mostra que nenhum governo obtém sucesso dessa forma – completa.
Professor da FGV-SP, o cientista político Marco Antonio Teixeira lembra que Dilma, apesar da esmagadora maioria que reuniu em 2014, não conseguiu evitar o impeachment dois anos depois.
— Se Bolsonaro vencer a primeira batalha no Congresso, que pode ou não ser a reforma da Previdência, tem mais chance de fazer um governo de sucesso. O ponto de partida é ruim pra ele, certamente, mas isso pode e tende a mudar.
Prioridades
Consideradas prioridades, a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Previdência e o pacote anticorrupção em elaboração pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, servirão como termômetro para a relação do governo Bolsonaro com o Legislativo. Apesar de não começar com uma base ampla de apoio, Bolsonaro deve se beneficiar de algumas das características principais do Legislativo, como a taxa recorde de renovação na Câmara em 20 anos: 47,3%.
A expectativa é de que os novatos tenham postura mais liberal em temas econômicos de interesse de Bolsonaro, votando favoravelmente à reforma previdência e tributária e aos projetos de privatizações e concessões.
De acordo com projeção feita pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o governo pode chegar a uma base considerada "consistente" de 256 deputados e 37 senadores.
— Quem tem identidade programática similar dará apoio, mas desde que o governo tenha capacidade de coordenação política e um mínimo de calibragem nas reformas, sem prejudicar um ou outro setor. Bolsonaro terá dificuldades se contaminar suas propostas com a agenda cultural que defende — diz Antônio Augusto de Queiroz, consultor e analista político do Diap.
Anunciado como líder do governo na Câmara, o major Vitor Hugo (PSL-GO) já afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo que o trabalho de aproximação dos líderes partidários está em curso.
— Tenho conversado com os líderes, mas eu não tenho entrado no mérito de nenhuma questão até para não contaminar a discussão porque neste momento estamos formando a base. Então, pergunto se tem alguma dificuldade de acompanhar a gente de forma geral nas pautas econômicas. E com os líderes com os quais eu conversei não houve nenhuma resistência.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.