No dia seguinte à instauração de procedimento para avaliar a federalização da investigação sobre o assassinato de Marielle Franco (PSOL), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, classificou a morte da vereadora como um "atentado à democracia". Em Porto Alegre, onde participou de um balanço sobre os quatro anos da Lava-Jato, também traçou um paralelo entre a corrupção e a execução que mobilizou o país:
— A corrupção também é um atentado à democracia, assim como o assassinato de líderes políticos, comunitários e defensores dos direitos humanos. A corrupção porque desvia recursos públicos e priva os cidadãos dos serviços que deveriam ser financiados por essas verbas, e o assassinato de defensores de direitos humanos e líderes políticos porque a priva de vozes que clamam por valores como a representatividade, a defesa de direitos e a contenção da força.
Raquel seguiu para Porto Alegre depois de participar, na quinta-feira (15), de reuniões no Rio de Janeiro. Na capital fluminense, encontrou-se com procuradores, delegados e o interventor federal, general Walter Braga Netto, para acompanhar "de perto" os desdobramentos da morte de Marielle.
— Não é simplesmente o assassinato de uma pessoa, mas de uma líder política defensora de direitos fundamentais. É assim que esse fato precisa ser visto: no contexto da vida política do Rio de Janeiro e do país — pontuou.
Antes da viagem ao Rio, a procuradora instaurou um procedimento para avaliar a transferência da investigação sobre o assassinato de Marielle e seu motorista, Anderson Pedro Gomes, à Polícia Federal (PF). Trata-se de uma sinalização inicial — para que ocorra a federalização do inquérito, terá de ingressar com pedido no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
– O pedido de federalização será avaliado oportunamente à medida que todas as investigações se desenrolem. Nossa expectativa é de que não seja necessário, mas vivemos em um país em que o nível de impunidade ainda é muito elevado – disse.
Prisão em segunda instância: "resposta adequada"
Questionada sobre as chances de o Supremo Tribunal Federal (STF) reavaliar a prisão após condenação em segunda instância, Raquel considerou o debate sacramentado pelo plenário. O assunto retornou à discussão nacional devido à iminente possibilidade de detenção de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
– O Supremo já deu sua manifestação sobre o tema em mais de uma oportunidade e em seu órgão máximo, o plenário da Corte. Considero essa decisão a resposta adequada e suficiente. Temos, agora, que seguir aplicando esse entendimento a todos os casos que cheguem à nossa mesa – acrescentou.
Indiretamente, também respondeu a uma crítica do ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot. No domingo (11), em sua conta no Twitter, Janot compartilhou uma nota que afirma que, em seis meses, Raquel não fechou nenhuma nova delação premiada e escreveu: "Vai ser assim?".
Segundo a procuradora, acordos seguem sendo negociados, mas mediante sigilo quanto aos envolvidos e ao conteúdo. Ela sublinhou que, "no momento certo", serão divulgados:
– Tão importante quanto desvendar crimes por meio de colaborações premiadas é cumprir os termos e exigir que os colaboradores entreguem provas, não apenas apresentam declarações culpando terceiros.
Na sede da Procuradoria Regional da República da 4ª Região, Raquel reuniu-se pela manhã com as forças-tarefas do Ministério Público Federal (MPF) na Lava-Jato. Participaram os coordenadores dos trabalhos em Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ) e Brasília (DF).
Números da Lava-Jato na PGR citados por Raquel:
— 36 denúncias apresentadas ao STF e três ao STJ;
— 101 pessoas respondendo a ações penais no STF;
— 12 governadores investigados no STJ;
— 134 delações premiadas firmadas e enviadas ao STF para homologação;
— Previsão de devolução aos cofres públicos de R$ 1,3 bilhão (depositados no Exterior) e R$ 1,4 bilhão (depositados em instituições brasileiras).