Quatro semanas depois de liderar o primeiro turno, Onyx Lorenzoni viu escapar o sonho alimentado há mais de duas décadas de se tornar governador do Rio Grande do Sul. O candidato do PL conquistou 42,88% dos votos, ante 57,12% do governador reeleito Eduardo Leite (PSDB).
Onyx ficou atrás na apuração desde o início, e a derrota foi matematicamente confirmada às 19h, com 89% dos votos apurados. Muito antes, com cerca de 20% das urnas apuradas, apoiadores do candidato verificaram que a dobradinha com o presidente Jair Bolsonaro não estava surtindo efeito. Àquela altura, o presidente somava 60% dos votos apurados no Estado, mas Leite já aparecia na frente.
— Não está casando como a gente esperava. Tinha de ser um pouco mais — lamentou o ex-vereador de Gravataí Evandro Soares, assessor especial de Onyx.
Depois da confirmação do resultado, o ex-ministro se pronunciou em uma sala reservada, sem responder perguntas de jornalistas. No discurso, aceitou a derrota para Leite e atribuiu o resultado à "união das esquerdas", em referência ao apoio "crítico" do PT ao tucano no segundo turno.
— A eleição do segundo turno, como eu dizia sempre, é uma outra eleição. Houve uma reacomodação de forças, houve a união das esquerdas no Rio Grande do Sul, e essa união acabou definindo a eleição —avaliou Onyx.
O candidato derrotado também relatou que telefonou a Leite para cumprimentá-lo pela vitória.
— Desejei que ele consiga, nos próximos anos, corresponder às expectativas do povo gaúcho. Na democracia, a decisão do povo é soberana.
Durante o pronunciamento, Onyx chegou a dizer que não estava "convencido" do resultado da eleição nacional, que àquela altura apontava vitória de Lula (PT) sobre Jair Bolsonaro (PL). Ao mesmo tempo, antecipou críticas e previsões negativas sobre o futuro governo federal:
— Os riscos que a democracia e a sociedade brasileira irão correr a partir da confirmação da vitória da chapa de Lula no segundo turno serão rapidamente compreendidos. Tenho dúvidas, e continuo com severas dúvidas sobre o resultado nacional, mas o distanciamento do processo nacional, como candidato aqui no RS, não me permite avançar mais do que isso.
O candidato do PL também agradeceu a deputados que apoiaram sua candidatura e citou nominalmente o senador Luiz Carlos Heinze (PP) e quadros dissidentes do MDB que o apoiaram no segundo turno, como o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo.
— Vamos continuar firmes, não temos do que nos envergonhar. Na primeira batalha, nós vencemos. Na segunda, não vencemos. Mas outras batalhas virão, porque nosso destino é proteger o Rio Grande e proteger o Brasil e fazer com que ambos possam estar sempre unidos dentro do processo democrático com nossa liberdade garantida.
Por fim, Onyx disse que dormirá "angustiado" com a vitória do PT na eleição nacional:
— Não tenho nenhuma dúvida que a volta desse grupo político ao poder colocará a democracia e a liberdade brasileira sob risco. Anotem, podem ser proféticas essas palavras. Espero que não, mas temo pela democracia e pela liberdade no Brasil.
Aos 68 anos, após cumprir sete mandatos no Legislativo e passar por cinco ministérios, será a primeira vez que Onyx fica sem mandato desde 1994, quando se elegeu pela primeira vez deputado estadual.
Falhas na campanha
A chave para entender a derrota de Onyx Lorenzoni passa pela compreensão da estratégia de campanha, que teve como ativo principal a ligação com o presidente Jair Bolsonaro. A aposta do candidato e de sua equipe sempre foi vincular a campanha estadual à nacional, para colher os frutos da popularidade de Bolsonaro no Estado.
Embora o presidente tenha tido maior votação no Rio Grande do Sul, com 56% dos votos válidos, a conexão do voto foi menor do que Onyx esperava e uma parcela de eleitores de Bolsonaro optou por Eduardo Leite, o que foi decisivo para garantir a vitória do tucano. Além disso, ao mesmo tempo em que catapultou Onyx ao segundo turno, o bolsonarismo funcionou como uma espécie de trava, inviabilizando quase que totalmente a conquista de eleitores do terceiro colocado no primeiro turno, Edegar Pretto.
Onyx chegou a acenar a categoria de servidores públicos, prometendo reajustes salariais e benefícios, mas o movimento não foi suficiente para conquistar parte expressiva do eleitorado que teria optado por Pretto no turno anterior.
Outro ponto que prejudicou Onyx foi o desempenho nitidamente inferior ao do adversário nos debates de segundo turno, reconhecido até mesmo por apoiadores do ex-ministro. Em muitos casos, ele partiu para o ataque e não conseguiu apresentar propostas concretas, ao contrário de Leite, que intercalou o confronto com a menção a números do governo e ideias para uma futura gestão.
Dois episódios específicos se espalharam pelas mídias sociais e retrataram a dificuldade de Onyx para se contrapor ao oponente. O primeiro foi a discussão sobre o regime de recuperação fiscal (RRF) no embate da Rádio Guaíba, em que foi questionado nove vezes sobre uma alternativa ao acordo firmado por Leite, mas não conseguiu dar uma resposta definitiva. O segundo, no último debate, da RBS TV, foi quando disse que "a melhor vacina que existe é pegar a doença", durante discussão sobre a pandemia de coronavírus.
Nos embates, Onyx tentou reforçar pontos de desgaste do tucano, como a renúncia ao cargo, as medidas restritivas adotadas durante a pandemia e a pensão recebida por Leite como ex-governador, mas a estratégia não surtiu efeito.
A campanha do candidato do PL já havia sofrido um revés quando se negou a cumprimentar o tucano depois do debate na Rádio Gaúcha. Na ocasião, argumentou que fora acusado injustamente de cometer homofobia velada em seu programa de rádio. Onyx e sua equipe jamais admitiram essa intenção, mas a narrativa acabou prejudicando a campanha.
— Foi um momento duro, triste. Ele nunca deixou de se posicionar e dar discursos incisivos em 30 anos, e jamais teve uma vírgula no sentido de misoginia, homofobia nada. Não é racional que ele fosse fazer isso em uma eleição para o governo em que estava na frente — justificou o deputado Rodrigo Lorenzoni, filho do candidato.
Por fim, Onyx participou de escassas atividades de rua na semana decisiva, optando por conceder entrevistas a veículos do interior do Estado e participar de encontros restritos com apoiadores e cabos eleitorais. A campanha de rua foi reforçada na reta final pelo prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, mas isso foi insuficiente para reverter ou mesmo estancar a vantagem de Leite na Capital.
Questionado na quarta-feira sobre a presença reduzida de Onyx nas ruas, Melo tergiversou, mas não discordou do diagnóstico.
— Estou fazendo o que posso para ajudar — comentou o prefeito.
Durante todo o segundo turno, os apoiadores insistiram na necessidade de se aproximar do eleitorado de menor renda, sobretudo nas regiões periféricas na Capital e dos municípios vizinhos. A preocupação foi externada pelo deputado Giovani Cherini, um dos estrategistas da campanha, em reunião com cabos eleitorais a duas semanas da eleição:
— Não adianta ficar só no "zap zap". Muitas vezes, o pobre tem um celular que nem consegue abrir o vídeo que enviamos. Esse eleitor que precisamos buscar, do bairro, da vila — apelou Cherini.
A despeito da convocação, a dificuldade se confirmou nas urnas, com a votação de Porto Alegre mostrando-se decisiva para a derrota de Onyx. Na Capital, Leite arrematou 68,99% dos votos, mais do que o dobro de Onyx, que ficou com 31,02%.
Além de Porto Alegre, a grande decepção da campanha foi Caxias do Sul, onde o candidato do PL estimava fazer o dobro dos votos de Leite, mas a eleição foi equilibrada do início ao fim e terminou com uma surpreendente vitória do tucano, por pouco mais de cem votos de diferença.
Neste domingo, depois do pronunciamento em que Onyx aceitou a derrota, Giovani Cherini, que é vice-presidente do PL estadual e foi cotado para chefiar a Casa Civil do novo governo, evitou apontar erros específicos que levaram à derrota.
— Quando se ganha, existem mil explicações fáceis. A derrota te deixa sozinho. Todo o argumento que se buscar, não vai retratar, porque a derrota é um conjunto de fatores que falharam. Na verdade, eles (campanha de Leite) foram mais competentes e fizeram mais votos.
Propaganda na TV
Outro fator avaliado como decisivo por integrantes da campanha para o insucesso é a falta de inovação nos programas de rádio e televisão. Ao contrário do adversário, Onyx não trouxe novidades na propaganda de segundo turno e permaneceu com o mesmo tom do primeiro.
As críticas ao adversário foram mais brandas que os ataques recebidos. Como tinha menos espaço no turno anterior, dedicou a maior parte do tempo a listar propostas, como a abertura de clínicas de especialidades para a saúde, a criação de um programa de irrigação para o agronegócio e a concessão de um complemento ao Auxílio Brasil. No entanto, os projetos não foram detalhados com profundidade.
A linha da campanha incomodou aliados, que cobraram uma reação no mesmo tom aos ataques recebidos de Leite, mas isto não ocorreu.
O principal foco de ataques ao candidato do PL foi a admissão de que recebeu dinheiro não contabilizado para as campanhas de 2012 e 2014, prática conhecida como caixa 2. Onyx sempre respondeu que havia se "resolvido com Deus" e que o povo gaúcho o conhecia, mas se recusou a enfrentar o tema e explicar o caso.