Um dia depois de se garantir no segundo turno da disputa ao Palácio Piratini, o governador e candidato à reeleição José Ivo Sartori, junto do seu partido, o MDB, correu para vincular sua imagem à do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), que elegeu uma legião de seguidores nas disputas legislativas.
Apesar da aproximação, Sartori evita comentar as propostas de Bolsonaro. E diz que sequer conhece a plataforma política do capitão da reserva. Limita-se a sugerir que, pela amostragem das urnas no primeiro turno, “a maioria do pessoal” está alinhada com o líder do PSL.
O governador voltou a defender a adesão do Rio Grande do Sul ao regime de recuperação fiscal, proposto pela União, para contornar a crise financeira. Justificou que o tamanho do déficit e o risco de perder a concessão no setor de energia elétrica são determinantes para a privatização ou federalização da CEEE. Sobre problemas emergenciais, ainda não sabe como pagar o 13º salário do funcionalismo e, ganhando ou perdendo a eleição, pretende lançar até o final do ano o primeiro edital para concessão de estradas da sua gestão. Confira abaixo a entrevista de Sartori, que disputa com Eduardo Leite (PSDB) a preferência do eleitor gaúcho para comandar o Palácio Piratini.
Confira a entrevista:
Uma das suas principais propostas é a adesão ao regime de recuperação fiscal, mas até agora não foi assinado nem o pré-acordo. O que lhe garante que o acordado será mantido?
Em primeiro lugar, acredito que fizemos uma caminhada no governo desde o começo, quando percorremos o Rio Grande do Sul mostrando a realidade financeira. Começamos a renegociação da dívida (com a União). Depois, veio uma oportunidade, ingressando na Justiça, junto especialmente com Minas Gerais e Rio de Janeiro, e conseguimos a redução do juro da dívida, de 6% para 4%.
E o alongamento da dívida do Estado por 20 anos, o que permite que, em 2028, tenhamos redução do estoque da dívida em torno de R$ 22 bilhões. Às vezes, as pessoas não entendem o que é o plano de recuperação fiscal. Acredito que o acordo prévio esteja praticamente pronto.
Mas seria assinado quando?
Não sei, depende do Tesouro Nacional e do governo federal.
Por que o Rio conseguiu assinar e o Rio Grande do Sul não?
Lá eles aprovaram na Assembleia a colocação da companhia de saneamento (ativos como garantia) e todas as outras autorizações antecipadas. E não tivemos. Desde 2016, apresentamos para a Assembleia a retirada do plebiscito (para privatizar) CEEE, CRM e Sulgás, que seriam os ativos que iríamos oferecer como contrapartida.
O governo do Rio se articulou melhor para aderir ao regime?
Eles foram... Mas é que também a crise do Rio de Janeiro era superior a nossa. Foi o que disse para as autoridades federais: “não podemos ser penalizados porque estamos fazendo o dever de casa”.
O senhor quer privatizar a CEEE. Acredita que os serviços da RGE e da RGE Sul, que atuam em áreas onde a CEEE foi privatizada no governo Britto, são satisfatórios? Segundo a Agergs, o tempo médio de atendimento às ocorrências emergenciais na CEEE é menor. No preço, a tarifa da classe residencial é menor na CEEE. A privatização é o único caminho?
Isso (preço) é por causa da legislação nacional, contabilidade diferente. Nunca colocamos a privatização como única alternativa. Sempre colocamos a federalização também. É bem verdade que a parte sul, oriunda da AES Sul (atual RGE Sul), realmente tinha dificuldades, tanto que ela foi adquirida agora pela RGE.
É verdade também que a própria CEEE auxiliava nas dificuldades emergenciais que a AES Sul tinha.
A grande dificuldade não é o que ela (CEEE) pode fazer. O grande problema é ter os recursos necessários. Se vocês pesquisarem o déficit da CEEE, vão ficar abismados.
O senhor teme que, caso a CEEE não seja vendida ou federalizada, o governo tenha de entregá-la de graça?
O maior problema não é esse. O problema é não ter condições de manter a concessão (de energia elétrica). Aí o furo é muito pior.
Os problemas da CEEE são de gestão. Se o negócio é ruim, qual a empresa privada irá assumir a CEEE para ter prejuízo?
Não é só gestão. É que ao longo da vida ela esteve voltada para si mesma. E o Estado também foi assim. Às vezes, não quer se mexer nisso por sentimentalismo, por história. Agora o mundo mudou, a sociedade mudou, e temos de tomar atitude. Estou fazendo o que posso fazer. Talvez tenha faltado apoio, solidariedade e união.
O senhor tem um problema imediato para resolver até o final do mandato que é o 13º salário. Nos anos anteriores, houve empréstimo do Banrisul, que está sendo questionado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Como planeja pagar?
Olha, vamos esperar que aconteça alguma coisa de bom e que isso possa ser solucionado.
Mas essa coisa de bom seria...
Ano passado, fizemos em etapas.
O mais provável é que seja um parcelamento direto?
Antes de dezembro, tenho certeza que a gente não pode dar uma opinião muito clara sobre isso.
O senhor recomendaria que os servidores públicos não façam compras no final de ano?
Não sei. Isso é uma questão que lá adiante temos de tomar uma atitude para não deixar ninguém mal.
O senhor diz que é uma questão para "lá adiante". Já estamos em outubro.
Está em cima. Mas é que hoje estamos pensando em como vamos quitar toda a folha do mês que passou. É a realidade.
Então não tem garantia de como fazer?
Com certeza vamos ter uma atitude e resolver o problema de uma forma ou de outra. No Banrisul, dificilmente poderá ser feito (empréstimo) diretamente.
O senhor vai manter a atual estrutura das secretarias ou planeja reforma administrativa?
Daí é outra realidade, seria uma previsão de futuro muito antecipada. Com a estrutura que temos hoje, vamos até o dia 1º de janeiro. Passamos de 29 para 16 secretarias.
Um dia depois da eleição em primeiro turno, o senhor e o seu partido declararam apoio ao presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) sem ressalvas. O senhor concorda com toda a plataforma política dele?
Na verdade, o pessoal sempre gosta de me colocar na frente da decisão do partido. "Olha, tu tens a tua história, tens a tua vida, como tu vais nesta direção?" Sou candidato à reeleição por uma exigência partidária. Recebi isso como uma missão. Na conjuntura nacional, a população demonstrou desejo de mudança e insatisfação. E escolheu uma saída, tanto lá quanto aqui. Tanto é verdade que estamos indo para o segundo turno sem ninguém da oposição praticamente.
Mas o senhor faz alguma ressalva às ideias de Bolsonaro?
Quando o partido decidiu, não me cabia mudança. E não vou ficar divagando sobre possibilidades. O partido decidiu, é uma decisão com parte dos partidos que estavam na coligação, exceto o PSB. Não me cabia nenhuma omissão.
Mas a pergunta é outra. Em nenhum momento o senhor sente desconforto pelas ideias expressas por Bolsonaro?
Não vou me reportar sobre isso. É uma decisão partidária, foi colocado mesmo que contrariamente ao passado. Na hora oportuna, vocês terão a minha opinião.
Quando o partido decidiu, não me cabia mudança. E não vou ficar divagando sobre possibilidades. O partido decidiu, é uma decisão com parte dos partidos que estavam na coligação, exceto o PSB. Não me cabia nenhuma omissão.
JOSÉ IVO SARTORI
Sobre apoio a Bolsonaro
O senhor é uma liderança política e tem história no MDB. As pessoas esperam que o senhor manifeste essa liderança por meio de gestos e palavras. E o senhor se nega a falar.
Pelo o que tenho visto, o pessoal concorda com a posição do MDB.
Mas a pergunta que o senhor ainda não respondeu é se concorda com toda a plataforma política de Bolsonaro?
Mas olha, nem conheço.
Todos os índices mostram que o Rio Grande do Sul vai de mal a pior na educação. O que teremos de diferente se o senhor for reeleito?
Já começamos uma boa caminhada. O secretário de Educação está conversando com todas as coordenadorias regionais, com os professores. Atitudes novas indicam que as tecnologias têm de estar mais presentes nas escolas.
Foi por isso, também, que começamos a fazer, dentro das dificuldades que temos, obras nas escolas para que sejam um ambiente receptivo e as Cipaves (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolas), uma experiência de Caxias do Sul trazida para o governo, que gera acolhimento.
Qual sua proposta para melhorar o Ensino Médio?
Vamos ter de avançar muito na educação continuada, na qualificação dos professores. É claro que as circunstâncias não favorecem. No Brasil inteiro é assim. No Ensino Fundamental, recebemos recentemente um elogio do Ministério da Educação, porque alcançou uma média superior. Tem de cuidar da repetência, da evasão.
Muitos governos, para combater repetência e evasão, acabam facilitando a aprovação dos alunos, sem que tenham condições. Como se resolve isso?
Nem quero falar sobre isso, porque de repente vão voltar assuntos e experiências que foram feitas, inclusive no Rio Grande do Sul, que só trouxeram retrocesso à educação.
Que experiências?
Por exemplo, o politécnico ou aquela outra situação anterior, que, em Caxias do Sul, finalizei. A escola e a sala de aula não podem ser um lugar de proselitismo político e ideológico. A escola é para ensinar o aluno e ele aprender.
O senhor é a favor do projeto Escola sem Partido?
Não diria que seja isso, Escola sem Partido, mas um mínimo de escrúpulo tem de existir. O que quero dizer é que a sala de aula tem de ser o lugar de aprendizagem. Tanto é verdade que o Rio Grande do Sul foi o lugar que menos teve invasão de escola. Sabe por quê? Porque os alunos, nas Cipaves, impediram que isso acontecesse.
O senhor teve uma relação bastante difícil com os professores, com greves...
(Interrompendo) Mas não foi só da nossa parte. E dos professores? O problema é da entidade. E a entidade, o que fez?
O senhor fala da relação com o Cpers? Mas, na prática...
(Interrompendo) Tivemos muitas paralisações e isso sequer foi conversado conosco. E sem trabalho não se faz qualidade de ensino.
Em relação ao futuro, o que os professores podem esperar, sabendo que a lei de diretrizes orçamentárias de 2019 prevê mais um ano de congelamento de salários e que a lei do piso não é cumprida?
A lei do piso está sendo contestada nacionalmente. Isso não só no Rio Grande do Sul. Em tudo.
O senhor acha que a lei do piso deveria ser revogada?
São leis feitas, às vezes, sem conhecer a realidade.
Durante o seu governo houve a contratação pelo Daer de um serviço desnecessário que gerou sobrepreço de R$ 500 mil. Na época, o senhor não fez nenhuma manifestação, ninguém foi afastado, apenas foi aberta sindicância. Depois, o ex-diretor do Daer que assinou esse contrato ganhou um CC na Secretaria dos Transportes. Essa não é a política que o senhor diz combater?
Acho que essa questão está resolvida e é anterior ao nosso governo.
A contratação foi feita em 2016, no seu governo.
Mas o fato é anterior inclusive ao nosso governo, que não tinha sido feito nada, e graças a Deus a questão está judicializada, está se fazendo todas as coisas que têm de ser feitas e não admitimos de jeito nenhum.
O senhor avalizou a nomeação desta pessoa para um CC?
Olha, às vezes você chega e não sabe do acontecimento ou do citado. Daqueles que tenho conhecimento, sempre tomamos atitude.
O senhor falou que o caso está resolvido, mas como resolvido?
Sim, está sendo feita a sindicância e a apuração de todos os fatos.
Mas a sindicância já acabou e os R$ 500 mil não voltaram para o cofre do Estado.
Bom, alguém vai ter de ressarcir.
O senhor aprovou o marco regulatório para as concessões e parcerias público-privadas (PPPs), mas isso não deslanchou. Se for reeleito, que estradas o pretende conceder e que outras áreas poderão ser foco das PPPs?
Nas concessões, tem o marco regulatório, tem a aprovação na Assembleia, contratamos a consultoria que ainda não entregou totalmente (o estudo), mas já tem um esboço do que deve ser e acredito que os primeiros editais deveremos lançar ainda neste ano. Não vamos avançar no ponto de querer fazer rapidamente, sem observar a lei.
O senhor falou em lançar editais até o fim do ano, sendo reeleito ou não?
Acredito que sim, independentemente de qualquer coisa. Estando pronto, sou obrigado a apresentar para a sociedade. Em relação às PPPs, a mais importante de todas foi a da Corsan. E todos os nove municípios (incluídos na PPP), menos um, já deram assentimento a esse processo. Está faltando a posição da Câmara de Vereadores de Canoas. Tanto nas concessões, quanto na PPP, somos o que implementou, o que pelo menos colocou para fora. Se tivesse havido anteriormente essa posição, nós já teríamos avançado muito mais, embora a PPP da Corsan tenha começado ainda no governo passado.