Mais de 10 milhões de brasileiros decidiram não escolher candidato no primeiro turno da eleição presidencial. GaúchaZH pediu a cinco eleitores que explicassem os motivos que os levaram a declarar voto branco ou nulo no segundo turno.
Não vou votar em ninguém porque estou desacreditado.
"Para governador, não voto em nenhum deles, não. Vou votar nulo ou branco, seja o que for lá. Vou votar o que não vale, não sei se é nulo ou branco. É nulo, é nulo. Porque entra um, entra outro, e nunca ninguém faz nada. É toda a vida a mesma coisa, a mesma novela deles. Não vou votar em ninguém porque estou desacreditado. Ainda mais para mim, que sou agricultor, e agricultura está virada num nada. Eles vão lá, prometem milhões para a gente, e não fazem porcaria nenhuma. Tem esse gurizão (Eduardo Leite, do PSDB) que vem aí, parece que é meio do partido desse que é o prefeito de Porto Alegre (Nelson Marchezan), aí já vem uma coisa pela outra, ninguém faz nada. Estou desacorçoado. Para presidente, vou dar o meu voto, mas não coloca em quem, porque nessa semana já perdi clientes por causa do meu candidato."
Para presidente, nenhum dos dois está à altura do Brasil.
"No primeiro turno votei no (João) Amoêdo para presidente e no Mateus Bandeira para governador (ambos do Novo). Agora vou votar nulo para presidente e governador, acho. Para presidente, nenhum dos dois está à altura do Brasil. Um tem muitas ideias contra o que eu acredito, e o outro também. O (Jair) Bolsonaro (PSL) é extremista, tem muitas ideias de ódio, com as minorias, com pobres, com índios. E o (Fernando) Haddad (PT) foi prefeito de São Paulo e saiu com 17% de aprovação. Não me sinto à vontade de votar em nenhum. Para governador é difícil também. Os dois são bem parecidos, e nenhum me agrada. O (José Ivo) Sartori (MDB) fez coisas boas em Caxias, até pensaria em votar nele, mas não acho que fez um bom governo. E o Eduardo Leite (PSDB) fez coisas que também não concordei em Pelotas, tipo a questão dos exames de útero das mulheres. Como mulher, não me sinto bem votando nele. Também contribui que os dois apoiam o Bolsonaro, apoiam as ideias dele."
Os dois vão para o mesmo lugar, e é o lugar que eu não quero ir.
"Estou em dúvida entre branco e nulo para governador. Porque os dois candidatos são, a bem dizer, iguais. É o mesmo viés, o mesmo estilo do que vão fazer no poder. Não tem opção. Os dois vão para o mesmo lugar, e é o lugar que eu não quero ir. Infelizmente, não tenho como quantificar qual dos dois vale mais a pena. Tanto faz. O apoio deles ao (Jair) Bolsonaro (PSL) não influi nisso, não acredito que eles concordem com o que o Bolsonaro fala. Os dois só querem ganhar voto, é estratégia. Acredito que vai ter muito voto em branco e nulo, no segundo turno. Não sei se vão ficar em primeiro, mas acho que vão ficar em segundo lugar. Toda a esquerda vai ter esse mesmo pensamento. É só pegar a porcentagem do que tem de esquerda no Estado, e isso vai ser os brancos e nulos."
Vejo o voto nulo como forma protesto, de mostrar que rejeito os dois.
"É a primeira eleição em que voto. Já votei nulo para presidente no primeiro turno. Porque nenhum candidato tinha o ideal que busco. Para o segundo turno, ficou mais complicado. O (Fernando) Haddad (PT) representa uma coisa que não é verdadeira. E o (Jair) Bolsonaro (PSL) tem todo o discurso extremista. Vejo o voto nulo como forma protesto, de mostrar que rejeito os dois. Para o governo do Estado, votei no Eduardo Leite (PSDB), achei a proposta interessante, mesmo sendo de um partido ruim. Acreditei nele. Mas para o segundo turno, não sei se ainda voto nele. Porque agora deu para ver um pouco melhor o que ele está tentando fazer. Ouvi depoimentos de algumas pessoas sobre ele. E o (José Ivo) Sartori (MDB) também não é um cara muito bom."
No debate dos dois, só falaram em privatizações. As propostas são muito próximas.
"Para governador, vou anular. Porque nenhum dos dois concorrentes me representa e porque, votando branco, eu deixaria o voto em aberto para o primeiro colocado (na verdade, tanto voto em branco quanto nulo não são considerados válidos e não têm influência direta na eleição). Não é o único motivo, mas também vou anular porque os dois apoiam o (Jair) Bolsonaro (PSL). Se estão apoiando o Bolsonaro, acredito que concordam com as barbaridades que o Bolsonaro fala. Eu estava determinada a, se um deles não se posicionasse a favor do Bolsonaro, dar para esse o meu voto, apesar de achar que nenhum dos dois é adequado. No debate dos dois, só falaram em privatizações. As propostas são muito próximas. Tinha esperança de que o Leite (PSDB) fosse apresentar alguma coisa de mais relevante para o segundo turno, mas não apresentou nada. No primeiro turno, meu voto foi Jairo Jorge e Ciro (Gomes, candidatos do PDT ao Piratini e ao Planalto, respectivamente)."
— O nível de insatisfação levou muita gente a traçar a hipótese de que teríamos um volume recorde de brancos e nulos. Não aconteceu. Por mais que o eleitor não gostasse das opções, e não gostava mesmo, preferiu votar para evitar o mal maior — avalia o cientista político Leonardo Barreto, sócio proprietário da Factual Informações e Análise.
Ainda assim, foi expressiva a quantidade de gente que se deu ao trabalho de ir a um local de votação e, no final, diante de 13 opções, não escolheu nenhum candidato a presidente. Na soma, são mais de 10 milhões de brasileiros. Por que fizeram isso? Que mensagem pretenderam passar? Uma primeira dificuldade diante dessas questões diz respeito a identificar qual a diferença entre o branco e o nulo.
Esses conceitos remetem ao tempo em que se votava numa cédula de papel, e a distinção era mais simples. O voto em branco era o daquele eleitor que pegava a cédula e a depositava direto na urna, intacta — o que se interpretava como indiferença. O nulo, por sua vez, era o voto da atrapalhação ou da avacalhação. Na primeira hipótese, a pessoa se embananava com a cédula, preenchia errado, e o voto acabava anulado. Na segunda, o eleitor levava a cédula até a cabine e dedicava-se a riscá-la, a rabiscá-la com palavrões e a votar em quem não era candidato. Essa intervenção era entendida como protesto.
A urna eletrônica, universalizada nas eleições presidenciais em 2002, tornou esses cenários obsoletos, fez despencarem os votos inválidos e dificultou a compreensão da diferença entre branco e nulo.
— Não há uma pesquisa que identifique o que, na cabeça do eleitor, leva a essa distinção. Nós, que investigamos comportamento eleitoral, é que tentamos atribuir algum significado, vendo o branco como uma espécie de não-posicionamento e o nulo como uma forma de crítica — afirma o cientista político Paulo Peres, da UFRGS.