Com a maior bancada na Câmara dos Deputados e sobrevida política assegurada pelo avanço no segundo turno — ainda que com derrota —, o Partido dos Trabalhadores (PT) se credencia para liderar a oposição a Jair Bolsonaro (PSL) no Congresso Nacional. O desafio, na avaliação de analistas e observadores, será superar divergências e aglutinar o apoio de siglas que se mantiveram longe do palanque de Fernando Haddad (PT) na reta final da disputa, como o PDT de Ciro Gomes.
— A grande dúvida não é saber como o PT vai se comportar, mas se ainda terá ascendência sobre a esquerda. O partido sempre teve mais habilidade em ser oposição. A questão é que o discurso petista já não cola como antes e não sabemos que PT teremos daqui para frente: será o de Haddad, que fez um arremedo de mea culpa? Sou um pouco cético quanto a isso. Lula ainda tem grande influência sobre o partido — analisa o cientista político Leandro Consentino, do Insper.
Nos bastidores, setores alinhados a Haddad defendem uma postura mais moderada e aberta ao diálogo, no estilo do ex-prefeito de São Paulo (SP) que, ao sair da sombra de Lula, ganhou musculatura dentro do partido. A avaliação é de que essa conduta seria mais condizente com a retórica da defesa da democracia, a ser mantida e explorada, e fundamental para tornar possível a frente política ensaiada no segundo turno, cuja proposta deve ressurgir no Congresso.
Líder do PT na Câmara e integrante da coordenação da campanha de Haddad, o deputado federal Paulo Pimenta sustenta que, ao se tornar representante da "resistência ao fascismo e à extrema direita", a sigla assume uma nova condição.
— O PT continua sendo o maior partido do Brasil e sai mais forte dessa eleição — resumiu o parlamentar, antes mesmo de conhecer o resultado deste domingo (28).
Isso não garantirá adesões imediatas, como se viu no segundo turno. Com um capital político de 13,3 milhões de votos, Ciro Gomes dificilmente aceitará se submeter ao domínio petista, o que ficou claro no vídeo gravado às vésperas da votação, quando se apresentou como alternativa para 2022. Na mesma linha, o ataque do senador eleito Cid Gomes (PDT) ao PT, em Fortaleza (CE), antecipou a disputa pela liderança da oposição.
Até mesmo Marina Silva (Rede) deixou claro que, independentemente de quem vencesse a briga, ficaria do lado oposto.
Outro derrotado em outubro, o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), preferiu ficar neutro na segunda rodada — embora membros da sigla tenham se dividido entre Haddad e Bolsonaro. O destino da agremiação ainda está aberto, mas a hipótese de que busque um lugar entre os críticos do novo governo não está descartada. Ex-presidente do PSDB, o senador Tasso Jereissati é uma das vozes a defender a formação de "um grupo do bom senso, seja de esquerda ou de direita".
— O PSDB vai ter de se virar nos 30 para liderar esse bloco. Ao que parece, tentará fazer oposição pelo centro, enquanto o PT tentará liderar a oposição pela esquerda — projeta Consentino.
A possibilidade de aproximação entre os dois partidos não é totalmente descartada por especialistas, mas isso dependerá dos rumos da gestão de Bolsonaro.
— Não duvido de que PSDB e PT se aproximem se houver um inimigo comum, como a perda de direitos e a ameaça às liberdades civis, por exemplo. Nesse caso, deverá haver uma disputa sobre quem será o protagonista. Não é porque o PT tem a maior bancada que assumirá a frente, embora esteja em vantagem no Legislativo e, muito provavelmente, isso venha a ocorrer — pondera Andréa Freitas, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Unicamp.
A liderança da oposição tende, no futuro, a se reverter em capital político para quem já pensa nas próximas eleições, avalia a pesquisadora. Se o capitão da reserva não corresponder aos anseios de seus eleitores e às ambições do mercado com a brevidade esperada, as chances de crescimento de seus críticos aumentam. Inclusive no PT.