O dia em que Eduardo Leite disse "não"
Encerrado o expediente na prefeitura de Pelotas naquele final de tarde, o então prefeito, Eduardo Leite (PSDB), chamou a vice, Paula Mascarenhas, para uma conversa em sua casa. Era novembro de 2015 e os dois amigos se acomodaram no sofá do pequeno apartamento da Rua General Telles, de mobília espartana e geladeira quase sempre vazia. Com olhar circunspecto, Eduardo falou pela primeira vez sobre uma disposição que já vinha ruminando há semanas:
— Olha, Paula, acho que não vou concorrer à reeleição. É ruim, segundo mandato nunca é como o primeiro. E acho que tem de ser tu.
Começava ali, no desabafo à confidente, a trajetória que levaria o advogado a se tornar o mais jovem candidato a governador nas eleições de 2018. Paula ficou estupefata. Eduardo tinha uma gestão aprovada pela ampla maioria dos pelotenses e era favorito para o pleito de 2016. Pouco depois, com a decisão ainda mantida em segredo, eles chamaram para uma reunião a cientista política Elis Radmann, diretora do Instituto de Pesquisas de Opinião (IPO). Consultada sobre a hipótese de Leite abrir mão da candidatura à reeleição, Elis foi taxativa:
— Não faz isso. Vais jogar fora teu capital político.
De nada adiantaram os apelos. Eduardo queria eleger Paula, concluir o mandato e estudar Gestão Pública nos EUA. Em 2018, disputaria uma vaga de deputado federal. Os três primeiros objetivos foram atingidos. A eventual transferência para Brasília terá de esperar.
Caçula dos três filhos do advogado José Luis Marasco Cavalheiro Leite e da professora universitária Rosa Eliana Figueiredo, Eduardo cresceu numa casa que respirava política. Quando ele tinha três anos, em 1988, o pai concorreu a prefeito de Pelotas pelo PSDB, legenda na qual assinara a ficha número 1 no município. Acabou em último lugar, com 2.512 votos. Anos mais tarde, Marasco surpreenderia o adolescente sentado no sofá de casa, assistindo no videocassete às gravações da propaganda política do pai.
O guri comentou:
— Tu tinha boas ideias, pai. Mas não sabia expressá-las.
Ex-chefe de gabinete e secretário no primeiro governo de Bernardo de Souza (1983-1987), Marasco pressentiu o destino reservado ao filho.
Nos anos seguintes, Eduardo elegeu-se presidente do grêmio estudantil do colégio, foi militante voluntário em todas as eleições e, completando 16 anos num sábado, na segunda-feira seguinte providenciou o título de eleitor.
Na mesma época, em uma festa de amigos, foi apresentado a Paula Mascarenhas. A eloquência com que defendia o governo Fernando Henrique Cardoso encantou a então coordenadora da bancada do PPS na Assembleia Legislativa.
— Eu tinha certa resistência ao governo do Fernando Henrique, mas fiquei impressionada com a defesa que ele fez. Voltei a Porto Alegre e disse ao Bernardo: “O filho do Marasco é um espetáculo”.
De 8% nas intenções de voto a líder nas pesquisas
Em 2004, Eduardo concorreu a vereador, mas ficou na suplência. Chamado por Bernardo na sua segunda gestão como prefeito, ocupou cargos de segundo escalão, presidiu o Conselho de Assistência Social e foi secretário interino de Cidadania antes de chefiar o gabinete de Fetter Júnior, que assumiu a prefeitura após afastamento de Bernardo para tratamento de saúde.
À época, Eduardo cursava Direito na Universidade Federal de Pelotas, onde conheceu Nadison Hax, um jovem entusiasta da política como ele, porém petista. Colegas de turma durante toda a faculdade, eles forjaram uma sólida amizade.
— Em 2006, me filiei ao PSDB a pedido dele. Eu estava desencantado após o mensalão, ele me olhou e disse: “Eu te avisei” — ri Nadison.
Eduardo elegeu-se vereador em 2008 e, quatro anos depois, chegou à prefeitura. Ao comunicar aos aliados que não queria concorrer a um novo mandato, ouviu que ainda não tinha “um passado como prefeito” para desistir de uma reeleição tida como certa e ousar voos mais altos. Paula acabaria eleita no primeiro turno, feito inédito na cidade.
Guindado pelas circunstâncias políticas à corrida ao Piratini, o tucano só aceitou concorrer após certificar-se de que Ana Amélia Lemos (PP), a quem apoiara em 2014, não estaria na disputa. A resposta veio em um café, em Canela, durante evento da Federasul, quando ela disse ao tucano: “De jeito nenhum”.
Ele anunciou a pretensão, saiu de 8% nas primeiras pesquisas para a liderança nos mais recentes levantamentos. Se vencer a eleição, aos 33 anos o “prefeito sem passado” ganha destaque nacional como o nome mais promissor do PSDB, um partido em busca de reinvenção após os escândalos que redundaram no fracasso eleitoral de Geraldo Alckmin e na decadência moral de Aécio Neves.