Um dia após ser eleito com com 53,62% dos votos e de comemorar ao lado da família e de apoiadores, o futuro governador do Estado, Eduardo Leite (PSDB), afirmou que está pronto para começar a montar sua equipe. Entrevistado pelos jornalistas Daniel Scola, Rosane de Oliveira e Carolina Bahia no programa Gaúcha Atualidade, na manhã desta segunda-feira (29), Leite agradeceu a todos os eleitores e afirmou que tem a "noção da responsabilidade de corresponder às expectativas dos gaúchos". Confira a entrevista na íntegra:
Como estão sendo as primeiras horas como governador eleito?
Ontem (28), estive acompanhando a apuração dos votos em Pelotas na casa dos meus pais. Havia centenas de pessoas lá. Estávamos tocando um sambinha, esperando entre as 16h e 17h, confraternizando com a família. Saiu o resultado, tive oportunidade de comemorar lá. Pelotas me deu 90% dos votos, que vieram de uma população que conhece meu trabalho, me conhece muito bem. Isso me deixa muito feliz. Depois,voltei a Porto Alegre, estive comemorando com o pessoal no comitê, fizemos coletiva de imprensa, cheguei a ver se conseguiria responder alguma mensagem de WhatsApp, mas já são mais de 500 mensagens, então não tem nenhuma chance de botar em dia isso rapidamente.
Como foi o momento exato, qual foi sua primeira reação quando descobriu que era o governador eleito?
Começou a apuração, nós não estávamos na frente, mas já tinha acontecido isso no primeiro turno. Estava muito tranquilo pelo resultado que viesse. Eu me realizo pelo simples fato de me colocar à disposição. Se o povo gaúcho tivesse optado por outro caminho, perfeito. Tem que respeitar a democracia, a população sabe o que é melhor para ela. O pessoal à minha volta me perguntava se eu estava ansioso. O que me deixa ansioso é a expectativa enorme das pessoas com o resultado eleitoral. Mas eu já tinha estudado o gráfico de apuração, e tinha acontecido a mesma coisa no primeiro turno. Começa entrando as urnas da região de Caxias mais rapidamente, e, depois de uma meia hora, se acomoda na posição que vai se consolidar. E foi o que aconteceu dessa vez.
O volume de investimentos necessários para que o sistema prisional seja mais efetivo é tão grande, que demandará uma secretaria específica para a administração do sistema penitenciário
Como foi a conversa ontem com José Ivo Sartori?
Foi uma conversa respeitosa. Existe um protocolo que se respeita na política, especialmente em segundo turno, na qual a gente aguarda a ligação daquele que foi derrotado para depois nos manifestarmos. Isso aconteceu quando tinha cerca de 90% das urnas apuradas. Ele (Sartori) foi muito gentil e respeitoso, assim como eu sempre o respeitei. Falamos sobre marcar nos próximos dias uma conversa que dê início ao processo de transição, em que as equipes possam se encontrar para conversar.
O número de deputados eleitos pela sua coligação na Assembleia não lhe dá maioria para governar. O senhor terá, para aprovar qualquer projeto, que construir essa maioria. Como irá conduzir essa conversa? Pretende procurar os partidos que, na eleição, estiveram com o governador José Ivo Sartori para montar um governo de coalizão, capaz de aprovar propostas na Assembleia?
Às vezes, a interpretação que se faz é que o governo está ajudando os partidos. Eu entendo contrário: os partidos é que estão ajudando o governo. Nós demos apoio ao governo. O PSDB colaborou com o governo, deu sua parcela de contribuição para ajudar o Estado através deste governo. Como nós ajudamos, também temos expectativa de sermos ajudados por esses partidos, porque, no final das contas, o que interessa é entregar resultado para a sociedade gaúcha. Milhões de pessoas aguardam ansiosamente ações do governo para melhorar suas vidas.
O Rio Grande do Sul sempre teve a lógica do conflito entre governo e oposição. Quem ganha acaba sofrendo as consequências dessa divisão, até porque historicamente o segundo turno foi disputado entre campos políticos opostos. Desta vez foi diferente.O senhor vê a possibilidade de quebrar essa lógica?
Trabalharei por isso. A campanha que fizemos foi sempre respeitosa. Tivemos confronto de visão, de forma de governo, embora eu tenha sido duramente atacado pelas fake news, mentiras, boatos. Mas para mim isso são águas passadas, não vou conduzir ações políticas com mágoas ou rancores ao que tenham feito a mim e à minha família. Queremos olhar para a frente com a noção da responsabilidade que temos para com o povo gaúcho, pelo estabelecimento de um consenso estratégico. O RS tem pontos muito importantes que devem ser considerados dentro de um grande pacto. Devemos nos unir em torno de um propósito, que deve ser a reforma na estrutura do Estado para que seja mais eficiente, mais moderno, menos oneroso, com menos custo para a sociedade, e com mais resultado. Isso demanda que possamos estabelecer o foco no ataque aos problemas e não às pessoas. Eu não entro no governo com nenhuma expectativa de exterminar quem não está comigo, que é um pouco do que entrou na política nacional.
Devemos nos unir em torno de um propósito, que deve ser a reforma na estrutura do Estado para que seja mais eficiente, mais moderno, menos oneroso
A partir de um pedido de ouvinte, pergunto se existe algum sinal para os professores em matéria salarial?
É impressionante como essa classe está angustiada. Em todos os lugares que eu fui, em todos eventos de campanha, sempre em diversos momentos, vinha alguém me abraçar e com um olhar de cobrança, como que dizendo "olhe pelos professores". Eu compreendo isso, já que 90% da nossa educação é da rede pública de ensino. Precisamos olhar para os professores da nossa rede pública com muita atenção, afinal ele são o fator determinante para entregar resultado lá na ponta. O primeiro é colocar o salário em dia. A nossa grande meta é trabalhar em um esforço de equilíbrio entre receitas e despesas que nos permita colocar os salários em dia no primeiro ano de governo.
Alguma política salarial definida para professores?
Paralelamente a isso, queremos discutir o plano de carreira. Falamos isso de forma muito transparente. É fundamental que possamos discutir o plano de carreira, afinal ele é de 1974. É o único Estado no Brasil que tem um plano de carreira anterior à Constituição de 1988. E a discussão sobre o plano de carreira vai nos viabilizar a discussão de aumentos salariais, aumento do poder aquisitivo, dentro das condições financeiras do Estado. Não tem como negar que a crise existe. Então, eu não posso prometer aquilo que não posso cumprir. A prioridade é colocar os salários em dia. Com isso, podemos começar a discutir parar de perder para a inflação. Como prefeito de Pelotas, sempre tive esse compromisso, repusemos a inflação integralmente todos os anos, mas agora as condições fiscais do Estado são outras, e a gente tem que trabalhar "as primeiras coisas primeiro". Primeiro, trabalhar para colocar os salários em dia. Depois, buscar trabalhar para não perder mais em relação à inflação.
No último debate da RBS TV, o senhor tangenciou um ponto que é muito importante para o futuro dos servidores públicos: a readequação de planos de carreira. No magistério, há muito tempo se diz que esse plano, que é dos anos 1970, precisa ser atualizado, mas os professores não querem ouvir falar em mudança no plano de carreira. O senhor já tem mais ou menos esboçado que tipo de mudança, de readequação nos planos de carreira imagina? E qual o perfil do Secretário de Educação que pretende ter no seu governo?
Quando falamos na readequação dos planos de carreira não é só na questão do magistério. Vamos fazer a definição de uma nova estrutura de carreira com o intenso diálogo com os próprios servidores e representações sindicais. Temos que discutir todos os pontos que envolvem a própria progressão na carreira, que não é respeitada, tanto que o plano existente nas diversas estruturas do Estado não é respeitado. Há critérios subjetivos, e as pessoas não conseguem evoluir na carreira porque o Estado não tem condições fiscais. Todos esses pontos são importantes para que o Estado consiga ter estruturas que tenham sustentabilidade econômico-financeira e signifiquem estímulo para os servidores.
A lógica seria a de que o salário de ingresso fosse melhor para atrair pessoas?
Sim, sem dúvida. O foco é buscar melhorar o ingresso e a base porque na estrutura que temos vigente alguns conseguem alcançar remuneração maior em detrimento de uma grande massa que acaba sem conseguir evoluir na carreira e melhorar sua condição financeira. É um tema complexo, que vai demandar um esforço grande de discussão com as categorias, para que a gente possa avançar.
E o Secretário de Educação dos seus sonhos?
Evidentemente que tem de ter capacidade de liderança em uma grande estrutura que é a Secretaria de Educação. Tem de ter capacidade técnica para poder gerenciar o funcionamento da rede. Uma das questões necessárias é gerenciar a simples presença do professor na sala de aula. Iniciamos sempre o ano letivo com falta de professores, então é um processo burocrático que tem que ser cumprido e revisado do ponto de vista da legislação para permitir contratação de forma mais ágil. Ao mesmo tempo, tem de ter autoridade perante os próprios professores. Tem de ser compreendido como alguém que agregue, e não é fácil estabelecer essa conciliação de perfis, de visão de gestão e ser compreendido como liderança para a questão pedagógica. A Secretaria da Educação vai merecer nossa maior atenção, porque o que muda o mundo é a educação.
Sobre as negociações envolvendo o famoso plano de recuperação fiscal do Estado com o governo federal, o que o senhor prefere? Que as negociações sejam paralisadas e possa retomar de acordo com o que considera ideal para o Rio Grande do Sul? Ou o atual governador pode seguir com as tratativas nesta transição?
Não entro no governo com expectativa de exterminar quem não está comigo, que é um pouco do que entrou na política nacional
Acho que o ideal é que a gente possa estabelecer, a partir do processo de transição, um contato entre as equipes técnicas do governo e aquela que começaremos a formatar para que as negociações possam avançar, respeitados os pontos que o novo governo entende como importante. Por exemplo, a questão de incremento de efetivo na área da segurança pública. A redação que está presente no acordo, e que fala apenas na reposição de vacância, sugere que apenas aqueles cargos que vierem a ficar vagos poderão ser preenchidos. E na área da segurança pública nós entendemos que não basta repor cargos vagos, precisamentos incrementar efetivo para poder prestar um serviço melhor. Vamos buscar estabelecer no processo de transição um contato próximo das equipes para que as negociações possam avançar. O que pode ser assinado é um pré-acordo, não o acordo propriamente dito, que deve ser reservado ao próximo governo. Não apenas ao nosso, como também ao novo governo federal, de Jair Bolsonaro.
O senhor já tem um nome para a Secretaria da Fazenda, que levará à diante a nova política econômica do Estado?
Sempre disse que não trato de nomes antes de ganhar a eleição. Agora, vamos trabalhar para a definição dos nomes. Vocês poderão saber disso o mais breve possível. A prioridade está em estabelecer uma equipe técnica para a área das finanças, que nos ajude a superar esse grave desafio.
Como será sua relação com o presidente eleito Jair Bolsonaro? O senhor apoiou, com alguma ressalvas, esse candidato no segundo turno.
Acho que é importante, antes de mais nada, salientar que o apoio que nós demos, a declaração do voto, foi respeitando nossas convicções, com firmeza nos meus ideais e valores. A escolha está feita pela população brasileira, eu tenho grande expectativa e desejo tudo de melhor para o presidente eleito. Vou dar minha colaboração no que for possível como governador do Estado para ajudar a construir uma agenda nacional que supere a crise que o país vive. Vi ontem algumas notícias do economista Paulo Guedes, que deve ser o Ministro da Fazenda, falando na reforma da Previdência e em outras reformas. Então, existe expectativa de que essas reformas possam andar rapidamente para que o país recupere credibilidade e confiança e isso estimule nossa economia, o que é importante para o Rio Grande do Sul também. Nós não somos uma ilha, nós sofremos as consequências dos resultados da política econômica do governo federal. A relação, da minha parte, vai ser em primeiro lugar, republicana, em defesa dos interesses do nosso Estado.
Sobre a segurança pública, uma das marcas de sua campanha é ter trazido o Delegado Ranolfo Vieira Júnior como vice-governador. Qual é a diferença que os gaúchos vão sentir com o senhor à frente do governo nessa área?
A segurança já é prioridade para nós no momento da própria escolha do vice-governador. Ao chamar um delegado que foi Chefe da Polícia Civil do Estado, que conhece o tema da segurança pública, já demonstramos nossa preocupação com o tema. Vai ser um ponto de apoio importante, não significa necessariamente que ele ocupará cargos ou espaços da segurança, mas será um conselheiro importante, que nos dará toda a sustentação para o setor. Vamos, em primeiro lugar, trabalhar desde o início do governo, e não somente no final do mandato, porque o que tem acontecido geralmente é isso. Vamos trabalhar desde o primeiro dia com foco na gestão e no incremento de nossos efetivos, a começar pelo primeiro ano, fazendo reposição ano a ano, e não somente no final do mandato. Vamos buscar estabelecer investimentos na tecnologia e na estrutura, além do próprio efetivo, e também no sistema prisional. Quero trabalhar muito na qualificação do nosso sistema prisional.
O senhor terá uma secretaria só para isso?
Estamos fazendo um estudo, e até o presente momento, essa se apresenta como a melhor alternativa. Hoje temos um secretário que se ocupa do sistema prisional e do policiamento, tanto ostensivo como investigativo. Entendemos que o volume de investimentos necessários para que o sistema prisional seja mais efetivo é tão grande, que demandará uma secretaria específica para a administração do sistema penitenciário.
Há uma preocupação que é dos prefeitos, e, desde ontem, a prefeita Fabia Richter, de Cristal, me faz uma pergunta. Há uma dívida que o senhor vai herdar com as prefeituras, com os servidores públicos. No caso da saúde, o senhor já tem um plano sobre como equacionar as questões do Estado? A saúde é municipalizada, mas o Estado tem uma parte, que é de repasse de recursos para as prefeituras.
A base de tudo está no esforço para o ajuste fiscal do Estado. Então, a concentração do nosso governo é sobre o equilíbrio das finanças e todo esse esforço fiscal será canalizado para os serviços mais importantes. Evidentemente, a saúde está entre eles. A prefeita Fabia e os demais prefeitos podem ter certeza que eu quero ser um governador muito próximo aos municípios para estabelecermos programas qualificados de prevenção na área da saúde. É claro que isso não se opera num estalar de dedos, em um passe de mágica. Entre outras ações para o esforço de equilíbrio fiscal, está, nas próximas semanas, a prorrogação das atuais alíquotas do ICMS junto à Assembleia Legislativa. É uma série de medidas que teremos que tomar para o equilíbrio fiscal do Estado.