Em plena campanha eleitoral, a Primeira Turma decidirá se o candidato Jair Bolsonaro (PSL) será réu pela terceira vez no Supremo Tribunal Federal (STF). Mesmo sem impactar a sua elegibilidade, o julgamento ocorre em meio a lacuna envolvendo a anuência para que processados disputem a Presidência da República.
Marcada para terça-feira (28), a análise sobre o recebimento da denúncia por racismo oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) remete a abril do ano passado. Em uma palestra no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, Bolsonaro fez declarações consideradas racistas contra quilombolas.
Já o hiato sobre réus na Presidência é anterior. Em dezembro de 2016, o Supremo decidiu que o senador Renan Calheiros (MDB-AL) não poderia eventualmente substituir o presidente na linha sucessória porque é réu. Porém, manteve o alagoano no comando do Senado.
Para especialistas, o entendimento da maioria dos ministros provocou um contrassenso. Um réu está impedido de chefiar o país, mas pode concorrer ao cargo e, se eleito, assumi-lo.
— De um lado, há uma decisão dispondo que quem é réu em uma ação penal não pode substituir o presidente. De outro, uma lacuna imensa admite que um candidato que responde a uma ação penal seja diplomado e empossado no cargo. É uma situação que permite várias interpretações — pontua Antônio Augusto Mayer dos Santos, advogado e professor de direito eleitoral.
Na última semana, o próprio ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo em que há acusação de racismo em relação a Bolsonaro, admitiu que o Supremo ainda precisa decidir sobre o tema. De acordo com Mello, o assunto "está em aberto".
No entanto, segundo analistas, são parcas as chances de o STF deliberar sobre a matéria a pouco mais de um mês da eleição. Especialista em direito eleitoral, o professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) Daniel Falcão não aposta na possibilidade especialmente porque o julgamento ocorre em uma das turmas do Supremo (formada pelos ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Rosa Weber, Roberto Barroso e Marco Aurélio), e não em plenário.
— Seria colocar gasolina em uma fogueira — resume Falcão.
O professor ainda esclarece que, se eleito, Bolsonaro teria os processos que responde suspensos, uma vez que a Constituição estabelece que o presidente da República só responde pelos atos relacionados ao mandato. E, mesmo se virar réu novamente, o candidato poderia seguir em campanha. Conforme o coordenador do gabinete eleitoral do Ministério Público, Rodrigo Zilio, a Lei da Ficha Limpa só causa impeditivos em casos de condenações por órgãos colegiados.
— O recebimento da denúncia não analisa a culpa de uma pessoa. Mesmo se o STF receber a denúncia, nada o impede de ser candidato — conclui o promotor.
Bolsonaro já é réu em outras duas ações no STF. Em uma delas, por injúria e apologia ao crime. A autora da denúncia é a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), sobre quem Bolsonaro declarou, em 2014, que "não estupraria a deputada porque ela não mereceria". A outra ação foi aberta após denúncia do Ministério Público Federal (MPF), que enxergou, na conduta do deputado, incitação ao crime de estupro.