Começa na quinta-feira (30) a Conferência Mundial sobre Mudanças Climáticas, a COP28, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Entre as lideranças mundiais de quase 200 países que participarão do evento – como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), junto com uma comitiva de ministros, e o vice-governador gaúcho Gabriel Souza (MDB), que terá a companhia de secretários estaduais –, apenas dois municípios brasileiros foram convidados a apresentar projetos no evento: Barbacena (MG) e Caxias do Sul, que será representada pelo prefeito Adiló Didomenico (PSDB) e pelo diretor-jurídico da Secretaria do Meio Ambiente (Semma), Daniel Caravantes.
A COP28 ocorre após três meses de muita chuva no Rio Grande do Sul, que ocasionou enchentes, deslizamentos, bloqueios em rodovias, além de deixar centenas de pessoas desabrigadas em praticamente todas as regiões do Estado. Mais recentemente, nos dias 17 e 18 de novembro, a Serra Gaúcha foi alvo de um temporal que causou, em Caxias, quedas de barreiras e uma série de problemas na infraestrutura e no abastecimento de energia elétrica.
Caxias foi convidada a participar pelo Plano Municipal da Mata Atlântica (PMMA), que recebeu projeção positiva em Brasília. O projeto é dividido em três fases, realizadas desde o governo de José Ivo Sartori (MDB) em 2012. Entre as etapas, é feita a normatização de ações de proteção, recuperação e uso sustentável da Mata Atlântica, além de realizar diagnósticos sobre a atual situação da preservação no município. Entre os programas que compõem o plano, estão o Programa de Arborização Urbana, o Programa do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o projeto Monumento Natural Palanquinho, no distrito de Criúva.
Adiló, que viaja nesta quarta-feira (29) para Dubai, classificou o PMMA como um “projeto fantástico” e destacou a felicidade em ter o projeto escolhido para ser analisado e discutido na COP28. O prefeito também antecipou que, no evento, terá agendas com ministros do governo federal, como Marina Silva, que comanda a pasta do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Ele também avaliou o momento climático pelo qual atravessa o Estado e deu a sua opinião para o que pode ser feito na prevenção de novas tragédias.
Confira a entrevista
Qual a expectativa para a conferência?
É uma coisa inédita para nós. Tivemos um projeto contemplado entre tantos municípios. Isso por si só já é uma coisa muito importante para Caxias. É um projeto que começou lá no governo Sartori, com o cadastro ambiental rural, fazendo o levantamento completo de todas as propriedades do interior. Os servidores da Semma elaboraram um projeto fantástico de reposição, aproveitando todo o levantamento e cadastros, que deu um belo projeto de recuperação. Criamos um fundo para isso e cadastramos no momento adequado, e tivemos a felicidade de o projeto ser escolhido para ser analisado e discutido na COP28. Não é pouca coisa ser escolhido em um universo tão grande de municípios. E realmente, confesso, é um belo projeto. Mais do que nunca precisamos recuperar a Mata Atlântica, o verde. A natureza está dando um recado muito forte para nós.
Como o governo municipal vai se posicionar na COP28?
Vou defender o desassoreamento dos rios. Faz pelo menos 30 anos que foi proibida a extração de materiais dos rios e eles estão com banco de areia no meio, o rio está escapando pelas laterais, avançando sobre as lavouras, destruindo estradas. Nós precisamos recompor o leito dos rios. A questão do lixo na água também é um problema seríssimo, porque continua crescendo o volume de ilhas nos oceanos e a gente sabe que causa um impacto forte, assim como desmatamento e as queimadas muito fortes que acontecem no norte do país.
Como será a busca de financiamentos e reuniões com empresários?
Sabemos que tem um banco alemão muito interessado pelo nosso projeto. É muito provável que a gente traga recursos para investir. Já temos uma agenda marcada com a ministra (do Meio Ambiente) Marina Silva. Vai ser uma oportunidade ímpar para Caxias e tenho uma expectativa muito boa de que nós seremos contemplados com recursos para investir na questão ambiental. Além disso, os três anos de estiagem fizeram com que desenvolvêssemos estudos e projetos para captação da água da chuva, então tudo isso vamos levar. Será uma experiência inédita e muito produtiva.
Temos que mudar a postura, e lembrar que o meio ambiente nos devolve tudo aquilo que a gente dá para ele.
ADILÓ DIDOMENICO
Prefeito de Caxias do Sul
Como trabalhar na prevenção de tragédias climáticas, ao invés de manter uma postura reativa?
Não adianta aumentarmos o efetivo de Defesa Civil só para se defender das intempéries. Montar um efetivo grande da Defesa Civil é enxugar gelo. Temos que tratar melhor o meio ambiente. Temos que investir muito forte na educação das pessoas. Precisamos mudar o nosso comportamento em relação ao meio ambiente. Quando fui secretário de Obras, pegamos enchentes fortes em 2013 e 2014, e investimos em piscinões. Estamos buscando financiamento de R$ 25 milhões para fazer mais quatro. Os piscinões e o desassoreamento dos rios, inclusive com barragens de contenção de alagamentos, são as grandes soluções. É um custo relativamente barato, perto do prejuízo que tem que recuperar. E o tanque de amortecimento tem se mostrado muito eficiente, veja Caxias, se não tivéssemos os tanques de amortecimento, teríamos vários bairros embaixo d’água. Caxias adotou piscinões, galerias de escoamento, banhados de amortecimento em novos loteamentos, que estamos exigindo. Isso, com o tempo, vai trazer um benefício muito grande. Mas não é só isso, temos que educar as pessoas, tratar melhor a questão ambiental. O nosso município é um exemplo de proteção da vegetação.
Que lições sobre o meio ambiente ficam após os últimos meses? O que pode ser feito para melhorar?
Ou a gente retrocede ou a questão climática avança de forma que vamos ter muita dificuldade para suportar. Dessa vez, Caxias escapou relativamente bem porque fizemos investimento de R$ 62 milhões em máquinas, e todos os distritos estavam bem equipados e conseguiram dar uma resposta rápida. Mas isso não é suficiente. Não podemos continuar a vida inteira enxugando gelo e reparando prejuízo. Temos que mudar nossa postura, ser mais práticos, parar com falsas teorias e lembrar que o meio ambiente nos devolve tudo que a gente dá para ele. Estamos esgotando muitos potenciais do nosso planeta, e isso tem limite. Está na hora de o ser humano começar a olhar para isso. Se acostumar com esse “novo normal” ou montar superestruturas de Defesa Civil é se conformar com os maus-tratos ao meio ambiente. Prefiro fazer a prevenção, ter forças para dar socorro, reconhecer a capacidade generosa de solidariedade do nosso povo. Precisamos virar esse jogo com educação, projetos, tanques de amortecimento e urgentemente, o desassoreamento dos rios.