Após a repercussão nacional das suas declarações discriminatórias, o vereador Sandro Fantinel (sem partido após expulsão do Patriota) terá que responder politica e criminalmente, após sugerir que produtores da Serra "não contratem mais aquela gente lá de cima" e dizer dos baianos que "a única cultura que eles têm é viver na praia tocando tambor". Na quinta-feira (2), a Câmara de Vereadores abriu processo de cassação contra o parlamentar, e a Casa deve analisar em até 90 dias se afasta Fantinel do cargo de vereador e se ele irá perder seus direitos políticos pelos próximos oito anos. Na esfera criminal, existem investigações em andamento na Polícia Civil e Ministério Público de Caxias do Sul, além da Polícia Federal.
Na quarta-feira (1º/3), a 1ª Delegacia de Polícia (1ª DP) de Caxias do Sul abriu inquérito e encaminhou ofício à Câmara de Vereadores solicitando as gravações do pronunciamento de Fantinel. Segundo o delegado Rafael Keller, o Legislativo já forneceu as cópias e os áudios, e o material está em análise pela polícia neste momento. Segundo Keller, a DP faz apuração de possível crime de racismo, que, se for confirmado, é passível de detenção entre 2 e 5 anos.
— Estamos analisando (as imagens) no contexto geral, e não em pequenos trechos, para podermos fazer a análise integral. Isso está em andamento na Polícia, junto com a documentação das mídias fornecidas. A investigação tem um prazo de 30 dias a partir da instauração para que seja concluída, a ideia é que a gente consiga finalizar o quanto antes. Sabemos que, infelizmente, a quantidade de trabalho que a polícia tem é gigantesca, nossa ideia é, até a semana que vem, encerrar esse inquérito — declarou o delegado.
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), através da Promotoria de Justiça de Caxias do Sul, também investiga o caso. O órgão informou que deve atuar em duas frentes: uma delas vai avaliar sob ótica do crime, e a outra pelo lado dos direitos humanos, com a possibilidade de dano moral coletivo.
Pelo lado criminal, o MP vai aguardar a investigação que está sendo feita pela Polícia Civil. A assessoria da instituição explica que cópias de todas as representações e reclamações que foram, e continuam sendo, direcionadas ao Ministério Público estão sendo remetidas à DP Regional de Caxias do Sul, para subsidiar o inquérito policial já instaurado. No caso que investiga o dano moral coletivo, os documentos são encaminhados à 5ª Promotoria de Justiça Especializada de Caxias do Sul.
A assessoria do MP explica que depende de como a polícia indiciar o parlamentar para definir a penalização. Além disso, a ação relativa a dano moral coletivo ainda será ajuizada, e novidades a respeito do caso devem começar a ser encaminhadas a partir de segunda-feira (6).
Representações são centralizadas no MP de Caxias
A assessoria do Ministério Público explica que todos os documentos protocolados são encaminhados à promotoria caxiense, para centralizar as investigações. Entre os requerimentos, está o pedido de prisão de Fantinel protocolado pelo PSOL-RS, através da presidente da sigla, deputada estadual Luciana Genro.
O senador Humberto Costa (PT-PE) protocolou uma representação no Ministério Público contra o vereador, para apurar crime de racismo e danos morais coletivos. Também do PT, o deputado estadual do RS Leonel Radde registrou boletim de ocorrência ainda na terça-feira (28) contra o vereador Fantinel — o documento, entretanto, não motivou a abertura do inquérito na DP, segundo o delegado Augusto Cavalheiro Neto, que explica a abertura do processo imediatamente, de ofício, "a partir do momento que tomamos conhecimento do caso pelas mídias e pela imprensa".
PT, PCdoB, PSOL, Partido Verde e Partido Comunista Brasileiro (PCB), todos de Caxias, também protocolaram documento que pede a abertura de um inquérito policial contra o vereador, na quarta (1º/3). A representação diz ao MP que Fantinel "proferiu discurso de ódio publicamente da tribuna da casa legislativa, atacando injuriosamente a comunidade nordestina, com ofensas de caráter xenófobo".
Ministério Público do Trabalho e Polícia Federal entram no caso
O Ministério Público do Trabalho (MPT) oficiou uma investigação contra o parlamentar porque, na avaliação do órgão, nas falas ele foi xenofóbico e culpou os trabalhadores pela situação análoga à escravidão. Em nota divulgada no site do MPT na última quarta-feira (1º/3), a ação foi esclarecida pelo procurador do Trabalho e vice-coordenador nacional de Erradicação do Trabalho Escravo no MPT, Italvar Medina.
— A fala minimiza, indevidamente, a extrema gravidade da escravidão contemporânea, busca culpabilizar as próprias vítimas pelos ilícitos sofridos, tem conteúdo preconceituoso e, para piorar, estimula a discriminação nas relações de trabalho, em ofensa à Constituição da República, à legislação e a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil — criticou Medina, na nota.
Já a Polícia Federal foi acionada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, que encaminhou para investigação do órgão um discurso em 17 de novembro de 2022 do vereador Fantinel no Legislativo caxiense, no qual ele afirma que "um ministro do Supremo Tribunal participou de uma orgia com crianças fora do Brasil". Para Dino, a fala configura crime contra autoridade federal.
"Um agente político (vereador do RS) afirma que um ministro do STF participou de 'orgia com crianças'. Enviarei hoje o discurso à apreciação da Polícia Federal, já que se cuida de crime contra autoridade federal. Seguimos lutando todos os dias contra mentiras e agressões", disse o ministro na manhã de quinta (2/3), em seu perfil no Twitter.
A Polícia Federal de Porto Alegre informou, através da assessoria, que ainda não recebeu o ofício do Ministério da Justiça. Até o fechamento desta edição, o MPT não retornou os questionamentos da reportagem a respeito das investigações.