Um estudo feito pela 1ª Vara Criminal aponta que são necessários quatro juízes trabalhando por um ano para conseguir colocar em dia os julgamentos de crimes contra a vida em Caxias do Sul. Os dois juizados especializados são responsáveis por 1.247 processos, sendo que 396 estão prontos, aguardando data para realização do júri. Esta análise, com um pedido formal, foi enviada para avaliação do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). Por enquanto, a medida adotada foi a chegada do magistrado Regis de Souza Ramalho, 32 anos, que assume temporariamente o 2º Juizado da 1ª Vara Criminal.
Esta será a primeira vez que um magistrado se dedicará prioritariamente aos processos de júri de Caxias do Sul desde a saída do juiz Max Akira Senda de Brito, em fevereiro de 2020, quando ele foi convocado para a Corregedoria do Tribunal de Justiça. Contudo, a situação caótica da 1ª Vara Criminal iniciou em junho de 2018, com a saída da juíza Milene Rodrigues Froes Dal Bó. Neste período de quatro anos, foram apenas três meses com um juiz titular.
Ainda em 2020, o juiz Antônio Carlos de Castro Neves Tavares foi promovido para a 1ª Vara Criminal, contudo, o magistrado atua como juiz auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde 2019. Por isso, ele ainda não pode assumir a vaga em Caxias do Sul. Desde agosto daquele ano, o 1º Juizado é atendido em substituição pelo juiz Silvio Viezzer, que é titular do 2º Juizado da 5ª Vara Cível.
O 2º Juizado foi criado em setembro de 2021, diante do volume de processos de crimes contra a vida. O edital está em andamento e a expectativa é que um juiz titular seja designado ainda neste segundo semestre. Interinamente, a vaga foi suprido pelo juiz Vancarlo André Anacleto, que é titular em Canela. Agora, temporariamente, a missão será do juiz Ramalho.
Números da 1ª Vara Criminal:
:: 1.247 processos em andamento
:: 92 processos com réus presos
:: 383 prontos, aguardando data para júri
:: 13 júris agendados, sendo 12 com réus presos
:: 382 processos aguardado por audiência, todos com réus soltos
Natural de Pelotas, o novo magistrado está começando a carreira que era seu sonho desde os oito anos de idade, quando deixou por escrito em uma redação na escola, que a mãe fez questão de guardar. Após as formaturas em Direito e na Escola da Magistratura da Associação dos Juízes do Estado do Rio Grande do Sul (Ajuris), Ramalho se dedicou aos concursos pelo Brasil. Foi assim que foi aprovado na Bahia e tomou posse no ano passado. O sonho, contudo, era ser juiz no seu Estado natal, o que agora foi possível.
Ramalho fez parte da turma de 93 aprovados que tomou posse neste mês. Enquanto a maioria dos novos juízes passa pelo curso de formação, ele e outros oito colegas, que também já eram magistrados em outros Estados, foram designados para algumas das varas com mais processos represados — duas em Caxias do Sul, quatro em Porto Alegre e uma em Passo Fundo, Rio Grande e Santa Maria.
Na tarde desta quarta-feira (13), no seu terceiro dia no Fórum caxiense, o juiz Ramalho recebeu a reportagem e falou sobre os desafios na chamada Vara do Júri. Confira as opiniões do novo magistrado.
Pioneiro: Como surgiu esta oportunidade?
Regis de Souza Ramalho: Tivemos a posse no dia 1º de julho e, como já tinha feito o curso de preparação há menos de um ano (na Bahia), eu, e também outros oito aprovados na mesma situação, fomos designados, temporariamente, para estas vagas. São varas que precisam muito de juízes, uma necessidade premente. Para Caxias, vim eu e a colega (Carolinne Vahia Concy) da Vara da Infância e Juventude. Não somos definitivos, iremos ficar, provavelmente, até o final do curso de formação dos demais colegas, o que dará o tempo necessário para os colegas mais antigos se promoverem para Caxias (conforme editais em andamento), e nós iremos para comarcas menores, de entrância inicial, conforme classificação.
Por que escolheu Caxias do Sul?
Antes de residir na Bahia, morei em Caxias por três anos. Minha esposa é daqui, trabalha como advogada e eu já conhecia a cidade. É uma região que tenho muito carinho. É frio (o clima), mas o povo é muito acolhedor. A característica do povo italiano de receber sempre com fartura foi muito importante e me fez sentir muito bem. Então, não tive dúvidas, foi perfeito poder vir para cá. Não precisei nem de mudança, pois, justamente, já tinha uma estrutura aqui com a minha esposa.
Esta é uma grande oportunidade na carreira de um juiz?
Sem dúvidas. A entrância inicial (comarca de cidades menores, onde os juízes começam a carreira) costuma ter menos volume de trabalho e também não ser especializada. Aqui, são só processos de juris. Na inicial, é de tudo um pouco, processo de família, de Maria da Penha, de contrato bancário, etc. Aqui, podemos focar somente nestes crimes contra a vida. É um desafio, mas também uma oportunidade.
O que lhe falaram sobre o juizado?
Estou me ambientando, mas já tenho a certeza que a estrutura é muito boa. Tanto de Fórum, quanto de assessoria. O pessoal do cartório é muito qualificado. E claro, há muito trabalho, pois é uma cidade de grande porte e os crimes contra a vida acontecem. Agora, é questão de começar a designar e tentar colocar esta pauta em dia o mais rápido que pudermos. O colega Silvio (Viezzer, que substitui no 1º Juizado) está há mais tempo e fez este estudo, bastante elaborado, de que são necessários quatro magistrados para, em um ano, colocar esta pauta em dia. Há o pedido formal e o Tribunal (de Justiça) irá avaliar. De qualquer modo, nós dois iremos fazer o máximo que conseguirmos para tentar resolver o mais rápido possível.
Como será a rotina de trabalho?
Nós dividimos o plenário. Até então, estavam sendo feitos dois júris por semana, um na quarta e outro na sexta. Irei manter, mas a minha ideia é passar de sexta para segunda-feira, pois, por vezes, os júris se estendem por mais de um dia e não queremos causar inconvenientes aos jurados. Se der espaço, ou não tiver casos tão complexos, tentaremos marcar mais júris numa semana. É raro, mas pode acontecer. Nos demais dias, serão feitas as audiências.
Será possível diminuir a fila?
É a minha ideia. Quando surgiu esta possibilidade, fomos informados que o trabalho estava represado e que nós iríamos para isso, para fazer o máximo que pudéssemos. Tudo que for possível, iremos pautar. Todos que conversei me deixaram tranquilo, que toda a estrutura é boa. A questão é apenas trabalho, de pautar e resolver. Todos estão esperando que os processos andem. O que faltava era o juiz, e agora tem. Vamos trabalhar.
Esta demora dos julgamentos de homicídios causa muita angústia. Como lidar com esta situação?
Somos sensíveis. Tanto pelo réu, que quer ver o seu resultado, afinal ninguém deveria esperar tanto tempo por uma decisão, e também pelos familiares das vítimas, que anseiam por Justiça, que querem ver um julgamento. Estamos aqui para tentar amenizar. Embora saibamos deste período todo que permaneceram sofrendo, por algumas circunstâncias que são inerentes ao Judiciário. Mas, enfim, agora o que temos que fazer é amenizar a situação.
É possível comparar a situação com o volume de trabalho na Bahia?
Infelizmente, é uma questão comum a todos os Tribunais de Justiça. Não só aqui, mas em praticamente todos os Estados. Lá na Bahia, salvo engano, havia um déficit de quase 500 magistrados. Então, fazemos o máximo que dá. Infelizmente, não é o suficiente para a população, que precisa de uma estrutura maior e de um quadro mais completo. Os colegas fazem o máximo, substituem em duas ou três varas, mas é humanamente impossível. Caxias não é melhor ou pior. É uma situação comum. Temos plena consciência e nós, os 93 aprovados, sabemos que ao chegar nas comarcas será trabalho, trabalho e trabalho. Estamos cientes e dispostos. Batalhamos muito para chegar (nesta profissão).