A principal ligação entre São Marcos e Campestre da Serra está interrompida desde o dia 4 de setembro devido aos danos causados pela cheia do Rio das Antas na ponte instalada no km 95,7 da BR-116. Um dos pilares, no lado de Campestre da Serra, envergou e esse movimento criou um degrau no asfalto, o que impede a passagem de veículos, por exemplo. Desde então, moradores das duas cidades convivem com o transtorno de se deslocar por desvios que aumentam a quilometragem dos percursos, passam por estradas de chão e uma ponte centenária, que permite o trânsito apenas de veículos leves. A reportagem do Pioneiro percorreu esses caminhos, conferiu as condições das estradas e de que forma a comunidade local convive com a situação.
Localizado no limite entre São Marcos e Campestre da Serra, o problema de logística não afeta apenas os dois municípios, mas também setores que dependem da rodovia, com caminhões que partem de Caxias do Sul e São Marcos rumo a Vacaria. Postos de gasolina, mecânicas e restaurantes à beira da estrada já sentem o impacto da falta de movimento. Por outro lado, na RS-122, a alternativa viária mais segura para o fluxo de veículos pesados, é nítido o aumento no volume diário de trânsito.
Caminho histórico
Inaugurada em fevereiro de 1907, a Ponte dos Korff começou a ser construída em 1904 e foi a primeira a transpor o Rio das Antas e possibilitar o fluxo de mercadorias ao centro do país. Declarada patrimônio histórico e cultural do Estado em 2000, a estrutura se tornou hoje a principal alternativa de ligação, para veículos leves, entre São Marcos e Campestre. A ponte possibilita o acesso à BR-116, na localidade de Gaúcho, e desvia o trânsito do bloqueio.
Para chegar nela, a partir de São Marcos são 18 quilômetros pela RS-315 até o distrito de Criúva, em Caxias do Sul, e mais 18 quilômetros de estrada de chão. A ponte divide os municípios de Caxias e Campestre da Serra e a manutenção é compartilhada entre as duas administrações municipais, o que explicaria as características diferentes: metade da estrutura é coberta por barras e outra não. Após cruzar a ponte, o motorista encara novos 18,5 quilômetros até o acesso à BR-116.
“Se o carro estraga aqui, não tem socorro"
A frase é do motorista de van escolar Laerte Terra Cechinatto, 50 anos. Morador de Campestre, Cechinatto foi com a família conferir as condições do trecho e da Ponte dos Korff. Na visita, se impressionou com a qualidade da pista, que recebeu manutenções recentes das prefeituras. O lado de Caxias apresenta alguns buracos abertos devido à ocorrência de chuvas e trechos mais estreitos. Na terça-feira (19), uma máquina fazia o corte da vegetação nas margens da via. Já no trecho de Campestre, a pista é mais larga e tem melhores condições. Mas é a falta de iluminação que preocupa Cechinatto.
— É um transtorno, passou a ser a principal estrada, mas tem que ter cuidado com os cotovelos. Patrolaram, ficou boa, mas ainda é uma estrada de chão que não é ideal. De noite é perigoso, se o carro estraga aqui não tem socorro — disse.
Desvio de 54,5 quilômetros
O desvio do centro de São Marcos até o acesso da BR-116 totaliza 54,5 quilômetros, em uma viagem estimada em mais de uma hora. Pela BR-116, a ligação entre a cidade é de 34 quilômetros em trecho todo asfaltado e que diminui o tempo de percurso. Pela RS-122, entre os municípios de Flores da Cunha, Antônio Prado e Ipê, opção recomendada pela PRF para ônibus e caminhões, a distância a partir de São Marcos é de 75 quilômetros. Para acessar a RS-122 e não ter que ir até Caxias, motoristas têm utilizado uma estrada do interior que passa pela comunidade de Santo Henrique, na Linha Edith.
O bloqueio da ponte na rodovia federal altera a rotina da rodoviária de São Marcos. Quatro empresas suspenderam as linhas entre São Marcos, Vacaria e Lages, por exemplo. Atualmente, apenas uma empresa faz o trecho até Caxias e, de lá, os passageiros saem para destinos que passariam pela BR-116.
— Os ônibus pararam de passar por aqui e foram via RS-122. É uma nova realidade para as pessoas, que têm que se adaptar, e também para os negócios, que tiveram uma queda muito grande no movimento — contou Andressa Gazzola, que administra a lancheria da rodoviária.
Logística alterada em Campestre da Serra
De outro ponto de vista, a comunidade de Campestre da Serra também sofre com as consequências de não poder se deslocar pela ponte sobre o Rio das Antas. Funcionários de pelo menos quatro empresas de São Marcos e que moram em Campestre têm atravessado a ponte a pé e feito a baldeação com vans e ônibus, que aguardam em cada um dos lados. De acordo com a Polícia Rodoviária Federal, a travessia de pedestres não é permitida.
As outras alternativas estão na RS-315, pela Ponte dos Korff, ou pela RS-437. A rodovia estadual tem trecho de 20 quilômetros não pavimentados, que ligam o município a Ipê, onde está localizada a RS-122 que leva a Antônio Prado e Flores da Cunha. Utilizada por caminhões e ônibus, a estrada de chão conta ainda com quatro pequenas pontes que atravessam arroios e, em dias de chuva forte, correm o risco de serem inundadas.
O bloqueio esvaziou a BR-116 na localidade de São Bernardo, onde estão instalados um posto de gasolina, restaurantes, lancherias e borracharias que dependem do movimento gerado pela rodovia. Para além do impacto na economia, o escoamento das safras que se iniciam em outubro e novembro preocupa agricultores, que terão que encarar uma viagem mais longa e por estradas de chão para chegar em Caxias do Sul e Porto Alegre.
A maioria dos clientes da advogada Marta da Silva 50, são produtores rurais e externam a preocupação de como realizar o transporte no futuro.
— A 122 aumenta a distância e a ligação (desvio pela RS-437, que é de chão) com Ipê tem péssimas condições. Para ir até a interseção da 122, no caminho para Vacaria, se enfrenta um trânsito infernal, a situação é escabrosa. Os pêssegos começarão a ser colhidos em 10 de novembro e serão enviados para toda a região — afirmou.
Quinze quilômetros a pé
As distâncias percorridas a partir dos desvios ficam ainda maiores para quem mora próximo à ponte interditada e tem ligações de trabalho ou se utiliza de serviços entre as duas cidades. Rodrigo dos Santos Guedes, 27, mora próximo da ponte, mas no lado de São Marcos. O problema de logística já o obrigou a caminhar 15 quilômetros para trabalhar em propriedades de Campestre da Serra. Depois de atravessar a ponte de pouco mais de 100 metros, Guedes conta com a solidariedade dos vizinhos para caronas que o levem ao destino.
— Me levam lá embaixo, cruzo a ponte, mas preciso fazer mais um trecho até em casa quando não consigo carona. É longe e muita gente que se obriga a cruzar nesse trajeto. Se der a volta, não tem condições, é muito longe para quem mora perto da ponte. Por Ipê é pior ainda.
Confira o mapa com os desvios
Recuperação por contrato emergencial
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) confirmou que a recuperação da ponte da BR-116, entre São Marcos e Campestre da Serra, será realizada por meio de contrato emergencial. A possibilidade já havia sido ventilada pela prefeitura de São Marcos, que aguardava pela realização do laudo, elaborado após visitas técnicas do Dnit ao local. Ainda de acordo com o órgão nacional, o valor do investimento e a forma como a reforma irá ocorrer será divulgada apenas ao fim da elaboração do projeto.
Em visita ao Estado no início do mês, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, informou que haverá repasse de R$ 741 milhões para as cidades atingidas pelas chuvas. Dentro deste montante, R$ 16 milhões estão previstos para o Ministério dos Transportes investir nas reconstrução de rodovias. Desse total, a expectativa é de que parte dos recursos serão para a recuperação da ponte.