A consulta pública para a ocupação da Maesa utiliza como referência o projeto apresentado pela prefeitura de Caxias e elaborado pelo consórcio Nuova Maesa, contratado por meio de um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI). A proposta sugere o restauro dos prédios históricos, mas também a remoção de construções que não possuem valor arquitetônico e poderiam ser substituídas. Além disso, para dar viabilidade econômica e atrair investimentos, a proposta prevê 26 lojas e 19 restaurantes, além das atividades culturais. Entidades como a União das Associações de Bairro (UAB) e a Associação Amigos da Maesa (AMaesa), no entanto, tem contestado a proposta. As entidades defendem uma ocupação mais próxima do que havia sido discutido pela Comissão Especial de Ocupação da Maesa, instituída em 2014.
Reunindo órgãos municipais, UAB, representantes do setor de arquitetura e meio acadêmico, o grupo foi responsável por apresentar um plano de uso para atender a uma exigência da lei de doação do imóvel pelo Estado ao município. Liderada pela então secretária da Cultura, Rubia Frizzo, a comissão definiu que receberia um mercado público — praticamente uma unanimidade na cidade — mas também espaço para atividades culturais, como auditório, museu da metalurgia, multipalco e espaço cenográfico.
Os anos seguintes foram dedicados ao processo de tombamento do prédio histórico e também do maquinário que será preservado. Essa última etapa, também comandada por Rubia no governo Cassina (PTB), foi possível ao longo de 2020, após a liberação da área então ocupada pela empresa Voges. Também nesse período ocorreram o escaneamento digital do prédio e o chamado Masterplan, que avaliou a condição de cada espaço e apontou quais atividades eles poderiam abrigar.
A proposta que atualmente está em discussão representou um passo seguinte aos estudos de ocupação, com o objetivo de analisar a viabilidade econômica de uma parceria público- privada (PPP). Por conta disso, a proposta apresentada pelo município tem semelhanças com o plano de ocupação elaborado a partir do trabalho da comissão, que foi utilizada como referência. Estão lá o museu, o mercado público e a área de exposições, por exemplo. A ideia da comissão, porém, não previa liberação de áreas, com a remoção de construções sem relevância, e havia sugestão de instalar secretarias em vários pontos do complexo.
Entre as diferenças que mais chamam a atenção estão a ocupação de três pavilhões pelo mercado público — um a mais que pela proposta atual — e a existência de várias áreas de apresentações, como teatro, anfiteatro e multipalco. Em um dos blocos também se propunha a existência de um espaço cenográfico e sala de cinema (veja o detalhamento no infográfico abaixo). O estacionamento ficaria totalmente na área externa, nas ruas do entorno, sem vagas internas como prevê o projeto em discussão. O plano não chegou a apresentar uma proposta financeira, com previsão de investimento e receita.
— Pesquisamos tudo o que estava sendo feito no mundo e contratamos especialistas. Nunca se pensou em estacionamento interno até porque a fuligem detona os prédios e quando você tomba, você se compromete com a preservação. Entidades se comprometeram a ajudar no restauro para ter centro de convenções e apresentações artísticas — afirma Rubia.
As discordâncias
O custo de restauração da Maesa está estimado pelos estudos do PMI em R$ 115 milhões. Considerando os investimentos necessários para manter a operação ao longo de 30 anos, os valores atingem R$ 354 milhões. O montante significativo para os cofres públicos é um dos principais argumentos para o município optar pela parceria público-privada (PPP) para ocupar a Maesa. A prefeitura ainda terá participação, pagando uma contraprestação mensal pelo uso de 40% do espaço. Esse modelo foi definido porque uma concessão sem participação pública não seria rentável a ponto de atrair interessados.
A participação privada nos investimentos e operação da Maesa, contudo, é um dos pontos de discordância entre entidades e município. Operações do tipo precisam de atividades que gerem receita para remunerar o investidor privado e as entidades rechaçam atividades comerciais dentro da Maesa.
— Entendemos que é uma espécie de desvio de finalidade, porque tudo foi milimetricamente pensado. A gente não desconsidera as possibilidades com esse projeto, mas ele não é um projeto de Maesa. É muito bonita comercialmente falando, mas pode ser feito em outro local — defende Rubia.
Outro ponto de debate é com relação ao tamanho do mercado público. A proposta em consulta pública destina 4,3 mil m² para o espaço, dos quais 1,6 mil m² serão somente para as bancas. O plano de ocupação da comissão reservava cerca de 7,3 mil mil m², considerando também mezaninos.
— Se a gente aceitasse a sugestão do município de privatização da Maesa iríamos fazer algumas sugestões. Primeiro, manter a característica cultural e turística da Maesa. Seria o quê? Ampliação do mercado público, para ser uma âncora; ampliação dos espaços de eventos para 10 mil m²; manutenção das feiras e das atividades populares com uma rua coberta em frente, na Plácido de Castro; não derrubada de muro e também não ter estacionamento interno no prédio — relatou o presidente da AMaesa, Paulo Sausen, em entrevista ao programa Gaúcha Hoje, da Gaúcha Serra, na última semana.
A UAB defende também espaço para a atuação dos artesãos de Caxias.
— Quando a gente fez o pedido de tombamento da Maesa, a gente não fez pensando em modificar, mas em ajudar essas pessoas que realmente precisam. Hoje, o artesanato não tem lugar nenhum para ficar, para expor — disse o presidente da entidade, Valdir Walter.