Em fase decisiva desde o fim de fevereiro, quando teve início a consulta pública, a ocupação do complexo da Maesa, em Caxias do Sul, tem levantado debates acalorados na cidade. As principais discordâncias são com relação à concessão do espaço à iniciativa privada, mas também há quem se levante contra as atividades sugeridas para a área.
Estão previstas, por exemplo, 142 operações, que contemplam restaurantes, bares, atrações culturais e de entretenimento, mas também lojas e hotéis. A proposta em discussão pública foi elaborada pelo Consórcio Nuova Maesa, que realizou estudos dentro do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI). Esse modelo prevê o chamamento de especialistas da iniciativa privada pelo setor público para avaliar o potencial de determinado projeto. Ao longo do segundo semestre do ano passado, o grupo formado pela Vazquez Arquitetos, pela Spin Soluções Públicas Inteligentes e pela Rodrigues, Antunes e Advogados Associados, analisou o potencial de uso e importância de cada área do complexo. Outro fator analisado foram as atividades com chances de atrair público à Maesa, garantindo a sustentabilidade econômica do empreendimento.
A proposta do consórcio prevê a preservação dos prédios com alta importância histórica (blocos 1 ao 8, além do 11), mas também sugere a derrubada de construções que não podem ser aproveitadas ou não apresentam grande valor arquitetônico (blocos 9 ao 19, exceto o 11). Dessa forma, se for executado da forma proposta, o complexo irá mesclar construções antigas com linhas modernas.
Dentre as modificações, por exemplo, estão a derrubada do muro externo em três pontos distintos para criar amplas áreas de acesso. A principal delas será a praça de acesso, sugerida para ser criada na Rua Dom José Barea com a Rua Vereador Mário Pezzi. Na Rua Pedro Tomasi, um outro vão de acesso será coberto com um mirante de uma edificação sugerida para abrigar um dos dois hotéis do complexo.
As áreas de preservação estão previstas principalmente para a metade leste da Maesa. É nesta área que o projeto em discussão sugere instalar o mercado público, uma área de eventos coberta e o museu do trabalho, que ocupará o principal pavilhão conjunto e o principal a ser preservado. Restaurantes e lojas ficarão espalhados por toda a área, dependendo da ocupação de cada bloco (veja no infográfico).
O projeto a ser seguido pelo parceiro privado, no entanto, é bastante flexível e não há obrigação de se adotar exatamente as ideias propostas pelo Nuova Maesa. Não há, por exemplo, obrigatoriedade para a demolição de edificações sem importância e construção das novas. O uso que cada bloco terá e o estilo arquitetônico, inclusive, ficarão a cargo da nova concessionária. A parceria, no entanto, prevê como obrigatórios uma área de 1,6 mil metros quadrados de área bruta locável (ABL) para o mercado público (mais de quatro mil metros quadrados considerando áreas operacionais, como depósito), outros 1,6 mil metros quadrados para atividades de arte e cultura, ao menos 1,3 mil metros quadrados para ocupação da administração municipal e uma área de 1,9 mil metros quadrados para eventos. O museu do trabalho no bloco 1, principal pavilhão do conjunto, também é obrigatório.
— Com exceção do museu, o parceiro privado poderá mexer com o layout no entendimento que ele tiver do que é mais de interessante sobre o ponto de vista de circulação. Por exemplo, colocar o mercado público na área interna da Maesa e não no perímetro, porque isso vai obrigar as pessoas a entrar para acessar o mercado e fará com que elas se deparem com outros atrativos. E existem as outras ocupações, que chamamos de referenciais, que a gente trouxe para verificar a viabilidade do projeto. Um exemplo são os hotéis, que algumas pessoas vêm questionando. A gente entende que essa é uma ocupação possível, mas cabe ao parceiro privado identificar se realmente há demanda. As ocupações referenciais foram aquelas que, no entendimento do município, trazem viabilidade ao complexo como um todo. Mas o parceiro privado pode propor ajustes — explica o secretário de Parcerias de Caxias, Maurício Batista da Silva.
Outra exigência diz respeito ao bloco 14. A proposta do consórcio é de implantação de um restaurante e estacionamento na área, mas o município já faz reformas para implantar a Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semma). Dessa forma, o caderno de encargos em discussão exige a manutenção da pasta no local. Caso a futura concessionária queira realocar, terá que arcar com os custos.
Circulação gratuita e preservação
Embora o projeto preveja liberdade para a futura concessionária na definição e na disposição das operações dentro da Maesa, há um regramento básico a ser seguido. O principal deles é a preservação da identidade, sustentabilidade e menor impacto possível ao meio ambiente, à paisagem e aos parâmetros urbanos. Também deve ser priorizado o comércio local e sustentável, assim como a integração comunitária. Dentro desse entendimento, estão premissas como permanência do complexo como patrimônio cultural e histórico, integração com a cidade, circulação gratuita, valorização de áreas verdes e equilíbrio de atividades para não comprometer desenvolvimento da vizinhança.
No mínimo 1% da receita bruta do ano anterior deverá ser destinada a um programa de incentivo à cultura, que terá início no décimo ano de contrato. Serão atividades como eventos e oficinas dentro do complexo que precisão ser organizados pela concessionária.
Para as atividades comerciais, além das lojas, o projeto prevê permissão para quiosques e terminais de autoatendimento nas áreas de circulação e praças, além de cobrança pelo estacionamento. Também será permitida a comercialização de espaços publicitários internos e externos, que deverá seguir o regramento da legislação municipal, mais restritiva para prédios históricos. Outra possibilidade é a utilização de naming rights, como é chamada a adoção de nomes de empresas à nomenclatura de empreendimentos. Essa parceria é comum, por exemplo, em estádios de futebol.
— A ideia é que seja possível desde que aprovado. Obviamente que nenhuma estrutura fixada poderá danificar ou desvirtuar efetivamente todo aquele espaço que a gente está tentando preservar — observa Maurício.
Será permitida a realização de eventos com ingresso, desde que a cobrança ocorra somente no espaço onde ele ocorre. Além disso, não serão permitidos eventos religiosos e políticos. Dentro do modelo de concessão patrocinada, em que o município pagará uma mensalidade pelo uso de parte do complexo, serão disponibilizados 48 dias por ano da área de eventos para a prefeitura. O horário de funcionamento previsto é das 8h às 22h de segunda a sexta e das 9h às 23h nos fins de semana.
Como está prevista a ocupação
O projeto da prefeitura prevê ocupação por meio do modelo de concessão patrocinada. Isso significa que um parceiro privado será responsável pelo projeto, mas o município terá direito de uso de até 40% da área do complexo, remunerando a concessionária em até R$ 161 mil mensais. O valor da chamada contraprestação pecuniária será o critério de escolha do vencedor do leilão. O contrato é de 30 anos e está previsto para ser assinado no fim do ano. O investimento total previsto é de R$ 115 milhões.
Após a assinatura da parceria, o operador privado terá seis meses para começar as primeiras intervenções. O plano de implantação deve ser apresentado nos primeiros dois meses, com o detalhamento do que será realizado. Em até três meses precisa ser entregue o plano de operação e manutenção, com detalhes a respeito de comunicação, segurança e limpeza, entre outros. As reformas e ocupações de cada bloco ocorrerão em quatro etapas e deverão obedecer os trâmites burocráticos tradicionais de construção, além de passar por avaliação do Conselho Municipal de Patrimônio Histórico e Cultural (Compahc). Confira abaixo as etapas:
- Fase A (conclusão até terceiro ano de contrato): devem ser realizadas intervenções no pátio leste e ativação total dos blocos 4, 5, 6 e 8. Ativação de, no mínimo, 50% do mercado público e realocação da unidade da Guarda Municipal e Divisão de Patrimônio Histórico da Secretaria da Cultura.
- Fase B (conclusão até sexto ano de contrato): entrega e ativação total dos blocos 2, 3, 7 e 17, além de ocupação parcial dos blocos 1 e 11. Obrigatória conclusão do mercado público e do espaço de eventos
- Fase C (conclusão até nono ano de contrato): ativação total dos blocos 1, 10, 11, 15 e revitalização parcial do pátio oeste
- Fase D (conclusão até 12º ano de contrato): entrega de todas as intervenções e operações
Como opinar na consulta
A consulta pública está disponível no site da prefeitura até 28 de abril. Basta acessar o item PPPs na página inicial do portal e depois em "Consulta Pública do Projeto de Ocupação da Maesa". Também é possível acessar diretamente por meio deste link.
Em seguida, é preciso preencher o formulário informando nome, e-mail, CPF ou CNPJ e se faz parte de entidade, empresa ou organização. O próximo passo é selecionar a qual documento do projeto a manifestação se refere e o dispositivo ou cláusula do ofício. Depois é só escrever a opinião, sugestão ou pedido de informação.