Além de suas passagens em 1957 – como jogador do Santos – e 1995 – como Ministro Extraordinário do Esporte, o Rei Pelé, que faleceu na última quinta-feira (29), aos 82 anos, desfilou sua majestade em Caxias do Sul durante a Festa da Uva de 1975. Na oportunidade, o tricampeão da Copa do Mundo defendia o New York Cosmos, dos Estados Unidos, já na reta final de sua gloriosa carreira, e veio a Caxias como garoto-propaganda da extinta marca de televisores Colorado RQ.
Naquele 20 de fevereiro de 1975, Pelé chegou em Caxias do Sul às 10h30min no Aeroporto Hugo Cantergiani. Depois, foi recepcionado com um almoço na antiga concessionária Wisintainer (atual Zaffari Lourdes) e, mais tarde, concedeu entrevista ao repórter José Antonio Conti, do Pioneiro.
CONFIRA A ENTREVISTA DO REI PELÉ AO PIONEIRO em 1975
Pioneiro - Pelé, como é que você consegue se manter tão simples depois de ter alcançado a sua projeção? Notamos que você, quando chegou ao aeroporto se deu o trabalho de cumprimentar uma a uma as pessoas que estavam lá esperando por você. Como é que ainda consegue isso?
Resposta - Antes de mais nada, eu quero dizer que, depois de 18 anos, é uma emoção diferente, para mim, voltar a Caxias do Sul. Foi aqui que eu iniciei praticamente a minha carreira como titular do Santos, há um tempo bem grande atrás. Respondendo, eu acho que a gente não tem necessidade de mudar. Quando a gente quer mudar, normalmente, cai. Eu prefiro tratar todo mundo bem. Muitas vezes não dá, mas eu não vejo razão de mudar. Muitas pessoas têm problemas de gênio, máscara e outras coisas mais, mas comigo, felizmente, é assim e não há nenhuma necessidade de mudar.
P - Nunca houve com você nenhum problema desse tipo?
R - Problemas sempre existiram, mas felizmente, desse tipo, não.
P - Você teve alguma incompatibilidade relacionada com isso alguma vez?
R – Não. Felizmente, nesses 19 anos, não tenho tido nenhum problema. A única coisa que houve foi com o Saldanha (ex-técnico da Seleção Brasileira), mas não por minha causa. Era problema dele. Eu não tenho nada contra ele.
P - Há alguém para substituir você no Brasil, Pelé?
R - Acho que não porque cada pessoa é ela mesma, tem o seu estilo, a sua maneira de ser. A única vez que eu tentei apontar na Copa do Mundo e me dei mal. No Brasil existem muitos jogadores bons, mas apontar um é muito difícil.
P - E o que acha sobre a reformulação do futebol brasileiro?
R - Acho que sempre há a necessidade de renovação, e isso é uma coisa muito natural. O nosso problema é escolher os jogadores, porque tem muitos bons.
P - Você acha interessante procurar, numa equipe, um jogador para substituí-lo?
R - Não, porque é mais importante fazer a equipe. Se aparecer um jogador que se sobressaia, aí deve-se pensar nisso. Ninguém faz nada sozinho.
P - Atualmente, o Brasil tem condições de ser campeão do mundo se fosse disputada uma Copa agora?
R – Olha, eu acho que, mais fácil do que o campeonato anterior, não terá nenhum outro. Estamos passando por uma fase de transição, mas pelo respeito que impomos, acredito que, se disputássemos um campeonato agora, nos sairíamos muito melhor do que no passado. Mas, como há tempo para o próximo, acredito que teremos que trabalhar bastante e, aí sim, recuperaremos a hegemonia do futebol.
P - Você sofreu muito na Alemanha, Pelé, quando assistia à Copa (74)?
R – Realmente, eu sofri. E quem foi o brasileiro que não sofreu? Só pensando que é Brasil a gente sofre lá no exterior, sejam quais forem os jogadores que atuem. Mais sofri porque via que jogadores com condições individuais de ganhar um jogo não conseguiam tornar isso uma realidade. Isso doía.
P - O futebol europeu melhorou ou decaiu?
R - Se você fizer uma análise rápida, você vai ver que o futebol dos diversos países não é bom. Se estávamos a cem pontos de vantagem na recente Copa do Mundo, agora estamos a oitenta, porque as equipes europeias mudaram bastante, para melhor. O Brasil deve mudar a sua maneira de jogar, tornar-se mais objetivo, mais agressivo.
P - Pelé, o que você conhece sobre Flamengo, Juventude, e Associação, o nosso futebol?
R - Bem, eu soube de problemas financeiros e união de equipes. Mas, sobre colocação de times e comportamento técnico, não sei de nada realmente. É que a gente se preocupa em saber quem são os campeões, e mesmo a falta de tempo impede que a gente dê bola para outras coisas.
P - Você sabe que a grande aspiração de Caxias do Sul é ter um clube no nacional. Acha que há possibilidades?
R - O Campeonato Nacional é duro, difícil, mas acredito que equipes do norte que não estavam muito bem e entraram passando maus bocados melhoraram. São coisas que acontecem e poderão acontecer com um clube daqui, entende? Na minha opinião, Caxias futebol tem, mas, para o Campeonato Nacional, há uma série de requisitos: preparo físico, massa torcedora, apoio dos dirigentes... Agora, quando as equipes saírem daqui para o Nacional, as coisas serão difíceis. Depende de uma série de fatores que eu desconheço.