A morte de Pelé traz à tona outra vez a história sobre o dia em que o menino de 16 anos e cinco meses jogava pela única vez em Caxias do Sul. Era dia 31 de março de 1957, uma tarde ensolarada de domingo, no Estádio Alfredo Jaconi. Os melhores jogadores do futebol caxiense contra os melhores do país em confronto entre o Combinado Fla-Ju e o Santos.
Jair Rosa Pinto, o Jajá, Dorval e Pagão lideravam os atuais bicampeões paulistas em uma excursão pelo Rio Grande do Sul. Pelé era apenas um garoto que costumava jogar alguns minutos desses jogos amistosos.
A partida foi recontada em 2010, pelo repórter Adão Júnior, com a participação de dois atletas que estavam em campo naquele duelo: Lory Tonietto, que faleceu em outubro de 2021, e Wolney Rivoire, que morreu em agosto deste ano.
— Cuida esse neguinho. A gente só coloca ele no segundo tempo — diziam os dirigentes do Santos aos juventudistas e flamenguistas antes do confronto, lembrou o ex-jogador caxiense Laury Tonietto, conhecido como Lory, naquela entrevista ao Pioneiro.
Meia de extrema qualidade técnica, Lory era o camisa 10 daquele combinado Fla-Ju, que reunia os melhores atletas do antigo Flamengo (atual SER Caxias) e do Juventude. Na formação inicial, seis jogadores do Ju, entre eles Lory, e cinco do Flamengo. Em um minuto de partida, 1 a 0 para o selecionado local, com gol do centroavante Nilo.
— Em seguida, Nilo fez uma grande jogada e tocou para mim na cara do gol. Chutei por cima, era para ser o 2 a 0 — relembrou Lory, ao jornalista Adão Júnior, em meio a um grande pôster com a foto ao lado de Pelé e os demais craques santistas da época.
Conforme anunciado pelos dirigentes, Pelé entrou no segundo tempo. O jogo ainda estava 1 a 0 para a seleção Fla-Ju. Aos 20 minutos, Melão, que era da Portuguesa Santista e fazia testes no Santos, empatou o jogo. Havia entrado do lugar de Pagão, um dos craques do time. Em seguida, Pelé marcou de cabeça, após cruzamento de Ivan, o quarto gol dos 1.281 de sua carreira.
— Ele acabou com o jogo, era uma flecha. Naquela partida já dava para ver que seria craque. Pelé corria o tempo inteiro e ainda ajudava os caras da defesa. Pelé não pipocava como Ronaldinho Gaúcho e Robinho — contou o atacante Wolney Rivoire, ou simplesmente Volnei para a imprensa escrita da época.
Naquele domingo de 31 de março de 1957, foi Wolney quem construiu toda a jogada do único gol do combinado Fla-Ju contra o Santos. O time paulista fez 3 a 1 com Tite, aos 39 minutos do segundo tempo, e 4 a 1 com Melão, aos 44. Pelé não vestia a camisa 10, talvez usasse a 16, como informam os craques caxienses. A 10 do Santos naquele jogo pertencia a Jair, o Jajá da Barra Mansa. Porém, os olhos de quem esteve naquela tarde ensolarada de domingo, no Alfredo Jaconi, brilharam mais para aquele neguinho das pernas finas que no ano seguinte encantaria a Suécia, as suecas e o Mundo.
Ficha técnica
Fla-Ju
Ary
Breno
Danga
Celso
Rona
Ghizzoni
Mário Lopes
Libinho (Joel)
Lory (Orlando)
Wolney
Nilo
Técnico: Mário Ramos
Santos
Manga
Ivan
Helvio (Vilson)
Fioti
Brauner (Cassio)
Ramiro (Pelé)
Urubatão
Dorval
Jair Rosa Pinto
Pagão (Melão)
Tite
Técnico: Luis Perez, o Lula
Gols: Nilo (Fla-Ju), a 1min, no primeiro tempo. Melão (S), aos 20min, Pelé (S), aos 22min, Tite (S), aos 39min, e Melão (S), aos 44min, no segundo. Árbitro: João Etzel Filho (SP). Renda: Cr$ 198.760.00 (recorde absoluto da época). Público: estimado em 10 mil pessoas. Local: Estádio Alfredo Jaconi, em Caxias do Sul. Data: 31/3/1957.
Fonte: ficha técnica reconstituída com base em depoimentos de jogadores, informações do jornal Pioneiro da época e do livro Clássico Ca-Ju - paixão e rivalidade, de Gustavo Côrtes