Comércios quase desertos, restaurantes fechados e pontos turísticos, antes disputados, praticamente vazios. Apesar de fria e ensolarada, é uma quarta-feira (15) totalmente atípica para o mês de maio em Gramado. O cenário, lamentado a cada conversa com empresários locais, é resultado da chuva que atingiu o Estado nas últimas semanas. Sem a operação do Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, e com acessos por estradas prejudicados, o setor turístico prevê perdas de até R$ 150 milhões para este e para o próximo mês.
O apelo do setor hoteleiro e gastronômico é para que os viajantes não cancelem os pacotes, mas, sim, remarquem a viagem para os meses seguintes. A área central turística não sofreu impactos e está apta a atender visitantes.
— Gostaríamos que os turistas tenham a mentalidade de remarcar e remarquem para logo. A nossa estrutura central está intacta. Todo o eixo turístico está muito bem, não tendo nenhum impacto. Os turistas vão poder aproveitar e ainda nos ajudarão a manter os empregos — sinaliza o presidente do Sindicato da Hotelaria, Restaurantes, Bares, Parques, Museus e Similares da Região das Hortênsias (SindTur Serra Gaúcha), Claudio Souza.
Ponto tradicional de fotos e visitação, a Igreja São Pedro, na Avenida Borges de Medeiros, carecia de movimento na manhã desta quarta. Quem aproveitava o cenário era o casal Nicole Silvano, 23 anos, e Matheus Felipe, 21. Moradores de Itapema, no litoral catarinense, eles encararam seis horas de viagem para conhecer a famosa cidade da Serra gaúcha.
A viagem em comemoração ao aniversário da jovem estava marcada há bastante tempo e foi mantida após o casal se abastecer de informações seguras sobre a situação atual de Gramado.
— Eu entrei em contato com o hotel e com a polícia rodoviária, que falaram que algumas áreas estavam sendo recuperadas, mas que dava para vir pelo nosso caminho — explica Matheus.
O casal chegou na terça-feira (14) e retorna na sexta (17) ao Estado vizinho. Eles seguiram viagem pela Rota do Sol, acessaram a RS-020 e, após, pegaram a RS-235 — mesmo caminho adotado pela reportagem do Pioneiro de Caxias a Gramado.
—A cidade é linda, só estamos estranhando um pouco o frio — diz Matheus.
No outro lado da via, na Rua Coberta, a sensação de vazio era ainda maior. Diante na baixa de turistas, boa parte dos restaurantes que operam no local estava de portas fechadas. As cadeiras sobre as mesas alertavam para a pausa no atendimento. Em um dos poucos estabelecimentos abertos, o garçom Pablo Araújo comentava que, desde a semana passada, menos de 10 mesas foram servidas por dia — no auge da alta temporada, cerca de cem são postas nos dois turnos do restaurante. O estabelecimento reduziu o horário de atendimento e também deu férias para parte da equipe.
— Nós temos dois restaurantes e um deles foi fechado no momento. Está bem difícil, um movimento muito, muito fraco — lamenta Pablo.
"Não desmarcamos porque queríamos trazer uma palavra de esperança"
Se uma palavra pudesse definir a viagem da cabeleireira Gil Costa, 31, para Gramado seria persistência. Ela saiu de Roraima, no norte do Brasil, pegou dois aviões, um transfer e encarou mais algumas horas de carro para chegar até a Serra. Milhares de quilômetros percorridos, que foram incrementados com um sentimento de angústia e tristeza pelo que o Rio Grande do Sul está vivenciando.
— Estou adorando a cidade, é uma experiência incrível. Como os pontos turísticos estão tranquilos, aproveitamos para fazer fotos. Pretendo voltar outras vezes, sim, já que, desta vez, infelizmente, foi desta forma — diz a cabeleireira.
Gil estava acompanhada da amiga Mariana Honnorio, 41, moradora de São Paulo. Mariana, que é ministra do evangelho da Igreja Verbo da Vida, já estava no Rio Grande do Sul desde março a trabalho. Elas se encontraram em Gravataí e seguiram para a Serra na terça-feira (14).
— Nós não desmarcamos porque queríamos justamente trazer uma palavra de esperança. Encontramos pessoas muito desanimadas aqui, mas as incentivei dizendo que é uma fase e vai passar. Acredito que o turismo não deva parar e quem puder venha — aconselha Mariana.
Recuperação do turismo está atrelada à retomada da operação do Salgado Filho
Para o presidente do SindTur Serra Gaúcha, Claudio Souza, a recuperação do turismo, em Gramado, está vinculada à retomada da operação no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre.
O terminal foi alagado após a enchente que assolou a região metropolitana no começo do mês. Souza diz que 65% dos turistas que chegam a Gramado usam o aeroporto. No ano passado, 8 milhões de pessoas visitaram o município.
— Com a tecnologia que se tem hoje e com a capacidade de bombear a água, é inconcebível que a gente espere meses para a água secar no Salgado Filho. Precisamos ter certezas, porque esse é o grande problema que temos em termos de cancelamento de reservas e novas vendas: as informações que não se confirmam depois. O aeroporto nos dá a segurança de poder vender. Enquanto o Salgado Filho estiver fechado, o consumidor terá pouca confiança (de se deslocar para o RS) — avalia Souza, que acrescenta:
— A nossa região terá um papel importante na reconstrução do Estado, mas para isso precisamos trabalhar. Temos que restabelecer as moradias, os acessos e, principalmente, manter os empregos — finaliza.