Quem está há mais de um ano sem frequentar shoppings de Caxias do Sul vai, provavelmente, sentir um impacto visual imediato ao entrar em um deles quando decidir retomar este tipo de passeio. O impacto da pandemia sobre a economia e o forçado fechamento desses centros de compra durante em determinados períodos fez com que parte das lojas não suportasse financeiramente e fechasse as portas.
A reportagem circulou pelos três shoppings principais de Caxias do Sul ao longo da semana passada e constatou o encerramento de negócios de diversas áreas. No dois localizados na região central da cidade, a quantidade de espaços disponíveis para a locação salta aos olhos. No Bourbon San Pellegrino, uma área inteira no segundo andar foi destinada a uma exposição histórica. Percebe-se, no entanto, o espaço readequado, porque as maçanetas que dariam acesso às lojas permanecem instaladas. Aliás, neste andar, é possível perceber mais lojas fechadas que abertas.
No Prataviera, localizado no coração da cidade, os espaços disponíveis para a locação também aumentaram e há áreas, como o segundo andar, em que é possível ter uma dimensão bem clara disso. O mais tradicional shopping caxiense, assim como o do bairro São Pelegrino, tem espaços vagos inclusive na praça de alimentação, uma das áreas que costuma ser mais frequentada pelos consumidores nesse segmento.
Já o Villagio Caxias, nome adotado em outubro do ano passado, o que mais chama a atenção é a troca de marcas. Embora algumas lojas tenham sido fechadas, isso não traz uma sensação de um impacto da pandemia tão significativo quanto nos demais. O shopping diz ter apostado na parceria com lojistas como estratégia para reter e buscar novas marcas.
Caxias não é uma ilha
O fechamento de lojas em shoppings caxienses é um espelho do que aconteceu em todo o país. Conforme a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), estima-se que 11 mil lojas foram fechadas durante a pandemia e R$ 90 bilhões em vendas foram perdidos nesses empreendimentos no período. Segundo dados da entidade, 9,3% dos espaços destinados às lojas foram desocupados. Antes da covid-19, 4,7% estavam vazios. Por outro lado, levantamentos da entidade mostram que a reabertura de todos os shoppings do país a partir do final de março traz recuperação.
— Acreditamos que o avanço da vacinação e o retorno das atividades aos escritórios serão um incremento importante nessa retomada. Dois shoppings foram inaugurados neste ano e outros sete estão se preparando para abrir as portas até dezembro. Se tudo isso for confirmado, 2021 vai superar 2020, quando apenas sete unidades foram abertas. Os empreendimentos foram projetados muito antes da chegada das crises sanitária e econômica, mas ficaram meses em compasso de espera. Agora, os empresários decidiram retomar os projetos diante das perspectivas de melhora na economia e do aumento da circulação de pessoas com a vacinação — afirma o presidente da Abrasce, Glauco Humai, ao projetar o segundo semestre do segmento.
Retomada em andamento no Prataviera
A retomada da economia do país no segundo semestre é a aposta e a expectativa de especialistas e empresários. Com o avanço da vacinação no país, espera-se que as pessoas se sintam mais seguras, tanto do ponto de vista sanitário quanto do econômico, para sair às compras. No shopping mais antigo de Caxias, o gerente geral, João Prataviera, diz que já é possível perceber uma certa recuperação:
— Já sentimos uma pequena retomada, tanto em movimento de pessoas no shopping, como um pequeno aumento de faturamento dos nossos lojistas — pontua o gestor do Prataviera Shopping.
Outro aspecto que corrobora essa percepção de melhora das condições é abertura de novos negócios que está horizonte. O shopping tem negociação para o funcionamento de duas lojas, ambas da área do vestuário. Prataviera reconhece, no entanto, que a pandemia deixou uma marca significativa. Em metros quadrados, 20% do shopping está vazio, o que ele diz ser um número alto.
Apesar de incentivos oferecidos pela administração do centro de compras, como a não cobrança de aluguel nos períodos de fechamento por força de decretos e da renegociação de contratos, o empresário explica que as empresas com um caixa mais enfraquecido não conseguiram suportar outras despesas, como o condomínio ou mesmo pagamento de funcionários.
— Todo o comércio foi prejudicado por ter que fechar e não só por isso, mas também pelo medo das pessoas em circular — resume.
Bons números e otimismo no Villagio Caxias
O Villagio Caxias ultrapassou no primeiro semestre o número de contratos assinados em todo o ano passado. São 13 parcerias em 2021 contra 11 em 2020. No primeiro ano da pandemia, 12 marcas encerraram atividades, ou seja, balanço praticamente empatado.
— Desde o início da pandemia, a brMalls adotou uma estratégia diferente das outras administradoras de shoppings, no sentido de ajudar um pouco mais os lojistas, com reparcelamentos, descontos, renegociações, sacrificando um pouco a própria margem, mas olhando a longo prazo no sentido de que, quando a pandemia começasse a finalizar e as atividades voltassem, estaríamos realmente mais fortes. E isso estamos vendo agora — diz o gerente de marketing do Villagio, Rafael de Lima Sobrinho.
Além disso, o shopping criou uma assistente de vendas, que faz todo o contato com o cliente sem que ele precise se deslocar, garantindo ao lojista a negociação com quem aceita comprar pela internet. E o otimismo da gestão do Villagio é embasado ainda por outros dados. Em maio de 2021, as vendas alcançaram 98% das realizadas no período em 2019. Para julho, a projeção é que esse índice chegue a 99,2%.
— Estamos praticamente empatando nesse momento com 2019, mas, claro, são dois anos atrás. Então, empatar nominalmente significa uma queda ainda, dado que temos inflação. Não são patamares ideais, mas a gente acredita que, dadas as circunstâncias, são bem promissores.
Escolha pelo shopping para empreender
Apesar dos desafios enfrentados desde o início da pandemia por setores econômicos diversos, há empresários aproveitando para investir. É o caso de Gabriele Rodrigues Batalha, que abriu uma franquia do Café Cultura no Villagio Caxias. Em funcionamento desde abril, o espaço tem como protagonista o café. A bebida que chega à xícara do cliente é resultado de um processo de cuidado que começa na plantação e segue até ser servida ao consumidor.
O espaço localizado no shopping caxiense é o primeiro da franquia, que soma um total de 22 lojas, na Serra. Com investimento de R$ 400 mil, oferece espaço para trabalhar e vende produtos variados da marca, incluindo os próprios grãos. A escolha pelo shopping, diz Gabriele, envolve comodidades, como segurança e estacionamento facilitado ao cliente, além da circulação garantida de público. A empresária, que já tem outra franquia no shopping, aproveitou o momento para investir em uma paixão pessoal, o café, e gerou diretamente oito empregos.
— Eu entendo que a vida logo vai voltar ao normal e as pessoas terão necessidades de espaços agradáveis, aconchegantes, diferenciados para curtirem a vida fora de casa, com as suas famílias. Sempre tivemos e sempre teremos momentos de crise, momentos de abundância, nenhum deles dura para sempre. É importante saber fazer as leituras desses momentos e investir no momento certo. Então, a gente achou que esse era o momento certo de investir e trazer o Café Cultura para a Serra.
A empresária está satisfeita com os resultados alcançados até agora. Ela percebe uma movimentação crescente no negócio desde a instalação e considera que isso envolve, inclusive, a experiência proporcionada pela franquia.
— Por ser uma marca diferenciada, a gente já notou que o cliente está aceitando bastante e até por a família estar vindo mais ao shopping, ter mais aquela confiança de poder vir, eles estão aceitando bastante e a gente está tendo um retorno bem como a gente queria.
Um dos diferenciais mencionados pela empresária é o autoatendimento, com pedidos feitos da mesa por meio de um aplicativo de comprar comida ou com o uso de um totem instalado no centro da cafeteria. Essa última opção é uma alternativa criada para garantir a redução do contato em tempos de pandemia, mas também é possível, claro, fazer o pedido direto no balcão.
Limite de ocupação é ampliado em Caxias
Os shoppings de Caxias do Sul foram autorizados a ampliar a ocupação de pessoas dos prédios. Um decreto da prefeitura na quinta-feira (22) aumentou o limite para 50% da capacidade máxima prevista no alvará de funcionamento ou no Plano de Proteção e Prevenção Contra Incêndios (PPCI). Até então, a limitação era a 30%. De acordo com a prefeitura, essa é uma das medidas adotadas para ajustar o município ao modelo estabelecido pelo governo do Estado e às alterações em decreto aprovadas pelas prefeituras integrantes da Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste (Amesne).
Afora a limitação de público, os shoppings continuam cumprindo outros protocolos de segurança. A entrada nos prédios está condicionada à medição da temperatura corporal. O Prataviera e o Villagio fazem a contagem de pessoas que acessam os prédios. Além disso, ambos têm uma espécie de totem com um dispenser de álcool gel logo na entrada. Portanto, tanto o processo com os termômetros digitais quanto o produto para higienização das mãos ocorre quase simultaneamente. No San Pellegrino, na tarde de sexta-feira (23), o guarda media a temperatura, mas o cliente tinha de se deslocar até um dispenser de álcool gel posteriormente. Em todos, o uso de máscaras continua sendo obrigatório.
SAIBA MAIS
- A reportagem tentou contato com o Bourbon San Pellegrino, por meio da assessoria de imprensa, mas o shopping preferiu não se manifestar. O Pioneiro buscou também o Martcenter, que optou por não conceder entrevista e mencionou estar passando por reestruturação.
- De acordo com um estudo da Abrasce, 29% dos shoppings utilizaram o digital nas vendas em 2020, um crescimento expressivo de 18 pontos percentuais comparado a 2019. Já os aplicativos próprios passaram a integrar os canais de 41% destes, um crescimento de 5 pontos percentuais comparado a 2019. A expectativa é de que, nos próximos dois anos, 59% dos shoppings que ainda não possuem marketplace passem a aderir como estratégia de vendas.