Quando recém alfabetizado, com cerca de cinco anos, o pequeno Francisco Michielin foi presenteado com o livro Rute e Alberto Resolveram Ser Turistas, da poetisa Cecília Meireles. A história dos dois irmãos passeando pelo Rio de Janeiro despertou o atual patrono da Feira do Livro para a literatura.
— Naquela época, o Rio de Janeiro era a cidade grande do país. Imagina, eu tinha cinco pra seis anos e lia que eles iam para a Urca, para o Cristo Redentor... Eu achei maravilhoso! E coincidiu que foi, também, a primeira vez que eu fui levado à praia pela minha mãe — relembra Michielin, 80 anos.
Ele lembra que, naquela ocasião, aquele foi o seu primeiro contato com o mar, só que passou mais tempo no hotel relendo o livro do que brincando na praia. Michielin diz que deve ter lido essa obra umas 10 vezes e que, a partir daí, nasceu um apaixonado pela leitura.
— Meu pai, que faleceu cedo, tinha uma biblioteca que eu ainda não manuseava por nem saber ler, mas logo que eu me interessei por livros, eu comecei a ler. Ele tinha, principalmente, aqueles famosos clássicos franceses como Victor Hugo e Guy de Maupassant e, os ingleses, Charles Dickens e Virginia Woolf — recorda.
Depois, aos 14 anos, ainda sem pretensão de se tornar escritor, diz ele, começou a fazer pequenas matérias após os jogos de futebol da sua turma. O jovem Michielin escrevia essas resenhas esportivas em uma folha de caderno para depois serem publicadas no jornal do colégio. Em função disso, conta o patrono, ele foi convidado pelo então editor do jornal Pioneiro, Mário Gardelin, para ser colunista esportivo. Mas, quando chegou a época do vestibular, a carreira de jornalista ficou de lado, já que Michielin decidiu cursar Medicina na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
— Na faculdade eu colaborei com revistas e jornais universitários, sempre participando de várias atividades literárias. Escrevia o próprio jornalzinho de esculhambação da nossa faculdade, do nosso curso, eu era um dos repórteres. Então, estava sempre escrevendo alguma coisa.
17 livros na carreira
O primeiro livro, lançado em 1988, foi justamente sobre a época de faculdade e sobre os colegas de turma. A obra Nós Éramos Assim comemorou os 20 anos de formatura de Michielin:
– Eu não diria que é um livro que mais me deslumbrou, porque a gente vai olhando depois e dizendo “ah, podia ter escrito diferente aquela história”, mas me marcou pelo desafio – reconhece.
Atualmente, são 17 livros publicados, contando com o mais recente Juventude - 110 anos: Coração Verde e Alma Jaconera, que teve sessão de lançamento na última terça (26), junto da torcida alviverde, no Estádio Alfredo Jaconi. No entanto, não é só sobre futebol que o patrono gosta de escrever. No ano passado, Michielin lançou Espelho da Memória, um livro de crônicas, o mais vendido da Feira do Livro em 2022. Nas próximas duas semanas, Michielin espera desfrutar da programação e encontrar leitores, autores e amigos.
— Como escrevo desde guri, nunca me preocupei com coisas públicas. Eu sou muito caseiro. Eu gosto de falar, gosto das pessoas, mas eu sou caseiro. Eu nunca pensei em ser patrono, quando veio o convite eu até fiquei meio sem reação. Eu levo também como sendo uma homenagem para minha geração.
Memórias de outras feiras
Michielin é conhecido por contar boas histórias. Uma memória inusitada com a Feira do Livro, diz ele, é uma edição que não está nos registros oficiais. Em 1961, ocorreu um evento literário, durante duas semanas, que são inesquecíveis para o patrono.
— Tivemos quatro bancas, como a gente tinha 16, 17 anos, não tínhamos dinheiro, mas sobrou um pouco e eu comprei dois livros. Veio gente importante, o principal foi o cronista Paulo Mendes Campos, que escrevia para a famosa revista Manchete e nós fomos pedir autógrafos para ele — conta.
Michielin conta que Mendes Campos gostava muito de futebol, era torcedor fanático do Botafogo e que, na época, o clube carioca tinha um grande time, com jogadores campeões mundiais, como Nilton Santos.
— Quando ele viu que nós sabíamos coisas de futebol, ficou sentado num dos bancos da praça uns 20 minutos, dizendo: “Gurizada, como vocês conhecem, tanto?”. Porque, naquela época, as notícias vinham quase que a conta gota. Os jogos de futebol não eram transmitidos para todo o Brasil, como hoje. Essa história está no livro Espelho da Memória.
Essa feira, lembrada com tanto carinho por Michielin, integrou um festival de arte e cultura, realizado em 1961. O evento teve, além da presença de Mendes Campos, bate-papos com os artistas plásticos Aldo Locatelli e Di Cavalcanti. Por outros motivos, essa feira também promete ser inesquecível para o patrono Michielin.
Feira do Livro segue até o dia 15 de outubro
A Feira do Livro de Caxias do Sul colore a Praça Dante Alighieri por duas semanas com programação para todos os gostos. Com o tema Na Leitura nos Encontramos, a feira tem Francisco Michielin como patrono e Aline Luz como Amiga do Livro.
A edição deste ano traz mais de 20 escritores nacionais, entre eles Anabella López, Daniela Arbex, Giovana Madalosso, Ilana Casoy, Micheliny Verunschk, Natalia Borges Polesso, Otávio Júnior, Paulo Scott e Renato Moriconi.
Confira AQUI a programação completa.