É com o riso de quem reconhece o possível exagero que Maiara Spier, 34 anos, ilustra o carinho que sente pela Cascata do Caracol e pelo parque homônimo, que na última terça-feira (1º) comemorou 50 anos de sua inauguração, em Canela.
A família de Maiara é a mais antiga entre os locatários de espaços comerciais no parque que é um dos símbolos mais proeminentes do turismo na Região das Hortênsias. Foi seu avô, já aposentado, quem abriu a loja de souvenires e artigos tradicionalistas Arte Pampas — uma das 10 que operam atualmente no Caracol, junto a três operações gastronômicas.
Tendo vivido a infância como se o parque fosse o quintal de casa, Maiara recorda dos anos em que o local despontou como destino turístico para o resto do país, impulsionado pela presença de artistas e celebridades que tinham o Caracol como ponto de parada obrigatório, especialmente durante o Festival de Cinema de Gramado.
— Lembro de ser pequena e ver o Faustão visitar o parque, a Vera Fischer também. Ficava encantada por ver de perto aquelas pessoas que só conhecia da televisão — recorda.
Ao carinho e ao orgulho de canelenses como Maiara, se soma a autoestima renovada pelo momento atual do principal cartão-postal da região, que passou por uma reestruturação completa em dezembro do ano passado, quando entrou em vigor a concessão ao consórcio encabeçado pelo pelo Grupo ITER, que também opera o Bondinho Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro. Com a responsabilidade de garantir a preservação da fauna e da flora nativas, mas também de melhorar o atendimento aos mais de 350 mil visitantes anuais, o consórcio tem a meta ambiciosa de, dentro de poucos anos, triplicar esse número.
— Queremos ser o maior atrativo da região Sul dentro de até três anos. Estamos dando um passo importante que é um contrato já firmado com uma empresa de Cingapura (Kakebon, especializada em paisagismo planejamento de resorts), que permitirá tornar o Caracol um passeio para um dia todo. Posso antecipar que vamos ter tirolesa, caminhada por cima das árvores (tree top walking) e elevador panorâmico para ver a cascata de perto — projeta o gerente geral do parque, Rafael Silveira, cujo currículo inclui quatro anos na gestão do parque Snowland, na vizinha Gramado.
SOFISTICADO É ACOLHER BEM
Proprietária do restaurante que opera no Caracol, Dilce Cavalli, 61, não esconde que havia um sentimento geral de frustração com o estado em que o Caracol se encontrava nos últimos anos em que esteve entregue ao poder público, que se mostrou, no mínimo, ineficiente para gerir a atração (basta lembrar que a escadaria que leva até a base da cascata encontra-se inativa desde 2015). Dilce comemora o fato da concessão à iniciativa privada ter deixado o parque mais bonito, mas principalmente o de não ter tirado o que ela considera a essência do parque, que é o acolhimento:
— O que sempre fez a diferença para os turistas que recebemos do Brasil inteiro é a simplicidade. A comida feita na panela de ferro sobre o fogão a lenha, o suco de bergamota, o café e o chocolate quente que a gente serve como se fosse para uma visita na nossa casa. É incrível quando uma pessoa acostumada a viver as mais incríveis experiências gastronômicas diz que aqui experimentou o melhor tempero da vida dela.
Entre as melhorias que os visitantes podem perceber estão a implantação de novos banheiros, sinalização e manejo das trilhas, novas operações de comércio e gastronomia e apresentações artísticas regulares. E, a fim de tornar a experiência ainda mais interessante, foi criado um passaporte para carimbar a passagem por cada um dos oito pontos de visitação, como o passeio de trenzinho na Estação Sonho Vivo, o observatório panorâmico da cascata, além de diversos mirantes para as belezas naturais do entorno. Ao completar o roteiro, o visitante se habilita a retirar um souvenir na saída para levar para casa.
Finalmente, como que para valorizar o carinho que o povo de Canela e do resto de Estado nutre pelo atrativo, o Parque passou a oferecer incentivos para estes visitantes. Pessoas nascidas e moradores de Canela têm entrada gratuita, enquanto gramadenses pagam meia-entrada e nascidos e residentes em qualquer outra cidade gaúcha contam com preços promocionais (as modalidades podem ser conferidas no site www.parquedocaracol.com.br).
HISTÓRICO
A história do Parque do Caracol remete a 1867, quando se instala na região da cascata a família Wasem. De origem alemã, a família chegou ao Brasil em 1847, tendo como primeira morada a região de Novo Hamburgo, incentivada pelo movimento de imigração existente na época.
A partir de 1900 começaram a surgir os primeiros hotéis, casas de veraneio e pequenos comércios nesta região. Em 1913, foi implantada a Companhia Florestal, para extração da madeira no Caracol, onde foram criadas cinco serrarias que iam abrindo estradas que ligavam a região a outras localidades. Em 1917, foi fundada a primeira escola, chamada Escola Isolada do Caracol, para alfabetização de crianças e adultos.
No período em que as terras eram administradas por Pedro Nunes, herdeiro da família Wasen, este percebeu o potencial para atrair visitantes à região e construiu, em 1938, uma represa e um moinho para geração de energia elétrica e fornecimento de farinha. Outra construção feita no período da administração de Nunes foi a casa onde funciona ainda o Centro Histórico e Ambiental do Parque do Caracol.
Em 1954, o governo gaúcho declarou que as terras cobertas pelo Parque do Caracol eram de utilidade pública. Em 1968, as terras são transferidas para o Posto de Turismo do Estado de Canela e, em 1º de agosto de 1973, o parque é inaugurado como Parque Estadual do Caracol, tendo como principais atrativos, além da contemplação da cascata homônima, mirantes para observação da mata nativa.
Depois de passar 49 anos nas mãos do poder público, o Parque do Caracol ganhou nova administração em dezembro de 2022. O Consórcio Novo Caracol e Tainhas, formado pelo Grupo Iter e pela Pianura Participações, venceu a concorrência pública e assumiu a gestão do atrativo, com o compromisso de revitalizar e ampliar a oferta.
CURIOSIDADES
- Em janeiro de 1978, o equilibrista suíço Peter Healing atravessou a cascata através de um cabo de aço suspenso a mais de 100 metros de altura, tendo apenas uma vara servindo de ponto de equilíbrio. Quarenta anos depois, o parque voltou a sediar esportes radicais, desta vez misturando modalidades de equilíbrio e manobras aéreas, além de oficinas de slackline para o público. O evento recebeu o nome “Caracol Por um Fio”.
- Dentro da proposta de servir como um espaço para a educação ambiental para escolas públicas e privadas, o Parque do Caracol conta com o projeto Lobo Guará, criado em 1992 pelo biólogo canelense Vitor Hugo Travi. A iniciativa durou 15 anos ininterruptos, chegou a ser interrompida, mas foi retomada em 2020 em parceria com uma operadora de turismo.
- Dentre as diversas espécies que habitam e que podem ser observadas no parque, uma das mais recorrentes e também das mais queridas é a curicaca, ave conhecida pelo seu canto alto e forte, que rendeu o apelido de “despertador do Pantanal”. O parque também exerce um papel importante na preservação de inúmeras espécies de mamíferos, incluindo algumas ameaçadas de extinção, e aves que têm o pinhão — semente da araucária — como base da sua alimentação.
- Para se ter uma ideia da importância do Parque do Caracol para Canela, basta dar uma olhada no brasão oficial do município, que tem a cascata como um dos seus símbolos (os outros são uma caneleira e duas torres de transmissão de energia, representando as usinas hidrelétricas).
SERVIÇO
- Endereço: Rodovia RS 466, km 0, s/n - Caracol, Canela - RS
- Visitação: todos os dias, das 9h às 17h30min (última entrada até 17h)
- Ingressos: adulto R$ 75. Isenção: pessoas nascidas ou moradoras de Canela mediante documentação comprobatória, cadeirantes, guias de turismo inscritos na Cadastur, crianças até cinco anos. Meia-entrada (R$ 37): pessoas nascidas ou moradoras de Gramado mediante documentação comprobatória, pessoas acima de 60 anos, mediante a apresentação de documento oficial com foto, crianças (de 6 a 11 anos), mediante a apresentação de documento oficial com foto, estudantes, mediante a apresentação de carteira de estudante, PcD e acompanhante, mediante a apresentação de laudo médico e/ou documento oficial com foto.
- Estacionamento: R$ 30