Entre tantos locutores que marcaram a história do rádio em Caxias do Sul, Osvaldo de Assis é recordado até hoje pelo timbre e pelo apelido que o consagrou: a voz de veludo. Parte da história do lendário comunicador foi destacada no livro Rádio Caxias 70 Anos - Voz e Identidade, lançado em 2017 pelo jornalista Marcos Fernando Kirst.
A partir de uma ampla pesquisa - e de informações reproduzidas da monografia "O Speaker com Voz de Veludo", escrita pelos autores Luiz Carlos Ponzi e Carla Viviane Mânica Bordin para a conclusão do curso de História da UCS -, Kirst mapeou uma trajetória ímpar:
"De 1948 a 1971, uma das principais vozes que encarnavam e protagonizavam os anseios caxienses à frente dos microfones da rádio não vinha das cordas vocais de locutores de sobrenome italiano, mas sim de um descendente de negros e escravos. Assis era uma das principais estrelas dos primórdios da Rádio Caxias, encantando os ouvintes com o timbre de sua voz poderosa não só na leitura de informes comerciais, notícias e narração de partidas esportivas, mas também interpretando personagens nas radionovelas, que prendiam a atenção das famílias em casa".
O início
Filho de Reinaldo e Laurentina dos Santos, Osvaldo de Assis nasceu em 14 de dezembro de 1919, na antiga Estrada Velha da Olaria (atual bairro Floresta). Conforme Kirst, após servir no 9º Batalhão de Caçadores de 1939 a 1941, o jovem ingressou na Companhia Telefônica Riograndense, onde permaneceu até 1948.
A aproximação com a Rádio Caxias deu-se na sequência de suas apresentações junto à orquestra "Típica Rauber", comandada pelo senhor Carlos Rauber. Dono de uma voz marcante como crooner e imitando Carlos Gardel, Assis desfilava um repertório de tangos e boleros sob o nome artístico de Henrique Gonzales. Não demorou, óbvio, para chamar a atenção da equipe da emissora, onde a Típica Rauber se apresentava uma vez por semana.
Após substituir nomes como Nestor Gollo e Mário Ramos por algumas vezes, Osvaldo de Assis foi efetivado na Rádio Caxias em 1º de fevereiro de 1948. Suas funções? Discotecário, programador e locutor.
Radionovelas, futebol e um caderninho
Em 23 anos de Rádio Caxias, Osvaldo de Assis foi o legítimo profissional multimídia. No auge das radionovelas, nos anos 1950, atacou de radioator, interpretando o papel de galã nas tramas românticas.
Paralelamente, narrava jogos de futebol e comandava diversos programas, como o "De Tudo um Pouco" e o "Clube da Estrelinha", em que calouros infantis se apresentavam no antigo Cine Imperial - os patrocinadores da atração eram a loja de calçados Estrelinha e a fábrica de refrigerantes Marabá, que distribuíam prêmios aos vencedores e faziam sorteios entre os ouvintes.
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Todo esse sucesso de Osvaldo de Assis acompanhava um segredo: sua condição de cardíaco, que ele costumava anotar em um caderninho, encontrado em uma das mesas da rádio após seu falecimento.
Lá estavam frases como "eu sei que não tenho cura", "eu sei que vou morrer depressa" e "ela está comigo e vou deixá-la sozinha". Nessa última, Assis referia-se à segunda esposa, Frieda Wormann, proprietária de um salão de beleza, com quem ele casou em 1968, após o falecimento da primeira mulher, Antonieta Flores da Silva de Assis.
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O adeus
Na manhã de 22 de abril de 1971, Frieda rumou para o salão de beleza e despediu-se do marido acenando pela janela - o locutor sairia na sequência para a rádio. Quando voltou para casa, às 11h, viu que o casaco de Osvaldo ainda estava sobre a cadeira.
Imaginou que ele tivesse esquecido o agasalho, mas encontrou o radialista caído no banheiro, já sem vida. Frieda soube, depois, que o marido havia ligado para a rádio avisando uma funcionária para "segurar as pontas" que dali a pouco ele chegaria.
Naquele dia, a programação da Rádio Caxias foi alterada para tocar somente música clássica, em homenagem ao comunicador falecido. Osvaldo de Assis tinha apenas 51 anos.
Reconhecimento
Conforme destacado pelo autor Marcos Fernando Kirst no livro, os pesquisadores Luiz Carlos Ponzi e Carla Viviane Mânica Bordin, responsáveis pela monografia "O Speaker com Voz de Veludo", fizeram um detalhado resgate "da vida deste homem negro, pobre, de boa voz e que marcou época em sua cidade".
O motivo repousa no fato de que "muitas são as pessoas brancas e ricas pesquisadas, historiadas. Negros e pobres como Osvaldo de Assis poucas vezes são lembrados. Suas histórias perdem-se na lembrança de seus contemporâneos".
Parceria
Agradecimento especial a Rádio Caxias, aos jornalistas Alessandro Valim e Marcos Fernando Kirst e ao escritor Luiz Carlos Ponzi.
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