Foi o maior desastre aéreo da história do Rio Grande do Sul na primeira metade do século 20. Tanto que até hoje, quase 70 anos depois, o choque de um avião da Panair contra o Morro do Chapéu, entre Gravataí e Sapucaia do Sul, habita a memória de familiares de vítimas, moradores das redondezas e milhares de gaúchos – aturdidos pela explosão de 28 de julho de 1950 ou pelas histórias contadas por pais e avós.
O luto que se abateu sobre o Estado estendeu-se também por Caxias do Sul, onde viviam quatro das 51 vítimas vindas do Rio de Janeiro. Falamos do promotor público Balduíno D'Arrigo, de sua esposa, Cecy Camargo D’Arrigo; da secretária geral da então Escola Normal Duque de Caxias, Irma Valiera; e da orientadora de ensino primário da Delegacia Regional de Educação, Silvia Jaconi.
Matéria do jornal Pioneiro de 5 de agosto de 1950 destacou o cenário pós-tragédia:
"A consternação em que caiu a cidade de Caxias com este acontecimento é coisa que não se descreve. Imediatamente, todas as entidades desportivas locais içaram bandeira a meio pau, visto o dr. Balduíno D’Arrigo pertencer à Junta Desportiva e ser presidente do Clube Juvenil".
Foi no Clube Juvenil, aliás, que Balduíno, Cecy e Irma Valiera foram velados, conforme detalhado pelo Pioneiro na capa da edição de 5 de agosto de 1950:
"Uma vez identificadas (as vítimas), foram transladadas para esta cidade. O cadáver da srta. Silvia Jaconi, entretanto, seguiu diretamente a Farroupilha, donde era natural. Os sinistrados chegaram à cidade na noite de domingo, dia 30, às 21h30min aproximadamente, sendo recebidos por enorme multidão que se acotovelava perante o Clube Juvenil. Na sala nobre da Associação Comercial foi feito o velório, a que assistiu grande número de pessoas".
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Edição do jornal "A Época" de 30 de julho de 1950 também noticiou o acidente e a atuação de Balduíno D’Arrigo:
"Era presidente do Clube Juvenil, para cujo cargo fora eleito ainda quando na Capital da República. Desportista dos mais entusiastas, procer influente do Grêmio Esportivo Flamengo e presidente da Junta Disciplinar Desportiva, era querido e estimado em todos os círculos esportivos locais. Em sinal de pesar, foi suspenso o prélio futebolístico entre Flamengo e Fluminense, que deveria realizar-se hoje, bem como o recital do tenor Mário Oliveira, marcado para sábado".
Balduíno D’Arrigo e Irma Valiera nomeiam ruas de Caxias do Sul. Ele, no bairro Pio X. Ela, em São Pelegrino.
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O trágico voo da Panair
O voo 099 da Panair estava marcado para a manhã de sexta-feira, 28 de julho de 1950, mais saiu da Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro, então capital da República, somente perto das 16h – devido a um defeito em um dos motores.
O pouso, previsto para as 18h45min na Base Aérea de Canoas, acabou sendo abortado devido à chuva e ao nevoeiro, seguindo-se uma arremetida. Já durante a segunda tentativa de aterrissagem, o piloto perdeu contato com a torre, seguindo-se uma nova arremetida. Por volta de 19h25min, o Constellation chocou-se contra o Morro do Chapéu, explodindo e incendiando boa parte da área. O difícil acesso fez com que equipes de resgate levassem até duas horas para chegar ao destroços. Já os trabalhos de remoção dos corpos de todos os tripulantes e passageiros levaram vários dias.
Matéria especial publicada por Zero Hora em 7 de abril de 2017 recordou da tragédia e seus personagens em detalhes:
"Havia 43 passageiros com assento marcado no Constellation, um majestoso quadrimotor fabricado pela Lockheed. Quase todos gaúchos abastados, voltando de uma temporada de lazer na Cidade Maravilhosa. 'A maioria dos passageiros viera ao Rio para aproveitar as férias escolares e também para apreciar os jogos da Copa do Mundo', registrou à época o Jornal do Brasil. Apenas 12 dias antes, a seleção brasileira havia sido derrotada pelo Uruguai no célebre Maracanazo".
Lembranças de Mary Viezzer
Dona Mary Lúcia Viezzer tinha 11 anos em 1950 e recorda bem do velório no Juvenil. À época, o pai, José Viezzer, era ecônomo do clube, e a família, completada pela mãe Cecília Florian Viezzer e pela irmã Vera, morava no prédio.
– O Balduíno D’Arrigo veio (do Rio de Janeiro) para assumir a presidência do clube. A Irma Valiera tinha ido visitar a dona Angelina (filha de Abramo Eberle e esposa de Caetano Pettinelli, que moravam no Rio à época). Os três foram velados lá dentro – conta.
Curiosidade: seis meses antes de morrer no desastre aéreo, Irma Valiera, acompanhada da irmã Itália, participou de uma homenagem a Adélia Eberle, primeira rainha da Festa da Uva, eleita em 1933 e falecida em 1941. A cerimônia, junto ao jazigo da família Eberle no Cemitério Público Municipal, ocorreu em 2 de fevereiro de 1950, com a presença dos irmãos de Adélia -Júlio e Rosália-, de Bila Vial e do advogado Olmiro de Azevedo (foto abaixo).
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