Eu já tinha me emocionado com a cena compartilhada milhares de vezes de Rafael Nadal e Roger Federer sentados lado a lado e chorando muito, na Laver Cup de 2022, competição que marcou o encerramento da carreira do tenista considerado o melhor de todos os tempos. Voltei a me comover com ela depois de assistir ao documentário que trata dos 12 dias finais de Federer na quadra, do momento em que anuncia a aposentadoria até a última raquetada, com olhar focado na intimidade e na mente do campeão.
Para a despedida, convidou os principais rivais: Novak Djokovic, Andy Murray e Rafa, meu favorito. É fofíssima a relação entre o suíço e o espanhol, que se tornaram amigos em meio às disputas mundo afora. Federer, considerado o Baryshnikov do tênis, por conta da elegância com a qual jogava, tenta manter-se sóbrio até o final. Rafa é superemotivo e derrama muitas lágrimas, elogia o amigo, lamenta a aposentadoria. Aprendeu a ver o melhor dele olhando para o outro. Encontrou alguém para dar sentido a todo esforço que vez ao longo da carreira, para ser um adversário especial a ser derrotado. As perdas e os ganhos se encerram nas quadras, porque na vida real ambos compartilham dores físicas e emocionais, derrotas, frustração e muitas, muitas vitórias.
Talvez por isso seja tão comovente observar a luta de Federer, quase silenciosa, contra o fim de uma era. Ele não tem certeza sobre o que fará no dia seguinte. Sequer consegue definir quem é longe do esporte que pratica há décadas — até a família tem dúvidas sobre o que seguir em frente irá significar. Tal qual um espelho, ao olhar para ele envolto em um universo de fama e glamour, percebo que no fundo, nas aspirações e nos medos, aproxima-se de qualquer um de nós. Todos ficamos com receio do desconhecido, evitamos sair da zona de conforto, mesmo que ela nem esteja mais tão confortável assim. Ou nunca tenha sido.
Quantas vezes a gente se apega aos bons momentos para prolongar uma história que deixou de fazer sentido? Mesmo nos casos em que um término é anunciado, não é simples se adaptar ao encerramento dos ciclos. Demora um pouco para a gente se dar conta que finais também são recomeços. É só uma questão de ponto de vista.
Recomeços surgem com aquele frio na barriga de quem se apaixona, de quem aprende a andar de bicicleta ou a nadar, quem assiste ao show de um ídolo, quem sobe num avião pela primeira vez. Pode ser frustrante, mas normalmente é mágico: de forma imposta ou esperada, reprogramar a rota exige autorresponsabilização, resiliência e coragem. É dar um salto sem saber ao certo como será a queda — se é que ela virá. Pular pode ser apenas uma oportunidade de alçar voos ainda maiores, a partir de uma nova perspectiva, que começa a se desenhar quando o passado vai sendo deixado para trás.