Quinta, depois de almoçar com colegas, Maurício ofereceu uma bala de menta e comentou que lembrava da vó dele, que sempre tinha o doce em casa. Na residência dos meus avós, tinha um vidro enorme — ao menos parecia enorme para uma guriazinha — de balas soft de caramelo. Era possível comê-las à vontade, desde que fossem partidas (ou esmigalhadas). Isso porque meu vô, pediatra, tinha medo que as balas redondas ficassem trancadas na garganta das netas. Então comíamos uma espécie de pó açucarado. E, certamente por isso, sobrevivemos a ela. Sim, bala soft era um dos perigos da infância nos anos 1990.
É muito bonitinho pensar que uma simples bala traz tanto da infância e como fragmentos singelos acabam por ajudar a contar histórias de nós mesmos. Muito por acaso, encontrei uma palavra japonesa, natsukashii, que explica exatamente isso. Ela significa nostalgia feliz: o instante que a memória transporta a uma bonita recordação e enche o coração de ternura.
Ouvi uma entrevista da jornalista Ana Paula Padrão em um dos podcasts da Tati Bernardi e, lá pelas tantas, ela fala que foi criada para ser uma mulher forte e determinada — e deu alguns exemplos de como os pais a ajudaram a se construir dessa forma. Imediatamente fiz associação com um pensamento que veio à minha cabeça enquanto eu assistia a um pôr do sol lindo de morrer em frente à praia de Camps Bay, na Cidade do Cabo, poucos meses atrás. Olhava para meu drink com framboesas flutuando no perlage e pensava no quanto minha mãe tinha sido decisiva para eu estar ali. Não, ela não comprou a passagem, nem sugeriu o destino. Ela fez bem mais: ajudou a me tornar a mulher que sou hoje — com condições de desbravar o mundo, sozinha ou acompanhada. E é muito legal conseguir me dar conta disso a tempo de agradecer.
Adoro celebrar aniversário — meu e dos outros. Sempre acredito que a data carrega consigo o novo nascimento para algo. Um pouquinho mais de bagagem, sem que o tempo transcorrido se esvaia. Nem sempre percebemos, mas vamos ter 16 anos para sempre. 25 para sempre. 37 para sempre. As idades em questão estão congelados em algum lugar desse percurso cronológico. Há sempre algo que fica nos lugares de onde saímos. Há sempre um pouco de nós naqueles que fomos, mesmo que já tenhamos mudado absurdamente. Mesmo que não precise quebrar a bala soft ou não tenha medo de caminhar pelas ruas de Tóquio sozinha. A menina e a mulher convivem e ajudam a dar significado para o novo que sempre vem. Porque — ufa/oba — sempre vem.