Só pessoas muito deprimidas não têm nem um pouco de ansiedade, disse-me a psicóloga, na sessão semanal. Senti uma ponta de alívio, lembrando que algumas emoções podem ser circunstanciais, outras, nem tanto. Quase todo mundo, hoje em dia, oscila entre algum extremo — e tudo bem. Paralelamente, comecei a recordar minhas tentativas de estoicismo, que ainda são justamente isso: um percurso.
Os estoicos ensinam a ter uma mente calma e racional, porque ela ajuda a reconhecer o que é possível controlar e a aceitar o que não se tem controle. Sei que, como bem versou Sêneca, estar ansiosa com o futuro e infeliz com a miséria que pode vir é uma ruína para alma. E, desta forma, nossa alma nunca estará em repouso. O antídoto, no caso, é ter consciência do presente. Ou, evocando um clichê, como bem diz a canção do Lulu Santos, Tempos Modernos, “não há tempo que volte, amor, vamos viver tudo que há pra viver, vamos nos permitir”.
Penso na coincidência — mesclada a um projeto grandioso — que me reaproximou de um amigo de adolescência. Dos áudios intermináveis e das reflexões à distância sobre a vida, falamos muito sobre a pulsação dos dias, sobre ser quem somos de verdade, sobre admitir as falhas sem filtros. Sobre coragem e enfrentamento dos desafios, que aparecem e não costumam ser pequenos. Sobre dimensionar com quem queremos passar o tempo, trocar energia e deixar a vida mais leve. Logo ele, que me fez lembrar da urgência dos dias, voltou a ensinar que não é preciso passar por uma desgraça para valorizarmos as bênçãos e as pessoas que temos por perto.
Aliás, decidi ter cada vez mais perto quem eu gosto. O distanciamento social serviu para mostrar os extremos: o que tínhamos em excesso (e sequer precisávamos) e o que nos faz falta (e queremos ter). Arrisco-me a dizer que a primeira são coisas e a segunda são pessoas. A consciência de que a vida é temporal e finita é melhor do que viver preocupada com o passar do tempo. Porque ele vai passar, aproveitemos ou não. A escolha, portanto, parece um tanto óbvia.
Anos atrás, conversando com um senhor octogenário que tinha voltado do Caminho de Santiago de Compostela, ouvi que a maior lição que ele tinha aprendido durante a trajetória tinha uma relação estreita — e metafórica — com a pequena mochila que ele carregava sobre os ombros. Disse-me que começou com a bolsa cheia e um pouco pesada e, à medida em que os dias foram passado, ele começou a esvaziá-la, deixando os poucos pertences pelo caminho. “Percebi que a gente não precisa de quase nada para ser feliz”, sentenciou. É isso: só vamos perceber a grandiosidade dos dias durante uma caminhada cheia de obstáculos, mas não podemos parar de mexer nossos pés. Assim, enquanto estivermos em movimento, nossa alma vai conseguir repousar.