Dona de uma personalidade inquieta, Laina Brambatti é colecionadora de ideias fundamentais. Licenciada e Mestre em Filosofia, iniciou sua trajetória, aos 16 anos, como educadora no Programa Primeira Infância Melhor e desde lá nunca mais deixou de estar em sala de aula. A mãe de Arthur Brambatti Bavaresco, 14, e Martín Brambatti Marin, cinco, atuou em instituições de ensino públicas e particulares, sempre com foco no desenvolvimento da criança e do adolescente e hoje é diretora pedagógica da Cataventura, uma escola de educação infantil com método montessoriano.
A de Acreditar: no sentido de apostar no possível e sustentar a realidade do próprio desejo.
B de Brincar: a gente vai crescendo e vai ficando chato. Achamos que resumir a vida em assuntos preocupantes e críticos denota uma seriedade de “gente grande” e esquece que é justamente a falta de alegria que leva a muitos desses problemas. Brincar é indispensável, revigorante, tornando mais leve a parte desafiadora da vida. As crianças nos mostram que a brincadeira é espaço lúdico de ressignificação e bem estar.
C de Criança: por mais ou menos 13 séculos "criança" não existiu como conceito e como consideração sociopolítica. Eram apenas adultos menores. Durante mais da metade do tempo de existência da civilização as crianças pertenciam a uma minoria, sem direitos, portanto sem proteção sujeitas a todo o tipo de violência e/ou negligência. Isso explica a origem de muitos dos nossos problemas em aceitar direitos humanos como direito básico.
D de Diversidade: sem ela acabaríamos como uma grande massa amorfa de indivíduos sem identidade. A riqueza do diverso permite a troca.
E de Educação: que é caminho de humanização e a principal via para qualquer mudança de paradigma social, não é à toa que é um dos setores com menor investimento em países explorados como o nosso.
F de Filhos: o amor que sinto por eles dá um valor inigualável à vida.
G de Gentileza: porque sim.
H de Humanização: é indispensável para podermos sobreviver, uma vez que somos seres interdependentes.
I de Imperfeições: porque podemos meditar, acender incenso, aprender comunicação não violenta, encarar anos e anos de análise, ir de joelhos pra Caravaggio, tomar passe, ser gratiluz, aprender regras de etiqueta e ainda assim seremos imperfeitos. me parece melhor aceitarmos isso de uma vez e parar com exigências absurdas que também nos ajudam a parar de julgar os modos de vida alheio. É bem difícil, mas, necessário.
J de Justiça: tudo aquilo que é o oposto à violência e/ou busca reparação pacífica.
K de karaokê: um modo divertido de se permitir falhar em público, porque adoro cantar mas tenho preguiça de aprender.
L de LGBTQIAP+: essa sigla já adquiriu poder substantivo e figura aqui também representando a importância da luta pela representatividade de qualquer minoria. É impossível vivermos em paz enquanto ideologias conservadoras incentivarem a violência e a segregação social. A representatividade e a diversidade são elementos fundamentais para a democracia.
M de Maria Montessori: sistematizadora de uma metodologia psico-educacional revolucionária por reivindicar e indicar um caminho prático para a efetivação de uma teoria complexa e profunda, abrindo caminhos para o respeito à dignidade da criança.
N de Nascimento: me lembra de quando li "A condição humana" da filósofa/cientista política Hannah Arendt, nesse texto ela argumenta acerca da importância de cada nascer. Cada novo ser que surge no mundo traz consigo uma novidade, é ao mesmo tempo igual e diverso, por ser único/original tem sempre algo a contribuir com a comunidade humana.
O de Ontem: o passado e sua a história são uma fonte incrível de aprendizado, tanto pessoal quanto social. Nos ajuda a não repetir erros. Porém pode nos impedir de seguir em frente e inovar, é necessário equilíbrio nesse retorno.
P de Psicanálise: Sócrates com o famoso "conhece a ti mesmo" alertou que qualquer pensamento, crença e até sentimento, daqueles que não sabem quem são, são baseados em ilusões. Frequento a psicoterapia há mais de 10 anos e, não só acredito como verifiquei empiricamente, qualquer mudança que desejamos no mundo precisa antes ser passível em quem somos.
Q de Quimera: por vezes viver é estar sempre lidando com uma combinação incongruente de elementos diversos.
R de Razão: teoricamente superestimada, pouco utilizada na prática.
S de Sentir: o sentir por sua vez é subestimado em nossa cultura, porém, nada é mais poderoso que permitir-se sentir e aprender/ser ao fazer isso.
T de Tempo: depois da pandemia da Covid-19 entendi melhor que nunca o quanto ele é relativo. Outro exemplo lindo disso é o desenvolvimento infantil, embora estejamos todos sujeitos a “mesma” temporalidade externa, cada um tem sua perspectiva.
U de Universo: qualquer oportunidade de observar o universo é também um modo de nos situarmos em nosso verdadeiro tamanho.
V de Vida: muito se fala sobre a valorização da vida e outro tanto se discute sobre quando acontece ou não o início dela. Pensamos sobre o que vem depois e afirmamos que muitas de nossas atividades são em função de mantê-la. Tenho a impressão de que ignoramos como é comum irmos contra a vida, inclusive quando vivemos de maneira alienada. Nosso discurso é pró-vida, mas a forma como vivemos a torna cada vez mais difícill.
W de Winnicott: pois é um dos mais influentes psicanalistas no estudo do desenvolvimento infantil. Me encanta como ele demonstra as semelhanças entre a criança e o adulto, acontece de (nós adultos) não estarmos distantes da criança, sejam as que convivemos ou a criança que fomos.
X de Xodó: palavra de origem africana significa sentimento profundo demonstrado por alguém, carinho. Até a pronúncia é gostosa.
Y de Yanomami: recentemente nos deparamos com cenas chocantes sobre o estado crítico dos povos originários. Mais chocante que a situação na qual se encontram é reparar que isso não é novidade, é um dos genocídios mais longos da história da humanidade. Apesar de muita comoção nas redes, há pouca mobilização para mudar esse quadro. Soube que uma das formas de ajudar é comprando o artesanato produzido por eles.
Z de Zelo: não só porque tudo seria melhor pra todos com ações zelosas, mas também porque tem algo de contemplativo e prazeroso em agir assim.
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Dicas de leitura:
- Um livro para aprender a ler: qualquer livro do Manoel de Barros.
- Um autor que todos deveriam conhecer: Lélia Gonzalez.
- Que obra nunca sai da sua cabeceira? Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.