Ser humano em obras
Hoje é dia de apresentar o inventivo e sensível Pablo Onzi Perini, aquariano filho de Benildo Perini e Maria do Carmo Onzi Perini. Atuante na vinícola da família, ele tem se revelado, além de um profissional inquieto e criativo, um artista plástico de mão cheia. Formado em Publicidade e Propaganda e Comunicação Social com ênfase em Marketing, nossa persona do dia conta histórias de vinho, vida e arte com um pensamento profundo, quase filosófico, e se define como um ser humano em obras.
Qual sua lembrança mais remota da infância e que sabor te remete essa época? Brincar com os irmãos, primos e amigos em Santos Anjos, distrito do interior de Farroupilha, onde me criei e trabalho até hoje. Como diz a máxima “recordar é viver”. E essas memórias remetem à pureza da infância, a graça de rir por nada. Enfim, a alegria e a descoberta, o tempero da vida.
Vinho bom combina com: boa companhia à mesa, família, amigos, sofá com filme e cobertor; leitura, música ou uma contemplação mais introspectiva e silenciosa da natureza. Combina com uma conversa descompromissada, até uma imersão mais profunda na própria alma.
Qual sua bebida favorita? Vinho. Isso que tenho dificuldade para eleger predileções.
Qual a passagem mais importante da tua biografia e que título teria se fosse publicada? Matteo: reNascimento de consciências. Título alusivo à vinda do amado sobrinho ao mundo, sem dúvida o maior agente de mudanças em nossas vidas. Espero que os pais dele não se importem ao ler essa citação.
Se tivesse vindo ao mundo com uma legenda ou bula, o que conteria nela? Deixe os rótulos para os vinhos.
Um hábito que não abre mão? Tentar entender.
Uma pessoa que admira e porquê? Meu irmão Ramon (in memoriam), pois sem querer, através de sua breve passagem em nossas vidas, na sua forma terna e autêntica de ser involuntariamente, me fez compreender muita coisa sobre a vida, o respeito ao próximo e a aceitação quanto as pessoas como são; agregando-as sempre que possível. Além de mostrar, pela atitude, como não se levar a sério demais e que quebrar o gelo com sutileza, frequentemente é o melhor a se fazer.
Qual a importância da produção vinícola da Serra gaúcha no mercado internacional? Representa um legado cultural que segue sendo construído e a expressão de algo mágico chamado terroir: a síntese do que vem deste solo e clima, além de todos os métodos de cultivo e produção humana realizadas em harmonia a este conjunto. E neste sentido, o Brasil vitivinícola tem se apropriado cada vez mais do que já pode-se dizer seu desde a época da imigração, além de estar constantemente construindo o novo para formar uma identidade mais e mais consistente, requisito fundamental para o destaque fora do país.
Por que o vinho é considerado “um santo remédio”? Porque quando nos entregamos ao vinho, no momento de bebê-lo, podemos perceber que ele pode curar as “doenças da alma”. Ele abraça, acalenta, faz refletir e também nos aproxima do outro.
Com a situação atual do mundo, você acredita que o empreendedor estará mais preparado para desenvolver trabalhos voltados à coletividade? Como observador geral me parece que cada vez se torna mais viável empreender microprojetos, no sentido de que criar um grupo de conversa virtual com sua vizinhança para o empréstimo de objetos, desde a furadeira até o açucareiro para fazer um café podem ser formas de empreender, pois ainda que não gere lucro existe benefício e até cabe no conceito de “economia compartilhada” dentro deste microcosmos. Claro que criar um App revolucionário ou abrir uma metalúrgica continuam sendo empreender, porém envolvem investimentos substanciais, altos riscos e barreiras de mercado. Mas voltando ao exemplo do grupo entre os vizinhos, creio que do pequeno ao grande movimento haja um reconhecimento da importância legítima do outro e do caráter de responsabilidade das corporações.
Inovação ainda é um termo muito distante do cotidiano de milhões de pequenos empresários. Como é possível inovar sem recorrer a grandes parcerias? Qual sua recomendação ao pequeno empresário? Creio que a inovação seja frequentemente confundida com a inventividade, a primeira representa diferencial num contexto de soluções para consumidores e gera algum valor para os mesmos. Possivelmente uma abordagem diferente e simples sobre um mesmo tema (um corte de peça ou tecido mais leve para camisetas esportivas, por exemplo) seja mais certeiro do que uma pirotecnia “fora da curva” que requeiram maiores investidas (prancha a jato para se movimentar na água, tentativa que ocorreu de fato). Logo, incrementos que representem diferenciais e soluções podem vir antes de viradas de chave mirabolantes.
Qual a importância do timing em um negócio? A questão de hora certa no local certo tende a ser crucial em mercados baseados em alguns modismos ou mesmo, em ondas de mercado mais longas. Contudo, o que envolve construção de uma certa identidade de marca que não esteja ligada a uma certa tendência, ainda que disruptiva, num mercado mais maduro requer tempo, paciência e consistência.
Que equívocos cometeu e que lição aprendeu com eles? O que faria diferente se voltasse no tempo? Talvez tivesse começado antes alguns projetos que me permiti iniciar posteriormente. Creio que isto não passe por ter feito diferente propriamente, mas sim, apenas ter dado o primeiro passo. Antes feito do que perfeito, o resto é correção de rota.
De onde acredita que surgiu essa sua relação com a arte? É algo que vem desde a infância, praticando com meus irmãos, uma tia e também um grande amigo, com quem fazia histórias em quadrinhos. Acho que desde sempre encontrei no desenho e nas histórias uma maneira de extravasar a imaginação e tornar tangível e registradas algumas narrativas que, por muitas vezes, “evaporavam” na efemeridade das brincadeiras com carrinhos ou bonecos de ação em cenários montados. Depois disso esta “brincadeira” se manteve como hobby e também veio a ser útil no trabalho, em paralelo.
Seu trabalho já ganhou rótulo de vinho? Através de um projeto de caráter autoral, o Crudo, pude conciliar a elaboração de vinhos de baixa intervenção com rótulos únicos e pintados totalmente a mão. São 4 mil rótulos diferentes uns dos outros e pintados manualmente diretamente no papel que foi colado às garrafas. Ter os dois vinhos premiados desde a primeira edição foi muito gratificante e novidades estão por vir para a marca. Além disso, fiz uma coleção de embalagens com temas de verão para o espumante moscatel Casa Perini.
Qual é o artista plástico ou designer brasileiro que mais admira? A lista seria grande. Mas tenho acompanhado e gosto muito do Loro Verz, Marcelo Quintanilha, Bruno Maron, Paulo Cavalcante e Bruno Novelli.
Quais são suas influências e inspirações? Como isso reflete no seu dia a dia? Música, filmes, arquitetura, a rua, a natureza, pessoas de convívio, pessoas aleatórias, além de uma infinidade de artistas específicos e absolutamente qualquer coisa acaba influenciando o que crio, pois da mesma forma que não manifestamos nada do que não somos, também não passamos indiferentes ao que nos deparamos, mesmo sem saber.
O que faz para se manter atualizado na sua profissão? Acompanho novidades do meio através de canais de vídeos na internet, perfis de redes sociais, revistas online, podcasts, cursos e conversas com pessoas das mais variadas áreas. No marketing e na comunicação a curiosidade constante é fonte permanente de inspiração. A nova banda pode virar referência para uma trilha, um passeio aleatório revela uma locação para vídeo, o bate-papo com alguma pessoa que manifesta opinião pode provocar um insight e assim por diante.
Como utiliza o tempo livre? Produzindo e consumindo arte nas suas mais variadas formas, cozinhando e caminhando.
Não vivo sem: provocações pertinentes.
Gostaria de ter sabido antes… é impossível fazer tudo junto e ao mesmo tempo.
Quais os seus projetos para o futuro? Ainda que façamos planos, degustar a vida às cegas aceitando a liquidez e a irrepetibilidade de nossa existência, fascina e convida a acordar no dia seguinte.
Reflexão de cabeceira? Esvaziamento mental de caráter meditativo (ou uma tentativa disso).
Quais lições têm aprendido com a crise gerada pela pandemia? Ninguém é e nem faz nada sozinho.