* Por falar em França (crônica desta terça-feira 29/11), a coluna Histórias de Copa reproduz crônica originalmente publicada em 5 de julho de 2006. Ano em que a França eliminou o Brasil na Copa da Alemanha.
Além de fazer o gol que afundou a Seleção Brasileira na Alemanha, em 2006, Thierry Henry, o centroavante da França, ainda sentiu-se à vontade para dar alguns pitacos acerca de nossa vida doméstica. Vejam só!
Então, pintou um quadro extremamente genérico e superficial sobre nossas crianças, sobre a educação em nosso país e a inclinação da rapaziada para o futebol. Deu seus pitacos sem levar em conta os prejuízos ao contexto e à falta de exatidão que os distanciamentos físico e cultural produzem.
A rigor, talvez tenha falado o que não devesse o nosso carrasco Henry. Emitiu sem embaraços conceitos e pareceres sobre o quintal do vizinho, o que até nem é proibido, mas é de bom tom administrar com habilidades, gentilezas, ressalvas e salameleques, ainda mais sob os holofotes de uma Copa do Mundo.
Mas não. Henry foi colocando as cartas sobre a mesa. Surgem craques em doses industriais no Brasil porque as crianças brasileiras estão jogando futebol quando deveriam estar na sala de aula, discursou o francês, em linhas gerais. Seus palpites e opiniões incomodaram, e houve reações, mas falta ver se há um fundo de verdade no que disse Henry, algo de útil a nós, brasileiros. E, tristemente, é preciso reconhecer que sim.
Grosso modo, é notório o gigantesco débito que temos com a educação formal de nossas crianças. E ainda que os números da evasão escolar sejam baixos, pelo menos oficialmente (os números da época não experimentavam o impacto de uma pandemia), e ainda que nossas crianças nem estejam jogando futebol tanto assim, pois há coisas bem piores e graves a chamar-lhes a atenção, o certo é que falhamos vergonhosamente em prepará-las para a vida, e esta é a raiz de nossos problemas e mazelas nacionais. Thierry Henry tocou na ferida e, ainda por cima, nos mandou embora para casa na Copa da Alemanha.
É mesmo um desagradável esse Thierry Henry.
* Durante toda a Copa do Mundo, o colunista Ciro Fabres publicará em GZH Histórias de Copa, uma coletânea de crônicas e histórias embaladas em torno das Copas do Mundo, desde a primeira delas acompanhada pelo colunista, a de 1970, no México. Com a Copa do Qatar, são 14 Copas.