A 4ª Promotoria de Justiça Especializada do Ministério Público do Rio Grande do Sul, órgão que responde pela questão da Infância e Juventude em Caxias do Sul, emitiu na última sexta-feira (16) uma normativa, em caráter de recomendação. O documento trata sobre os procedimentos do município de Caxias em relação à cobrança de cumprimento do calendário de vacinas obrigatórias estabelecidas pelo Ministério da Saúde.
A questão surgiu após o prefeito Adiló Didomenico declarar que não iria tomar nenhuma medida em relação a pais ou responsáveis que não fizessem a imunização das crianças contra o coronavírus. A recomendação, assinada pela promotoria Simone Martini, que responde interinamente pela Promotoria da Infância e Juventude, reforça os procedimentos que o município deve fazer, e abre a possibilidade de responsabilização dos agentes públicos que descumprirem as normas.
No documento fica expressamente recomendando que se observe a legislação sanitária vigente, seguindo o que determina a lei, e que no entender do MP não dá a Adiló a função de definir qual tipo de vacina vai ser exigida ou não. Segundo a promotoria, após a apresentação da carteira de vacinação, o prefeito não pode impedir que as escolas notifiquem as autoridades competentes (Conselhos Tutelares e Ministério Público) se for constatado que pais ou responsáveis não estão providenciando a imunização das crianças com todas as doses previstas pelas autoridades de saúde, inclusive contra a covid-19, que foi inserida no calendário obrigatório no início de 2024.
Em conversa com a coluna, a promotora Simone Martini ressaltou que os procedimentos a serem seguidos são os mesmos feitos até hoje, e que o prefeito não tem poder para alterar isso. Ela avalia, inclusive, que qualquer ação do Executivo caracterizaria uma interferência indevida em órgãos de fiscalização.
— O Conselho Tutelar vai fazer o que faz com qualquer caso similar, e que já foi feito várias vezes. Isso não é uma novidade para nós, pois já temos vários processos de pais que não vacinaram os filhos por convicção ou outras razões, e se discute isso no Judiciário. O prefeito não pode obstaculizar o trabalho do Conselho Tutelar, do Ministério Público e do Judiciário — aponta Simone.
A promotora ressalta que a recomendação tem caráter preventivo a uma judicialização do tema, para evitar que se chegue a esse extremo. Além disso, ela considera a postura de Adiló oportunista e ilegal:
— Foi muito indevida e, me parece, oportunista, a manifestação dele, porque ele não faz parte desse processo, e está determinando que os agentes públicos não façam o que a lei manda fazer. Isso pode implicar em uma responsabilização dele por improbidade administrativa, já que não cabe a ele dar uma ordem de descumprimento de lei. Ele não tomou nenhuma medida para dizer que essa legislação é inconstitucional, e ela não sendo julgada inconstitucional pelos órgãos competentes, ela tem validade, e precisa ser cumprida.
Quanto às demais prefeituras da Serra (Farroupilha e São Marcos) que também manifestaram que não iriam cobrar a vacinação contra a covid-19, Simone ressalta que eventuais providências têm que ser tomadas pelas promotorias de Infância e Juventude de cada uma dessas comarcas. No caso de Farroupilha, inclusive, o caso está em análise pelo procurador-geral, pois foi emitido um decreto e não só uma orientação, como foi o caso de Caxias.
Procurada pela coluna, a assessoria de imprensa do município de Caxias do Sul disse que o prefeito primeiro quer ler o documento do MPRS, e que a PGM também vai analisar a recomendação, para avaliar se está ou não de acordo com o que o município já faz.
Você pode conferir aqui a recomendação completa do Ministério Público, e abaixo está a nota publicada na tarde desta segunda-feira pelo órgão sobre o tema.
O Ministério Público do Rio Grande do Sul em Caxias do Sul expediu, na sexta-feira, 16 de fevereiro, recomendação ao prefeito Municipal, Secretarias Municipais de Saúde e de Educação, diretores de escolas privadas e Conselho Tutelar sobre vacinação de crianças e adolescentes, diante da obrigatoriedade de imunização conforme o calendário do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde.
No documento, a 4ª Promotoria de Justiça Especializada de Caxias do Sul solicita que o prefeito observe a legislação sanitária vigente, pautando suas ações estritamente sob a ótica da lei que rege os atos da administração pública, abstendo-se de inviabilizar a aplicação da legislação e a competência plena da atuação dos Conselhos Tutelares.
Para a Secretaria Municipal de Saúde, foi recomendada a realização de campanhas educativas de esclarecimento e sensibilização da população acerca da imunização obrigatória de crianças. Além disso, que seja feito um alinhamento de estratégias para verificação da regularidade vacinal e promoção da vacinação com todas as vacinas do calendário obrigatório nas redes pública e privada de ensino do Município, designando cronograma de vacinação em cada unidade, com a ciência prévia aos pais e alunos quanto ao dia da vacinação, com a possibilidade de que os responsáveis acompanhem a imunização ou, em caso de ausência, façam uma autorização.
No que diz respeito às matrículas e rematrículas, a Promotoria solicitou que a Secretaria Municipal de Educação determine ao responsável em cada unidade de ensino que verifique, no ato da matrícula e rematrícula, se o esquema vacinal está completo e atualizado, estabelecendo o prazo de 60 dias para a correção de eventuais problemas. Ultrapassado o prazo, em caso de omissão injustificada, que o diretor do estabelecimento comunique o fato ao Conselho Tutelar. Além disso, caso não tenha sido possível a verificação no ato da matrícula ou rematrícula, seja determinado que as escolas comuniquem por escrito os pais ou responsáveis para que atualizem as informações quanto ao esquema vacinal dos alunos e, em caso de omissão, seja determinada a imediata comunicação do fato ao Conselho Tutelar para providências. O mesmo foi solicitado aos estabelecimentos de ensino da rede privada.
Ainda, foi recomendado que o Conselho Tutelar, ao tomar conhecimento de que os responsáveis legais por crianças e adolescentes se opõem à imunização de acordo com calendário vacinal previsto no PNI, aconselhe e sensibilize os pais ou responsável, esclarecendo as dúvidas sem qualquer espécie de posicionamento pessoal, político, filosófico ou religioso.
Por fim, consta na recomendação que, caso não seja atendida, poderá ser proposta ação civil pública, além de outras medidas judiciais e extrajudiciais e que recomendação não esgota a atuação do Ministério Público sobre o tema.