Hoje é o Dia Internacional da Mulher. É um dia de reflexão. É um dia de luta. É também um dia em que o capitalismo, por meio do comércio, distorceu a história e o transformou em sinônimo de celebração do feminino e da feminilidade. A cada mulher que ganha uma rosa ou presente neste dia reforça-se a ideia patriarcal de que é necessário reafirmar na mulher seu lado delicado e passivo. Claro que isso é algo que permeia o subjetivo e que quando dito assim, sem firulas, pode causar estranhamento. Mas eis aí uma maneira engenhosa de normatizar nossa feminidade. E tenho a clareza de que muitas mulheres me lerão e balançarão suas cabeças em negativa, dizendo que não é bem assim. Isso só demonstra que ainda temos um longo caminho pela frente.
Isso demonstra também o tamanho do campo de poder no qual estamos atreladas, orbitando, continuamente e sistematicamente. Rechaçar questionamentos que envolvam nossa atuação na sociedade ou dentro do núcleo familiar é deflagrar o grau de nossa alienação. E escuto muito quando dos encontros com outras mulheres, independente da escolaridade, frases do tipo: “mas isso não acontece comigo, comigo é diferente, eu não sofro isso, discordo da ideia de não ser presenteada neste dia”.
Toda vez que saímos para caminhar, nos divertir, trabalhar, encontrar com alguém, nossa mente e nosso corpo são invadidos por definições sociais femininas de como temos de nos comportar, por onde podemos andar, que tipo de resposta temos de dar. O desejo de nossa autonomia tem pernas curtas. Basta revisitar as inúmeras campanhas promovidas ano após ano de respeito à mulher. Uma das mais recorrentes é Não é Não. Ou seja, nosso não é levado em consideração. Não que ele não seja uma negativa, mas porque nosso desejo não é validado. Aqui há uma marca de gênero que denota uma estrutura de poder que vem disfarçada de naturalização. “Homens são assim mesmo”, “é a mulher que tem que se dar o respeito”, “ela disse não mas na verdade queria”, são exemplos de falas que normalizam uma hierarquia, construída socialmente, do comportamento masculino hegemônico (machista e tóxico). Outro exemplo disso, é a fala do ex-candidato a governador, mamãe falei, Arthur do Val, sobre as ucranianas. Seus áudios trouxeram a público algo que é muito comum em nosso país: a objetificação sexual das mulheres. Isso sem falar no desprezo pelas mulheres, na incivilidade e na perversidade do sujeito. E vale lembra que perverso é todo aquele que está ciente das regras e leis e mesmo assim escolhe transgredi-las, de forma deliberada.
O debate é longo e exige coragem, força, perseverança, conhecimento e sororidade. Que o dia de hoje seja um daqueles que mexe com nossas entranhas e nos impulsiona a romper com o gendramento a que somos submetidas e que nos submetemos, seja pelo motivo que for. Uma mulher sozinha que exige ser ouvida é tida como louca, expressão desqualificadora da nossa capacidade de julgamento da realidade. Quando muitas mulheres exigem isso juntas, fundamos um movimento, tomamos as ruas, os gabinetes, os espaços, porque #juntassomosmaisfortes e a revolução será feminina.