Causa perplexidade a informação de que menos de 10% das escolas estaduais do Rio Grande do Sul possuem alvará do Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI), fornecido pelo Corpo de Bombeiros. Não se trata apenas de uma exigência burocrática desatendida. Trata-se, isto sim, de uma negligência monumental com a vida de crianças, adolescentes e adultos que frequentam diariamente escolas da rede pública do Estado. E o mais estarrecedor é que isso está ocorrendo num Estado marcado pelo dramático morticínio de jovens na tragédia da boate Kiss, que inclusive deu origem à legislação preventiva para instituições públicas e privadas com grande acesso de pessoas.
A lei já completou 10 anos e continua sendo descumprida. Publicada em 26 de dezembro de 2013, previa seis anos para que edificações públicas e privadas com mais de 200 metros quadrados se adaptassem às exigências. Depois de sucessivas prorrogações de prazo, só em 2022, quando o governo lançou o programa Avançar na Educação, os recursos começaram a ser liberados para o atendimento do PPCI em 500 escolas. No ano passado, o governo criou o Departamento de Segurança Contra Incêndio para tratar da prevenção de sinistros.
Não se trata apenas de uma exigência burocrática desatendida, mas de uma negligência monumental com a vida de crianças, adolescentes e adultos que frequentam diariamente escolas da rede pública do Estado
Ainda é pouco, considerando-se o risco imposto a crianças, professores e servidores que frequentam escolas sem equipamentos de segurança e com instalações inadequadas. São bem conhecidas as carências estruturais das escolas de periferia, mas nada pode ser tão importante quanto a segurança. Os itens básicos exigidos pelos bombeiros para liberar a licença são extintores de incêndio, placas de sinalização, portas corta-fogo, saídas de emergência, hidrantes e lâmpadas de emergência, podendo variar de acordo com a localização, a estrutura do prédio e outros fatores identificados na inspeção técnica.
No que se refere especificamente às escolas, há um outro aspecto a considerar. Para proteger os alunos da violência urbana, muitas delas instalam grades e portões que invariavelmente permanecem chaveados durante o período de aula. Tal providência – inquestionavelmente necessária – pode transformar prédios sem saídas de emergência adequadas em verdadeiras armadilhas, como aconteceu com a fatídica boate de Santa Maria.
Percebe-se, por tais circunstâncias, que o assunto não pode mais ser tratado de forma convencional, no ritmo da conhecida burocracia do serviço público. Trata-se de uma urgência. As autoridades deveriam aproveitar o recesso escolar para uma revisão criteriosa das escolas que ainda não cumprem as exigências da legislação, mobilizando também o Corpo de Bombeiros para que agilize as vistorias e contribua no aperfeiçoamento dos planos de prevenção. O que importa não é a concessão da licença, mas sim o que ela simboliza: a garantia efetiva de que estudantes, professores e funcionários de escola possam se reunir diariamente num local seguro e preparado para eventuais contratempos.
Também é fundamental – como ficou comprovado no recente acidente aéreo ocorrido no Japão – que as escolas incluam nos seus currículos e nas suas rotinas o treinamento dos seus frequentadores habituais para o enfrentamento de emergências.