Por Daniel Borges de Abreu, especialista em Direito Constitucional, mestre em Ciências Sociais
A CF/88 foi a primeira Constituição brasileira generosa com os partidos políticos. Eles possuem grande autonomia de funcionamento e monopolizam as candidaturas.
Contudo, em 30 anos, o prestígio constitucional não reflete benefício à democracia. Ainda que reprovável o atual "niilismo institucional", que reduz a nada as instituições, nenhuma organização há de ser considerada essencial por "decreto".
Em tempos de pós-verdade e desinformação, os partidos se tornaram anacrônicos. Pessoas jurídicas de direito privado que, cada vez mais, dependem de recursos públicos (leitor, atenção aos bilhões do fundo partidário); possuem estatutos parecidos (quando não copiados) e assistem, passivamente, ao surgimento de lideranças políticas em redes sociais, canais de internet, ONGs e celebridades, mas não nos quadros partidários.
O descompasso abrange partidos de todas as ideologias: (1) Mano Brown, em comício, convidou o PT à autocrítica, ao dizer que "se não está falando a língua do povo, vai perder mesmo"; (2) Luciano Huck, presidenciável liberal do momento, não é filiado a partido político; (4) Tábata Amaral, ativista da educação, está de saída do PDT tão rapidamente quanto entrou; (5) o PSL rachou de vez, evidenciando a artificial convergência criada em torno de Jair Bolsonaro; (6) os eleitos da direita surgiram de movimentos apartidários (MBL) e ativismos individuais ("Mamãe, Falei").
Assim, amparados em legislações de caça a recursos públicos (leitor, atenção ao novo art. 55-D da Lei n. 9.096/95, que visa anistiar dívidas dos partidos), criam feudos (principalmente os diretórios nacionais), e instalam ditaduras internas (as mulheres candidatas que o digam). Não por acaso, em 2018 houve o fenômeno dos candidatos envergonhados, que escondiam o próprio partido: não colocavam, no material de campanha, os dados da agremiação, aliás obrigatórios.
Uma proposta razoável seria a tentativa de destinação de parte dos cargos em disputa a candidatos sem partido. Se houvesse prejuízo à governabilidade, por exemplo, retornaríamos ao modelo atual.
Portanto, é ingênuo crer que os partidos são fundamentais. Mais racional é questionar se eles são úteis à democracia, pois o critério utilitário sempre é um bom instrumento aferidor – deixassem eles de existir, o que aconteceria?
Pois, por lei, pode-se obrigar aviões a terem buzina.