Por Roberto Livianu, promotor de Justiça, doutor em Direito pela USP, idealizador e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção
Depois de longa jornada, em 2018, por determinação do TSE, as contas dos partidos políticos foram abertas, prevalecendo a lógica da transparência, e a vitória foi especialmente significativa porque a infraestrutura existente no sistema de Justiça Eleitoral estatal para auditar e verificar essas contas é insignificante, gerando um gigantesco atraso de anos nessa imprescindível fiscalização, tendo a decisão aberto as portas para a cidadania se juntar ao Estado nesta hercúlea tarefa.
Pagamentos de festejos regados a vinhos e uísques caro contratações de parentes de dirigentes dos próprios partidos para prestar serviços, pagamentos a garotas de programa e diárias de motéis aparecem nos lançamentos contábeis dos partidos, presididos eternamente por coronéis, que fingem não existir o imperativo ético da alternância no poder.
O Brasil, neste tema, parece terra sem lei, pois as contas não são prestadas de forma clara e rápida. Os recursos do fundão eleitoral de R$ 1,7 bilhão, aprovado em 2017, foram destinados pelos partidos num volume 10 vezes maior a candidatos à reeleição em relação aos demais, na busca indisfarçável de manter os mesmos no poder além de resistirem à possibilidade de candidaturas independentes, apesar da tendência mundial contrária – hoje cerca de 20 países impedem tais candidaturas, que são lastreadas pelo Pacto de San José da Costa Rica, do qual o Brasil é subscritor.
O autoritarismo e opacidade dos partidos políticos é geral no país, os quais, ao invés de formarem grandes líderes e de mediarem e oferecerem caminho seguro e saudável para a aquisição do poder político, contribuíram para o surgimento de movimentos sociais como Vem pra Rua e MBL, além de organismos voltados à forja de lideranças, como Agora!, Acredito, Raps e RenovaBR, que elegeram 20 deputados federais em 7 de outubro.
A partir de fevereiro, um novo grupo de parlamentares assume o poder no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas, com a marca da renovação. No Senado, por exemplo, das 54 vagas em disputa, a renovação foi da ordem de 85%, pois apenas oito dos 33 candidatos à reeleição lograram êxito. Os governadores e o presidente já assumiram em 1º de janeiro.
Ganha importância o papel da sociedade a partir de agora. A ausência do povo representou, nas palavras de José Murilo de Carvalho, o pecado original da República, já que não foi ele o motor da proclamação dela, valendo lembrar que o novo sistema instituía eleições, mas os dois primeiros presidentes da República do Brasil não foram eleitos – Deodoro e Floriano.
O povo precisa se fazer presente, organizar-se, fiscalizar seus representantes, combater a corrupção sem permitir sua naturalização, sem letargia social, invocando, se necessário, a Lei de Acesso à Informação. Precisa postular ao Legislativo e ao Executivo o cumprimento de seus papéis constitucionais. É hora de subir um degrau na escadaria do amadurecimento democrático.