Por Pedro Dutra Fonseca, professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
Assim amigos mais chegados o chamavam. Conheci Cezar Busatto em 1973, quando ingressei no curso de Economia da UFRGS. Ele presidia o Daeca, diretório que reunia, além de nós, estudantes de Administração, Ciências Contábeis e Atuariais. Numa manhã cinzenta, este apareceu com duas trancas na porta e um cartaz: "Fechado por ordem da Reitoria". O estopim fora um mural organizado sobre censura à imprensa. Hoje, parece ridículo: recortes de Zero Hora, Folha da Manhã, Veja, Estadão e outros veículos sobre censura – os quais, portanto, já tinham sido publicados. Para mim, calouro interiorano, recém vindo de São Borja, foi um susto: que ameaça traria aquele mural sem nenhum material inédito e pelo qual boa parte dos colegas nem se interessava? Cezar já se mostrava, na época, um jovem líder de ideias firmes, com vínculos à esquerda, mas sempre disposto a dialogar e evitar que as crises se aprofundassem.
Após formado, passou um tempo no Exterior. Seguimos caminhos diferentes: ele não concebia sua existência sem militância partidária, para a qual eu tinha pouca paciência, e optei pela vida acadêmica. Sempre mantivemos o diálogo, apesar de diferenças de trajetórias e de ideias. Nos reencontrávamos em debates e, ao final, mais convergíamos. Cezar dedicou-se aos problemas estaduais, mormente à crise das finanças, da qual se tornou profundo conhecedor. Frequentemente, mandava e-mails comentando os artigos desta coluna e, em nosso último encontro, com outros amigos, há poucos meses, sugeriu que discutíssemos a formulação de um projeto para o Estado e para o país. Lamentava que o termo "desenvolvimentismo" tivesse tomado conotação pejorativa. A crise estadual dependeria não apenas de "saída política" (leia-se renegociar a dívida), mas de alternativas de crescimento para alavancar ingresso em onda de inovação schumpeteriana, intensiva em ciência, tecnologia e educação, e via o Rio Grande com essa vocação. Deixou comigo o documento A Strategy for American Innovation para depois discutirmos. Entristece-me a interrupção abrupta, mas homens como Busattinho deixam sementes cujos frutos amadurecem. Nesta época, em que política se associa a termos como intolerância, corrupção e vazio de ideias, ele é símbolo de que também pode ser o contrário.