Ex-editor do Spotlight, do Boston Globe, o bem-humorado Walter Robinson, que no filme vencedor do Oscar de 2016 foi interpretado por Michael Keaton, define os repórteres investigativos como "gambás no jardim". Faz sentido. Jornalistas que se dedicam a revelar o que o poder tenta ocultar são mesmo inconvenientes – irritam políticos de diferentes matizes ideológicos, importunam agentes públicos corruptos, incomodam gestores comprometidos com malfeitos.
É o que fez o Grupo de Investigação (GDI) nos últimos dias. Os repórteres José Luís Costa, de Zero Hora, e Zete Padilha, da RBS TV, entrevistaram pelo menos 30 pessoas e leram centenas de documentos para contar a história do vereador mais votado de Guaíba, o médico Renan dos Santos Pereira (PTB), presidente da Câmara Municipal. Renan é suspeito de irregularidades nas áreas da saúde e da política. Clínico-geral, usou certificado sem a chancela do Cremers para atender crianças como pediatra em postos públicos. O parlamentar é ainda suspeito de fraudes na gestão da saúde.
Um dia após a publicação, o Ministério Público realizou buscas e apreensões no município de cem mil habitantes. Resultado: dois vereadores, entre eles Renan, dois secretários municipais e seis servidores da prefeitura foram afastados de suas funções pela Justiça, seis empresas que prestam serviços na área médica foram proibidas de firmar contratos com o poder público e quatro mortes em um pronto-atendimento serão investigadas.
Em outra frente, Fábio Almeida, da RBS TV, lançou luzes sobre um problema grave nas profundezas do Rio Jacuí. Fabinho, como um dois mais prestigiados repórteres da RBS TV é chamado, denunciou que a areia do Jacuí está sendo saqueada. Resultado: na quinta-feira, a Fepam alterou uma portaria, tornando mais rígidas as regras de extração.
Com as últimas duas matérias, o GDI soma 39 reportagens de alto impacto publicadas em um ano e quatro meses – média de uma a cada 15 dias – e contabiliza 12 prêmios jornalísticos. Quantidade e qualidade reconhecidas pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que convidou o GDI para participar do 13º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, em São Paulo. Inspirada na Investigative Reporteres and Editors (IRE), uma das mais prestigiadas entidades dos EUA, a associação reúne a nata da investigação em seus encontros anuais. No evento passado, junto com Humberto Trezzi (ZH) e Jonas Campos (RBS TV), apresentei o case GDI na Abraji. Neste ano, quem vai ao congresso é a editora de Notícias, Dione Kuhn, que assumiu a coordenação do GDI no dia em que me despedi do grupo para comandar a Redação de ZH.
Com 52 anos recém-completados, mãe do Pedro e da Paula, Dione é uma das mais talentosas profissionais de ZH. É dela a série antológica Baú de Brizola, publicada em 2005. Após acessar os arquivos do ex-governador Leonel Brizola, Dione brindou os leitores com um acervo que nem mesmo a família do político conhecia na totalidade. Boa sorte na liderança dos nossos imprescindíveis "gambás no jardim", Dione.