O papa Francisco completa, nesta segunda-feira (13), uma década de pontificado, período marcado por sua popularidade entre os fiéis e pela resistência dentro de setores da própria Igreja Católica a seus projetos de reformas.
Assim que foi eleito, em 13 de março de 2013, o cardeal argentino Jorge Bergoglio mostrou seu desejo de ruptura, ao aparecer na varanda da basílica de São Pedro sem nenhum ornamento litúrgico.
O jesuíta sorridente e de linguajar franco representava um contraste com o tímido Bento XVI, que havia renunciado em 11 de fevereiro daquele ano. Provavelmente, naquele ponto, o novo Papa já tinha em mente algumas das principais propostas de seu futuro programa: a reforma da Cúria (o governo da Santa Sé), corroída pela inércia, e o saneamento das duvidosas finanças do Vaticano.
O ex-arcebispo de Buenos Aires, que nunca fez carreira nos corredores de Roma, queria "pastores com cheiro de ovelha" para devolver o dinamismo a uma Igreja cada vez menos presente e superada em muitas regiões pela vitalidade dos cultos evangélicos. As pregações deste crítico do neoliberalismo destacaram reivindicações por maior justiça social, proteção da natureza e defesa dos migrantes que fogem das guerras e da miséria.
— Acabou com a demonização da homossexualidade, com os debates sobre relações extraconjugais ou sobre contraceptivos (...). Tudo isso saiu da primeira página — afirma o vaticanista italiano Marco Politi.
— O papa introduziu na Igreja assuntos centrais das democracias ocidentais, como o meio ambiente, a educação e o direito — acrescenta Roberto Regoli, professor na Pontifícia Universidade Gregoriana.
Voz aos conflitos mundiais e presença nas periferias
O papa Francisco também denuncia os conflitos que devastam o planeta, ainda que sem resultados concretos, como demonstram seus apelos por um fim da guerra na Ucrânia. Sua imagem rezando sob a tempestade na Praça de São Pedro vazia, durante a pandemia, também foi muito representativa a respeito da necessidade de reflexão da humanidade naquele momento.
Um pastor incansável, apesar dos 86 anos e de seu estado de saúde frágil, que o obrigam a usar uma cadeira de rodas, segue privilegiando missões nas periferias do leste da Europa e na África. O cardeal argentino também foi o primeiro latino-americano a ser escolhido Papa na história da Igreja Católica. No Brasil, Francisco esteve em 2013.
Quebra de silêncio
Para enfrentar os escândalos de abusos sexuais de menores de idade por membros da Igreja Católica, Francisco aboliu o "sigilo pontifício", que era utilizado por autoridades eclesiásticas para não comunicar tais atos. Um gesto importante, mas insuficiente, na visão das associações de vítimas.
Durante a "década bergogliana", a Igreja Católica também desenvolveu um diálogo inter-religioso mais ativo, em particular com o islã. Francisco ainda protagonizou um encontro histórico em 2016 com o patriarca ortodoxo russo Kirill, mas a aproximação foi interrompida pelo apoio daquela Igreja cristã à invasão russa da Ucrânia.
Lutas de poder
Bergoglio levou novos ares a Roma: optou por viver em um apartamento sóbrio, rejeitando o suntuoso Palácio Apostólico, e frequentemente convidava à sua mesa moradores em situação de rua ou presidiários. Um estilo que também rendeu críticas de setores que veem nele uma dessacralização de suas funções.
O papa Francisco, atualmente, continua mobilizando os fiéis no Exterior, mas também há quem o critique por um exercício extremamente pessoal de sua autoridade sobre 1,3 bilhão de católicos.
— Francisco mostrou um autoritarismo ao qual a Cúria não estava acostumada há muito tempo. E isso pode irritar — afirma um importante diplomata em Roma.
A oposição dos setores mais conservadores da Igreja segue mais viva do que nunca, apesar das mortes recentes de dois de seus principais representantes: Bento XVI, falecido em dezembro de 2022, e o cardeal australiano George Pell, que faleceu em janeiro deste ano.
Sucessão
A Igreja já questiona, agora, quem será o sucessor de Francisco. Bergoglio, inclusive, já deu a entender em alguns momentos que poderia até renunciar ao cargo.
— As verdadeiras manobras para o conclave já começaram. Não são ações sobre nomes, e sim sobre a plataforma ideológica do futuro pontificado — reforça Marco Politi.
No momento, Francisco segue alterando o colégio cardinalício, e já designou 65% dos nomes que definirão o próximo Papa. Bergoglio prepara, ainda, vários eventos importantes para os próximos meses, como uma reunião de bispos no fim do ano para discutir o futuro da Igreja. Enquanto seu período à frente da Igreja não chega ao fim, Francisco segue atuante, como foi nestes últimos 10 anos.