O vereador Mauro Pinheiro (PL), relator das duas CPIs que apuraram irregularidades na Secretaria Municipal da Educação de Porto Alegre (Smed), fez a leitura do seu relatório final em sessão na manhã desta segunda-feira (4) na Câmara. No documento, ele emitiu cinco recomendações à prefeitura e afirmou que as aquisições de materiais pedagógicos e tecnológicos ocorreram, em 2022, sem a ocorrência de ilegalidades. A conclusão de Pinheiro foi de que as atas de registro de preço e a inexigibilidade — contratação direta junto ao fornecedor exclusivo de um produto — são instrumentos legais.
“Não se pode falar que a administração pública utilizou forma diversa da permitida em lei para a aquisição dos materiais investigados nessas CPIs”, registrou o relator.
As comissões apuravam o possível direcionamento de compras da Smed, via adesão à ata de registro de preço, conhecida como carona, ao grupo econômico dos empresários Jailson Ferreira da Silva e Sérgio Bento de Araújo. Eles estiveram envolvidos em seis vendas à prefeitura em 2022 por meio das empresas Inca, Sudu e Astral, que receberam R$ 43,2 milhões pelo fornecimento de cerca de 500 mil livros e 104 laboratórios de ciências e matemática. Durante a CPI, ficou demonstrado que as empresas que apresentaram orçamentos, com valores mais altos, nos processos administrativos que culminaram com vendas da Inca, da Sudu e da Astral à Smed eram do mesmo grupo econômico de Jailson e Sérgio. A colocação dessas cotações de preço era necessária para dar o aspecto de “vantajosidade” à adesão às atas de registro de preço.
Apesar de ter apontado a legalidade das compras, Pinheiro, aliado do prefeito Sebastião Melo, recomendou que as empresas ligadas a Jailson sejam investigadas “pois poderia haver indícios de direcionamento e fraude na coleta de orçamentos”. O relator não sinalizou no documento a autoridade que deveria conduzir a apuração.
Ainda sobre as compras junto ao grupo econômico de Jailson e Sérgio, o relatório ressalta depoimentos de servidoras da Smed que apontaram a coordenadora pedagógica Michele Bartzen como responsável pela indicação das fornecedoras. Ela também teria feito determinações sobre o uso repetido de documentos e orçamentos nos processos administrativos.
“Desta forma, importante aprofundar as investigações no que tange a participação da servidora Michele nas indicações das empresas contratadas”, diz o relatório.
Houve destaque para o depoimento prestado pela empresária Verônica Almuas, proprietária da Conceitto. Essa empresa vendeu para a Smed, por inexigibilidade, 942 kits de robótica pelo preço unitário de R$ 2,4 mil. O valor aceito pela Capital foi superior ao pago por prefeituras do interior que adquiriram pequenas quantidades do mesmo produto.
“A oitiva da senhora Verônica Ribeiro Almuas (...) gerou algumas dúvidas quanto à legitimidade na contratação, visto que a depoente não soube nem informar o tipo de licitação que a sua empresa participou. (...) Diante de várias contradições, do depoimento confuso e suspeito, recomenda este relator uma melhor averiguação dos fatos”, anotou Pinheiro.
Foram relatados no documento os problemas de logística para a distribuição dos materiais pedagógicos às escolas. O estado precário de dois depósitos em que estavam empilhados livros, minicomputadores (chromebooks) e equipamentos esportivos, sob mofo, sujeira, fezes de aves e até ratos mortos, não foi detalhado.
“Ao longo da instrução verificou-se falhas administrativas de logística nas distribuições dos materiais adquiridos. Ao tomar conhecimento, o Poder Executivo editou novas regras a fim de sanar as falhas”, escreveu o parlamentar.
O relatório tem 38 páginas e quatro delas foram dedicadas por Pinheiro para atacar a vereadora Mari Pimentel (Novo), presidente de uma das CPIs. Na semana passada, Mari lançou um relatório paralelo em que apontou a existência de “fraude” e “formação de cartel” na Smed para beneficiar um grupo empresarial. Pinheiro registrou que a atuação de Mari foi “eleitoreira” e criticou o uso de áudios e prints de conversas no WhatsApp durante as sessões para contrapor depoentes com diálogos suspeitos. O vereador afirmou que “as provas não vieram acompanhadas de qualquer comprovação técnica de veracidade”.
O relatório final será votado nesta terça-feira (5) na Câmara de Vereadores. Após 120 dias de trabalho e de 14 depoimentos de testemunhas, as CPIs da Smed encerram as atividades.
Veja as recomendações listadas pelo relator Mauro Pinheiro à prefeitura de Porto Alegre:
1 - Instaure procedimento administrativo específico para apurar possíveis irregularidades nas contratações da Smed que foram alvo das CPIs, especialmente aquelas conduzidas por intermédio dos empresários Jailson Ferreira da Silva e Verônica Ribeiro Almuas.
2 - Instaure procedimento interno para apurar responsabilidades nas falhas de gestão identificadas, notadamente aquelas relacionadas aos problemas de distribuição dos materiais adquiridos e à falta de condições estruturais das escolas para o uso do aparato tecnológico comprado.
3 - Institua grupo de trabalho para a realização de uma análise minuciosa dos processos de compras, com o objetivo de aprimorar os fluxos e evitar que as situações apontadas voltem a se repetir.
4 - Organize força-tarefa para promover melhorias estruturais, especialmente arquitetônicas, elétricas e de mobiliário, nas escolas da rede pública municipal.
5 - Providencie cronograma com fluxo organizado para entrega dos materiais adquiridos.