A montagem do cigarro pirata paraguaio em território gaúcho, revelada pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI) nesta segunda-feira (3), tem uma faceta dramática, a dos roubos contra produtores rurais. Em busca de matéria-prima barata, as facções criminosas gaúchas compram fumo de distribuidoras desonestas - mas não hesitam, também, em encomendar assaltos de caminhões que transportam fumo. Só entre março e abril deste ano, época em que o fumo começa a ser transportado, foram 12 roubos de cargas em municípios gaúchos, segundo a Polícia Civil e a Associação dos Fumicultores do Brasil.
O GDI entrevistou dois plantadores que tiveram a vida atormentada por esses crimes. Confira os depoimentos deles:
Fomos levados na caminhonete e num dos caminhões, com cabeça abaixada, proibidos de olhar para a frente.
"Nós levávamos três caminhões carregados de fumo para Venâncio Aires, umas quatro horas de viagem. Nas proximidades de Vale Verde os pneus de um dos veículos furaram, acho que eram miguelitos colocados na estrada. Mal a gente parou e uma caminhonete estacionou atrás. Três caras armados desceram e mandaram a gente sair dos caminhões.
Fomos levados na caminhonete e num dos caminhões, com cabeça abaixada, proibidos de olhar para a frente. Rodamos por quatro horas, em estradas de chão, até nos obrigarem a descer num matagal. Aí nos amarraram e começaram a descarregar o fumo dos veículos. Levaram umas 15 toneladas de fumo, o equivalente a R$ 200 mil em mercadoria, além do caminhão. Nos avisaram que o veículo seria abandonado e assim aconteceu. Nos desamarramos e tocamos a vida.
Os outros dois caminhões não chegaram a ser roubados porque um taxista estranhou o abandono e chamou a BM, que recuperou os veículos. Nossa empresa já sofreu outro roubo em 2016. E na nossa região foram 10 assaltos em 2016."
Em três dias abandonei o esforço de uma vida. E não sou só eu. Perdi a conta dos casos de assalto como o que nos aconteceu.
"Era fim de tarde. Eles entraram na minha propriedade e renderam, na casa, minha esposa. Três caras armados. Depois dois deles foram até o galpão onde seco fumo e também me renderam. Fomos colocados de bruços no chão, cobertos com um lençol. Perguntaram de dinheiro e armas. Pegaram o que puderam, levaram uns eletrodomésticos. Mas o que queriam, mesmo, era fumo. Só saquearam a residência porque tiveram oportunidade.
Eles encheram minha caminhonete com fumo, eletrodomésticos e levaram. Tive um prejuízo de R$ 16 mil em fumo, mais o veículo perdido. Mas o maior problema é que não consegui mais morar naquela casa. Foram 40 anos naquele lugar, nasci e me criei junto à lavoura, agora coloquei tudo à venda (nesse momento, o entrevistado chora). Em três dias abandonei o esforço de uma vida. E não sou só eu. Perdi a conta dos casos de assalto como o que nos aconteceu."