O Ministério Público de Contas (MPC) do Rio Grande do Sul emitiu parecer em que pede a devolução de R$ 47 milhões, aplicação de multas e indisponibilidade de bens de quatro ex-diretores do Badesul que atuaram na concessão de empréstimo à empresa Wind Power Energia.
O valor é correspondente a um empréstimo de R$ 50 milhões que a Wind Power tomou, em março de 2013, junto ao Badesul, agência de fomento do governo gaúcho. Segundo o MP de Contas, houve afrouxamento e inobservância de regras bancárias.
A empresa não pagou as prestações ao Badesul. A fábrica de aerogeradores que seria construída em Guaíba com o financiamento jamais saiu do papel. O paradeiro do dinheiro é desconhecido.
A Wind Power entrou em recuperação judicial e o banco ficou entre os credores quirográficos — aqueles sem garantia real de ressarcimento. O caso dos calotes ao Badesul foi revelado por Zero Hora em setembro de 2016.
Entre as falhas no procedimento, foram verificadas garantias frágeis ou inexistentes e elevação "artificial" da nota que os bancos atribuem a um solicitante de empréstimo, o chamado "rating". Quanto mais alto o conceito, maior a chance de aprovação da operação.
Na petição do MPC, que ainda precisará ser julgada pelo Pleno do Tribunal de Contas do Estado (TCE), o procurador-geral Geraldo Da Camino sustenta que, encerrada a análise sobre a concessão do financiamento, ficaram "evidenciadas, à exaustão, as irregularidades que, ao arrepio dos normativos internos do Badesul aplicáveis à operações de crédito, permearam todas as fases das transações". Foram responsabilizados os ex-dirigentes Marcelo Lopes (ex-presidente), Pery Sperotto Coelho (ex-vice-presidente), Lindamir Verbiski (ex-diretora de Operações) e Luís Alberto Bairros (ex-diretor Administrativo).
Da Camino requereu a devolução de R$ 47 milhões considerando o abatimento causado pela venda de um imóvel pertencente à empresa, com reversão de valores ao Badesul, como ressarcimento de uma parcela da dívida.
O procurador-geral do MPC, em novembro de 2017, já havia solicitado a devolução de R$ 40 milhões por ex-dirigentes do banco que autorizaram financiamento à Iesa Óleo e Gás, empresa que se instalou em Charqueadas para construir módulos da indústria naval, mas fechou as portas após meses de operação, ingressando em recuperação judicial. Neste episódio, o Badesul também sofreu calote.
Os casos também são alvo do Ministério Público (MP), que ingressou com ações civis públicas para requerer que os réus sejam condenados a devolver R$ 99,8 milhões e R$ 85,5 milhões pelas transações com a Wind Power e a Iesa Óleo e Gás. Os processos tramitam na Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre.
Em caso de serem condenados em diferentes ações, os acusados pagam o débito apenas uma vez.
Entenda o caso
- No governo Tarso Genro (PT), de 2011 a 2014, o Badesul multiplicou a liberação de financiamentos para clientes de risco.
- A política resultou em calotes porque parte das empresas não fez os investimentos projetados nem pagou as prestações.
- A aposta do governo era injetar recursos na modernização da economia do Estado, mas houve equívocos de avaliação de garantias, concentração de empréstimos em poucos clientes e baixas taxas de rentabilidade.
- Três exemplos de inadimplência são os financiamentos à Iesa Óleo e Gás, à Wind Power Energia e à D'Itália Móveis.
- O Banco Central pediu explicações sobre as operações com a Iesa e a Wind Power. O TCE abriu duas inspeções extraordinárias.
- Após ZH revelar as operações de risco e os calotes sofridos pelo Badesul, o Piratini abriu sindicância, coordenada pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE).
- O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) rebaixou, em 14 de setembro de 2016, a nota da agência gaúcha a zero, impossibilitando a captação de recursos da instituição federal. Isso praticamente inviabilizava o Badesul, que busca 98% dos seus capitais no BNDES.
- No dia 28 daquele mês, o Badesul apresentou plano de contingência e recuperou a nota de 2,2, o que garantiu margem para tomar cerca R$ 130 milhões no BNDES.
- Em 13 de março de 2017, a sindicância da PGE responsabilizou 23 pessoas, a maioria por improbidade administrativa, pelas falhas nos contratos de financiamento.
O que dizem Marcelo Lopes, Pery Sperotto Coelho, Lindamir Verbiski e Luís Alberto Bairros
Pery Sperotto Coelho e Luís Alberto Bairros não responderam às mensagens enviadas pela reportagem de Zero Hora.
Marcelo Lopes e Lindamir Verbiski se manifestaram por intermédio do advogado Aloísio Zimmer: "Os ex-dirigentes do Badesul vêm se empenhando em prestar todos os esclarecimentos pertinentes, demonstrando que as operações de crédito observaram estritamente os regulamentos internos da instituição e todas as instâncias respectivas. Confiam em que, ao final do processo, restará demonstrada a regularidade das operações.
Cumpre destacar que a Procuradoria-Geral do Estado promoveu sindicância também quanto aos técnicos do Badesul nas operações de crédito, cujo relatório afastou a ocorrência de irregularidades na sua atuação. As informações dos técnicos subsidiaram, decisivamente, as posteriores avaliações dos ex-dirigentes do Badesul nas operações de crédito.
De resto, cabe esclarecer que a apreciação da regularidade da operação de crédito caberá ao TCE. O parecer do MPC será objeto de avaliação, juntamente com os esclarecimentos prestados pelos ex-dirigentes do Badesul e com os demais elementos de ponderação disponíveis nos autos do procedimento".