O temporal que deixou 2,1 milhões de clientes da concessionária Enel sem energia, sexta-feira passada (11), em São Paulo, assemelha-se ao impacto provocado pela tempestade que atingiu o Rio Grande do Sul em meados de janeiro deste ano. Em termos proporcionais, a combinação entre o mau tempo e a falta de uma rede elétrica mais segura provocou resultados similares principalmente nas regiões metropolitanas dos dois Estados: afetou até 27% dos clientes da empresa paulista e 32% das unidades consumidoras atendidas em solo gaúcho pela CEEE Equatorial.
Os eventos, contudo, apresentam diferenças quanto aos desdobramentos de cada um: a concessionária gaúcha registrou ritmo mais acelerado de religações nos primeiros dias após a ventania, enquanto o infortúnio vivido pelos paulistas gerou mobilização mais intensa das autoridades nacionais em termos de cobranças públicas.
Uma comparação direta entre os dois episódios deve ser interpretada com cautela, já que cada fenômeno tem características peculiares como, por exemplo, a força e a duração do vendaval que afeta cada local. Em janeiro, as rajadas chegaram a 126 km/h em Teutônia, no Vale do Taquari, e a 89 km/h em Porto Alegre, uma das regiões mais afetadas. Em São Paulo, a Defesa Civil registrou rajadas de 107 km/h, as mais intensas em quase três décadas.
A dimensão de cada Estado também é bastante diferente: enquanto a Enel soma 7,7 milhões de clientes em 24 cidades, a CEEE Equatorial contabiliza 1,9 milhão em 72 municípios. Ambas atendem as respectivas capitais. Mas, em termos proporcionais, o resultado do mau tempo foi parecido — desligou a energia de, aproximadamente, três em cada 10 consumidores nos dois lugares.
Em um primeiro momento, a resposta da Equatorial conseguiu recuperar o abastecimento em um ritmo superior (veja detalhes ao final desta reportagem). No dia seguinte a cada evento, a empresa gaúcha havia religado a luz de 64% dos clientes atingidos, contra 31% da concessionária paulista. No período posterior, o desempenho se tornou mais homogêneo: no quarto dia de cada situação, a diferença era de 86% a 74% a favor da Equatorial (como o episódio em São Paulo ainda é recente, esse é o limite para esse tipo de comparação). Em Porto Alegre, seguiram-se relatos de problemas localizados nove dias depois do começo da crise, em janeiro.
A repercussão pública dos dois acontecimentos também foi distinta. O cenário de segurança energética no Rio Grande do Sul foi debatido em uma reunião entre o governador Eduardo Leite, representantes da CEEE Equatorial e da RGE, o diretor-geral da Aneel, Sandoval de Araújo Feitosa Neto, e a presidente da Agergs, Luciana Luso de Carvalho, em 24 de janeiro (nono dia após a tempestade). Houve cobranças públicas do Piratini e de prefeituras como a de Porto Alegre.
Já a situação envolvendo a Enel mobilizou autoridades federais como o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que convocou uma reunião emergencial com a empresa e outras concessionárias nesta segunda-feira (14).
— Quando a Enel disse que não tinha previsão de entrega dos serviços à população, eu disse que ela cometeu um grave erro de comunicação, um grave erro de seu compromisso contratual com a sociedade de São Paulo, de dar uma previsão objetiva. Disse para ela que tem os próximos três dias para resolver os problemas de maior volume. Nos próximos três dias, ela tem de restabelecer a parte mais substancial da energia do povo de São Paulo — declarou Silveira em entrevista coletiva concedida após o encontro.
Procuradas por GZH, a Enel e a CEEE Equatorial não se manifestaram. Em notas divulgadas à imprensa, a empresa paulista diz estar "trabalhando para restabelecer o fornecimento".
O dia a dia da recuperação
A CEEE Equatorial avançou mais rapidamente nas religações de energia, nos primeiros dias após o temporal que atingiu o Rio Grande do Sul em janeiro, em comparação à Enel depois da tempestade da semana passada. Porém, levou quase 10 dias para considerar normalizado o fornecimento. Os paulistas completaram nesta segunda-feira (14) o quarto dia de trabalho de recuperação.
São Paulo: a sequência do temporal de outubro
Dia 1 - 11/10, sexta-feira
- Por volta das 20h, 2,1 milhões de unidades consumidoras ficam sem energia (o correspondente a cerca de 27% dos clientes atendidos naquele Estado).
Dia 2 - 12/10, sábado
- Às 17h30min, a energia havia retornado para cerca de 650 mil clientes, o equivalente a 31% dos consumidores que haviam ficado no escuro.
Dia 3 - 13/10, domingo
- No meio da tarde, a empresa informou ter religado a luz para 1,3 milhão de clientes, ou 62% das unidades atingidas pelo apagão.
Dia 4 - 14/10 - segunda-feira
- Pela manhã, a luz havia retornado para 74% dos consumidores afetados. Ainda havia 537 mil unidades sem energia, das quais 354 mil na capital paulista.
Rio Grande do Sul: o cenário após temporal em janeiro
Dia 1- 16/1, terça-feira
- Um forte temporal atinge o RS durante a noite. Entre a madrugada e o começo da manhã do dia seguinte, cerca de 600 mil clientes ficam sem luz (cerca de 32% dos consumidores atendidos pela empresa).
Dia 2 - 17/1, quarta-feira
- Às 21h, a CEEE Equatorial informa que 64% dos clientes afetados já tiveram a energia restabelecida.
Dia 3 - 18/1, quinta-feira
- Às 22h, a empresa contabiliza 80,06% dos clientes atingidos com a luz religada.
Dia 4 - 19/ 1, sexta-feira
- Às 9h, 86% das ligações foram restabelecidas, conforme a concessionária.
Dia 5 - 20/1, sábado
- Dos clientes afetados, 92,7% tiveram o fornecimento normalizado conforme boletim das 20h.
Dia 6 - 21/1, domingo
- Foram restabelecidas 95,9% das ligações, conforme comunicado divulgado às 18h.
Dia 7 - 22/1, segunda-feira
- A Equatorial contabiliza 98,9% dos clientes com o serviço normalizado às 17h30min.
Dia 8 - 23/1, terça-feira
- Fornecimento normalizado para 99,7% das unidades atingidas.
Dia 9 - 24/1, quarta-feira
- A empresa interrompe a divulgação de boletins sob o argumento de que a situação foi normalizada. Porém, como persistem relatos isolados de desabastecimento, a 15ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do RS concede liminares ajuizadas pelo Ministério Público e dá prazo de 24 horas para restabelecimento integral da energia.