O agropecuarista Régis Lopes Melo, 37 anos, caminha pela lavoura de soja em sua propriedade em Cachoeira do Sul, na região central do RS, sentindo desânimo. A estiagem dos últimos anos castiga a safra e a falta de previsão de chuva tira as esperanças de reverter o prejuízo que já beira os 70% da produção e pode descartar toda a plantação.
Pelo segundo verão consecutivo, GZH percorre parte do território gaúcho mais afetado pela estiagem. O roteiro, que inclui as cidades Cachoeira do Sul, Passa Sete e Santiago, busca mostrar o impacto da falta de água tanto nas zonas rurais quanto urbanas.
— Esse ano vai ser a pior. Nasceu bem e depois faltou totalmente a chuva. Do jeito que já morreu não recupera mais — comenta.
De acordo com o engenheiro agrônomo Jerson Luiz Pinto dos Santos, que atua na região de Cachoeira do Sul há mais de 30 anos, a soja da propriedade de Régis não consegue se desenvolver e já está seca na parte inferior pela incidência do sol forte e a ausência de água.
— Estamos com um déficit pluviométrico nos últimos quatros meses de aproximadamente 500 milímetros, por isso que os rios secaram. A planta não consegue enfrentar esse deserto. Essa soja teve uma fase inicial razoável, chegou na fase reprodutiva e começou a abortar tudo (…). Essa soja caminha para a colheita zero — sentencia.
O cenário da estiagem espantou até as seguradoras. Segundo o engenheiro, com a alta chance de sinistros, não há interesse em atender os agricultores da região.
Melo observou essa situação. Ele conta que o custo para compensar a produção é de 30 sacos de soja por hectare e, atualmente, seu seguro privado só cobre 20, deixando uma desvantagem.
— Não dá nem vontade de vir para a lavoura. A gente trabalha para isso e no fim depende de Deus né — suspira.
Conforme relatório técnico encaminhado pela Defesa Civil do município, a seca já reduziu mais de 50% a produção das hortaliças, 26,4% do milho, além de 7% na soja, 5% tabaco e mais o reflexo da produção de leite e no gado, que emagreceu pela perda de pasto da alimentação nos campos e com problemas para hidratação.
A prefeitura ainda estima que mais de 1,2 mil famílias estão recebendo reforço no abastecimento de água em caminhões-pipa para poder ter consumo garantido em casa. A procura está maior do que no ano passado, segundo o Executivo.
Barragem do Capané em nível crítico
Essencial para a irrigação de 3,5 mil hectares de arroz e soja no município, a barragem do Capané, está com uma área extensa de grama verde que deveria estar coberta pela água. Em razão do nível baixo, o local está com um rodízio de uso dos três canais, algo que também teve que ser feito no ano passado.
— Em 30 anos que retornei para Cachoeira, e nunca vi a barragem numa situação em que ela está hoje de pouca disponibilidade de água — afirma o Secretário Municipal de Agricultura, Fernando Cantarelli.
A diminuição também preocupa os agricultores que dependem do reservatório.
— Pelo volume que tem hoje, a água armazenada tem condições de ir só até o dia 15 a 20 de fevereiro irrigando as lavouras, segundo o presidente dos usuários da barragem — afirma Cantarelli, apesar de ponderar que algumas logo não precisarão mais da água em função do estágio em que se encontram.
O titular da pasta explica que os produtores locais buscam uma solução do Estado para tentar realizar reforma na estrutura da barragem, de forma que ela possa ter uma melhora na reserva e auxiliar na irrigação de uma área maior.
Outro ponto importante de abastecimento de água em Cachoeira do Sul também teve impacto pela seca. Conforme o superintendente municipal de Defesa Civil, Edson nas Neves Júnior, o Rio Jacuí está cinco metros abaixo do que é considerado normal para esta época do ano.
— Ele deveria ter 18 metros e está com 13, mas isso não compromete o abastecimento do perímetro urbano — esclarece.
Até 20 de janeiro, a prefeitura calculou já ter investido mais de R$ 289 mil em ações para amenizar a estiagem, sendo a maioria para disponibilização de 880 mil litros de água potável a moradores da zona rural e abertura de dois poços artesianos.