Quatro anos após a entrada em vigor da reforma trabalhista, o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quinta-feira (7) o julgamento de uma ação que pode beneficiar os usuários da Justiça gratuita. Pelas regras atuais, mesmo quem comprovar insuficiências financeira precisa pagar eventuais perícias e, no caso de derrota, os honorários advocatícios da parte vencedora.
De autoria da Procuradoria-Geral da República, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.766 foi ajuizada em agosto de 2017, um mês após a votação das medidas no Senado e posterior sanção pelo então presidente Michel Temer. Segundo sustenta a PGR, em pelo menos três artigos a reforma afronta a Constituição “por impor restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade”.
Além do pagamento de perícias e dos honorários de sucumbência, os parlamentares incluíram na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) a exigência de que os beneficiados pela justiça gratuita arquem com as custas processuais caso não compareçam à audiência preliminar sem justificativa. “Com declarado objetivo de reduzir o número de demandas perante a Justiça do Trabalho, a legislação avançou sobre garantias processuais e viola direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade judiciária”, escreveu na petição inicial o então procurador-geral da República Rodrigo Janot.
De fato, a reforma reduziu o número de processos trabalhistas no país. Segundo dados compilados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Justiça do Trabalho recebeu 4,3 milhões de ações em 2017, ano em que as medidas foram aprovados pelo Congresso. Esse volume caiu para 3,5 milhões em 2018, mantendo-se no mesmo patamar em 2019 – uma queda de 20%.
Mais da metade desses processos, ainda conforme o CNJ, é movida por usuários da gratuidade. Com 56% das ações contempladas pelo benefício, a Justiça do Trabalho só fica atrás da Justiça Militar Estadual, na qual 80% das ações também correm sem custas para os reclamantes.
Atualmente, para uma pessoa requerer a gratuidade judicial em causas trabalhistas é preciso comprovar salário equivalente a no máximo 40% do teto da previdência social, ou seja, R$ 2.573,42. Para o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luiz Antonio Colussi, a imposição de cobrança aos trabalhadores com insuficiência de recursos é uma ofensa a princípios fundamentais da Constituição.
— Isso fere a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, dois fundamentos expressos no artigo 1º da Constituição. A imensa maioria dos reclamantes na Justiça do Trabalho são pessoas necessitadas, com salário baixo. A reforma limitou o acesso desses trabalhadores à Justiça — afirma Colussi.
Na retomada do julgamento, interrompida em 2018 por um pedido de vista do ministro Luiz Fux, votarão oito dos 10 atuais integrantes do STF. A Corte segue desfalcada desde julho, em razão da demora do Senado em votar a indicação de André Mendonça para vaga de Marco Aurélio Mello, aposentado. Por enquanto, o placar está 1 a 1.
Relator da ação, Luís Roberto Barroso sustentou a legalidade dos dispositivos contestados pela PGR, por entender que levam o trabalhador a ser mais responsável antes de ingressar com uma reclamatória trabalhista.
— Mais de uma em cada três pessoas no Brasil está litigando. Não é só legítima como necessária em um país como o Brasil, em favor dos trabalhadores e da economia em geral, a adoção de políticas públicas que, sem comprometer o acesso à Justiça, procurem conter o excesso de litigiosidade — justificou Barroso.
Edson Fachin abriu divergência para considerar inconstitucionais imposições que restringem o acesso à Justiça do Trabalho. Para o ministro, as medidas acabam esvaziando o interesse dos trabalhadores em lutar por seus direitos.
— A partir de tais restrições, verifica-se uma possibilidade de negar-se direitos fundamentais dos trabalhadores — resumiu Fachin.