O interesse de encontrar um parceiro privado para a Casan em Santa Catarina nunca foi segredo no governo Raimundo Colombo (PSD). Em 2011, primeiro ano do lageano na Casa D'Agronômica, um projeto foi encaminhado à Assembleia Legislativa com pedido de autorização para venda das ações da companhia à iniciativa privada. Na época, a intenção era atrair recursos financeiros para uma estatal deficitária – havia fechado 2010 com R$ 11,4 milhões de prejuízo –, criar um fundo e ampliar a cobertura de saneamento no Estado.
Não sem barulho, os projetos chegaram à Alesc em junho de 2011. Trabalhadores da estatal, representados pelo Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de SC (Sintaema), e deputados da oposição, em especial o líder do PT no Legislativo, deputado Dirceu Dresch, saíram na dianteira reclamando da proposta. O executivo pedia autorização para recomprar 35% das ações que estavam com outros órgãos do governo, como Codesc e SC Par, e colocá-las no mercado.
Em setembro de 2011, com 30 votos a 8, o parlamento autorizou a operação. Além disso, derrubaram uma emenda constitucional, criada em 2010, que previa a realização de um plebiscito em caso de alienação de ações da companhia.
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Na época, o presidente da Casan, Dalírio Beber, defendia que a medida não significaria privatização da estatal já que, na prática, o governo estadual não iria abrir mão do controle acionário, nem da gestão da companhia. Com patrimônio líquido avaliado em R$ 1 bilhão e presença em 99% dos municípios do Estado, a estatal se apresentava atraente o suficiente para conquistar um parceiro privado.
A aprovação veio em sintonia com um movimento de mercado da Odebrecht. A Foz do Brasil, controlada pela empreiteira, havia adquirido controle da companhia de saneamento do Tocantins, a Saneatins. O presidente da empresa na época, Fernando Reis, chegou a declarar em outubro daquele ano que não descartava entrar com participação em outras estatais: Casan, a Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan) e a Sanesul, do Mato Grosso do Sul, eram citadas. Foi também em 2010 que a Odebrecht assumiu a gestão do saneamento de Blumenau.
Na prática, a atração do parceiro privado não ocorreu. O governo contratou uma empresa de mercado para fazer a valoração - uma estimativa de quanto a Casan poderia captar no mercado com uma venda de ações. Os números nunca vieram oficialmente a público, mas comentou-se nos bastidores que a cifra baixa – cerca de R$ 240 milhões – havia feito o governo recuar da intenção. Havia dever de casa a ser feito; melhorar a gestão financeira da companhia era uma dessas tarefas. Recursos da agência japonesa de financiamento, a Jica, ajudaram o governo Colombo a pôr em marcha o projeto de investimento em saneamento que pretendia. Enfim, o tal parceiro privado nunca chegou.
O governador Raimundo Colombo se pronunciou sobre o assunto por meio de nota:
"Em relação às informações divulgadas nesta quarta-feira (28) sobre a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, o Governo do Estado informa que nunca tratou da privatização da Casan ou vendeu uma única ação da empresa nesses cinco anos e meio da atual gestão.Destaca, ainda, que a empresa Odebrecht não tem nenhum contrato, não executa nenhuma obra pública ou realiza qualquer serviço com o Governo de Santa Catarina desde 2011."
Por telefone, o senador Dalírio José Beber (presidente da Casan entre janeiro de 2011 e abril de 2014) disse desconhecer a abertura de nova investigação, reforçou que não existiam planos de privatizar a companhia e negou qualquer tratativa com a Odebrecht nesse sentido:
"Existia por parte da Casan um plano de investimento grande com recursos da JICA (Agencia Internacional de Cooperação do Japão), uma instituição de financiamento japonesa, existia também de uma agência francesa e recursos no BNDES da Caixa Econômica para dotar cidades com sistema de esgoto. Todos esses financiamentos exigem contrapartida. Nem sempre as empresas e o governo têm condições de dar contrapartida. Pensou-se em se criar uma alternativa para ter sócios privados, não privatizar. Para alavancar esses recursos, criou-se uma lei estadual permitindo que pudesse realizar estudos nesse sentido. Nunca houve conversa no sentido de fazer a privatização, apenas de tentar abrir o capital, chamar o capital privado no sentido de fortalecer os contratos de financiamento. Isto foi incluído em discussão na Assembleia Legislativa, mas não frutificou uma vez que a validação da empresa não resolvia o problema do financiamento. Não foram feitas tratativas (com a Odebrecht), existiam manifestações no processo todo, de vários grupos que tinham interesse em entrar no setor de saneamento, de geração de energia, que é normal. Isto tudo era público, não existe absolutamente nada escuso. O desejo não era vender ações existentes, era criar mecanismos para trazer dinheiro novo para poder fazer frente aos investimentos e acelerar o processo de universalização do esgotamento sanitário."