Mestre em psicologia positiva pela Universidade da Pensilvânia e especializada em governança corporativa pela Harvard Business School (ambas nos Estados Unidos), autora dos livros Florescimento na Prática (2019) e O Tempo da Felicidade (2020), a paulista Flora Victoria fala sobre desafios e barreiras no distanciamento social imposto pela pandemia de coronavírus.
Preguiça versus procrastinação
“A procrastinação é um hábito de adiar as coisas. Geralmente, as pessoas que procrastinam fazem isso em várias situações. Já a preguiça é a falta de vontade de fazer alguma coisa. Tanto uma quanto a outra impedem que você consiga realizar o seu objetivo, completar alguma atividade ou algum projeto. As armas para lidar com as duas são parecidas (veja mais a seguir).”
É possível ser produtivo agora?
“É uma crise sem precedentes. Porém, todos passamos por situações difíceis, embora não ao mesmo tempo. Às vezes, os problemas são muito mais complicados do que os de agora. Sempre estaremos sendo desafiados por eventos externos ou internos, que ocorrem para nós ou que a gente cria, no nosso processo cognitivo, emocional e comportamental.”
Os 4 “Ds”
“O primeiro D é do desafio que ocorre, não adianta o que a gente faça. Quando a gente passa por um desafio, há, sem exceção, dor, que é natural no nosso processo de lidar com essas situações. Existem três alternativas para lidar com essa dor. Desânimo, quando a pessoa se desengaja daquela situação, da sua vida, simplesmente se desconecta e se deprime; desespero, quando a pessoa quer fazer muita coisa ao mesmo tempo e pode chegar ao burnout. E desenvolvimento, que é a única forma de resolver o desafio. Aprender algo para lidar com aquilo, utilizar nossas forças e nossas características de um modo diferente, aprender a lidar com o novo, ser resiliente. Assim, é possível, sim, ser extremamente produtivo, criar coisas novas, tanto na vida profissional quanto pessoal.”
Zona de conforto, inércia e derrotismo
“A zona de conforto aparece quando você se acostuma com uma situação. Geralmente, não percebemos que estamos nela. Pode ser no trabalho, nos relacionamentos, na sua forma de pensar. Você atinge um certo patamar de resultados e se acomoda. A inércia ocorre quando estamos paralisados pelo medo, pelo desânimo, pela incerteza, que é o momento atual. Ninguém sabe o que vai acontecer no futuro, o vírus é invisível, as expectativas são de muita dificuldade. Você para de se movimentar. Derrotismo é ter uma estratégia pessimista: antes de entrar em ação, você já se convence de que vai dar tudo errado. São três estratégias que impedem o ser humano de se realizar, já que somos teleológicos, precisamos ter objetivos, estar em ação.”
Como mudar de atitude
“Temos de ter um porquê, em primeiro lugar. Vale a pena ficar no desespero ou no desânimo, na zona de conforto ou no derrotismo, na procrastinação ou na preguiça? Se entendermos quais são os benefícios de fazer determinado projeto, de ler a coleção de livros, de estudar um assunto novo, de se preparar para o fim da quarentena, a gente se motiva. A motivação vem do resultado final, e não do processo. Se a gente vê só o processos, costumamos ficar cansados. A segunda parte é organizar isso, um objetivo bem formulado e claro, eu vou escrever um artigo, eu vou aprender uma nova habilidade, e o tempo para alcançar: em que momento do seu dia, quantas horas vai dedicar, como você vai se lembrar do benéfico para entrar em ação. A terceira parte é identificar como esse objetivo aumenta sua competência, melhora seus relacionamentos e amplia sua autonomia. Por fim, é preciso de superação: as pessoas só são felizes quando estão usando seus talentos e suas forças na potencialidade máxima. O momento de desafio é a hora de buscar suas qualidades: criatividade, coragem, perspectiva, liderança, trabalho em equipe...”
A divisão de tempo com a família
“A melhor forma é montar uma agenda, seja à mão ou digital, e informar à família o horário de trabalho. Início e fim, breaks, almoço. Defina blocos. Por exemplo: duas para trabalho, daí um break. Ter o dia e a semana planejados facilita muito a negociação com a família e consigo mesmo. Feito isso, aí, sim, entra a questão da mentalidade e de conseguir se concentrar em cada uma das atividades ou prioridades.”