Atire um balde de água no Cantareira quem nunca procrastinou. Se a solução para a seca em São Paulo dependesse disso, os paulistanos estariam fadados à sede. Ao pesquisar o adiamento não estratégico de tarefas no meio acadêmico, a psicóloga Gabriela Geara chegou ao índice de que 82% dos estudantes universitário procrastinaram suas atividades de modo geral. Se o tema ainda é pouco estudado no Brasil, nos Estados Unidos, na Universidade do Colorado, pesquisas avançam à indicação de que algumas pessoas tendem mais a esse tipo de comportamento do que outras, e de que procrastinar pode estar ligado geneticamente à impulsividade.
O professor da Universidade de Calgary, no Canadá, Piers Steel é especialista no tema e já apontava essa característica como desencadeadora do comportamento protelatório no livro A Equação de Deixar para Depois. Na obra, o autor discute os motivos pelos quais adiamos missões e como melhorar nosso planejamento de tarefas.
Procrastinação pode impactar negativamente na vida social
Saiba como deixar de ser um procrastinador
- Nos primórdios, era importante reagir rápido e mudar o foco de atenção para resolver problemas mais imediatos. Então, reagir sem pensar muito está relacionado à impulsividade - explica Gabriela, ao relacionar a facilidade de distração que existe no ato de procrastinar à impulsividade.
No estudo de Gabriela, os três motivos mais alegados pelos universitários que responderam à pesquisa foram preguiça, cansaço e falta de tempo. Além disso, a psicóloga apontou outros fatores que podem estar relacionados ao comportamento: temer o fracasso ou o sucesso, ser perfeccionista ao extremo e trabalhar apenas sob pressão, impulsionado pelo desafio.
- O pessoal mais perfeccionista se exige tanto que só quer entregar a tarefa quando atinge um grau de perfeição que garanta que o fracasso não vai chegar. Mas é um nível muitas vezes ilusório. E o medo do sucesso também pode ser causa para a procrastinação, porque aí as pessoas pensam: "Fui muito bem em uma tarefa, entreguei antes do prazo, agora vão querer sempre que eu faça isso". Esse receio é mais comum em pessoas que não conseguem impor limites - diz a psicóloga.
Mas o que significa exatamente procrastinar? Esse tipo de comportamento está dentro de um grupo maior, que é o do adiamento.
- Dentro desse grupo, a priorização é uma forma estratégica de adiar as coisas, quando a gente encontra algo mais importante para fazer. E aí a procrastinação pode ser vista como o contrário da priorização - afirma Gabriela.
Aspectos culturais podem influenciar na protelação
Se os perfeccionistas são os mais atingidos pela ansiedade, quem é movido pelo desafio costuma sofrer menos, por achar que é uma questão de estilo, de apenas conseguir trabalhar sob pressão. Algumas pessoas até têm a habilidade de saber o tempo mínimo que precisam para realizar a tarefa e quando devem começá-la, e não necessariamente se prejudicam em termos de resultado.
- Só que ocorrem consequências psicológicas como estresse, alterações no sono e na alimentação. Vemos abuso de café, de estimulantes - comenta Gabriela.
Mas, para além da genética, procrastinar também pode ser um comportamento aprendido.
- Às vezes, as pessoas aprendem a adiar tarefas. Elas ficam se premiando por isso. Ficam vendo televisão, mergulham na piscina. Chega o dia seguinte, não fizeram a tarefa, mas o professor relevou, os pais perdoaram. Então, quando não tem consequência, a pessoa continua não fazendo - diz a terapeuta comportamental e professora do institutos de Psicologia e de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP) Maria Martha Costa Hübner.
Nesse ponto também entram aspectos culturais. O Brasil, por exemplo, é conhecido pela impontualidade. Como o atraso não é repreendido com frequência, a procrastinação pode ser mais recorrente em nosso país do que em lugares como a Alemanha.